Uso de cânabis medicinal no país mais que dobra em 2021
Segundo associação, novas solicitações de importação aumentaram 110%
Os pedidos para importação de produtos de cânabis medicinal mais do que dobraram em 2021 em comparação ao ano anterior, segundo levantamento da BRCANN (Associação Brasileira da Indústria de Canabinóides).
No último ano, foram feitas 40.191 novas solicitações de importação de medicamentos com CBD (canabidiol), 110% a mais do que em 2020, quando foram contabilizadas 19.150 importações.
Em anos anteriores, os novos pedidos para uso de medicamentos já vinham crescendo, com 1.392 em 2017, 2.371 em 2018 e 8.522 em 2019, mas a explosão ocorreu nos dois últimos anos da pandemia.
Segundo especialistas, a Covid influenciou a busca de medicamentos à base de CBD.
Para Tarso Araújo, diretor da BRCANN, a pandemia trouxe problemas como redução na mobilidade pelo confinamento e, principalmente, depressão. “Sabemos que o confinamento causa depressão, que pode ser um gatilho para algumas condições, como a fibromialgia. O CBD age controlando sintomas que aparecem nessas diversas situações.”
De acordo com Araújo, a maior demanda nos últimos anos por parte dos pacientes vem também de uma maior procura por informação. “São os próprios pacientes que buscam como aliviar os seus sintomas e descobrem os benefícios terapêuticos do CBD. O que ainda enfrentamos, infelizmente, é uma resistência por parte da classe médica em reconhecer o benefício.”
O fisiatra e médico da dor Caio Rondon é um dos especialistas que viu aumentar a procura por atendimento para indicação de terapia com canabidiol. “Se em 2017 eu recebia um paciente por mês buscando informação sobre o CBD, hoje recebo dois por dia.”
Porém, por aqui a questão esbarra diretamente no tipo de especialidade médica que pode, segundo resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) de 2014, prescrever medicamentos à base de cânabis medicinal. São três especialidades: neurologistas, psiquiatras e neurocirurgiões.
Em 2015, foi aprovado pela primeira vez um medicamento à base de Cannabis pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para tratamento de epilepsia em crianças e, desde 2019, outros 18 produtos já foram aprovados.
Antes, as crianças de até dez anos com diagnóstico de epilepsia representavam cerca de 80% dos pedidos de importação de medicamentos com CBD. Hoje, as crianças dessa faixa etária são 9,2% dos pacientes nos pedidos médicos, enquanto adultos com mais de 61 anos são 31,2%, e adultos de 21 a 40 anos, 25,5%.
Segundo Rondon, a melhoria no processo de importação por parte da Anvisa, feito a partir de resolução publicada em 2021, diminuiu o tempo de espera para chegada de três meses para 20 dias.
Maria Lizandra Dias, 47, recebeu há oito anos diagnóstico de fibromialgia. Sem melhora na qualidade de vida como tratamento convencional, ela conta que ador incapacitante tornava difícil até mesmo as tarefas mais banais. “Eu tinha perdido a vontade de viver, não conseguia fazer nada. Passeia tomar oC BD e voltei ater min havida ”, disse.
Além da melhora direta no quadro de dor, o CBD possui um efeito colateral que acaba sendo desejado em um momento em que cerca de 26% da população possui diagnóstico de ansiedade e distúrbios do sono, de acordo com dados da OMS (Organização Mundial da Saúde): ele provoca sono.
Segundo estudos que fizeram um resumo da literatura disponível sobre os feitos do canabidiol para dor crônica e fibromialgia, há uma melhora na qualidade de vida, no humor e da sensação de dor em cerca de 50% dos pacientes.
Esses achados se somam à melhor evidência científica disponível sobre uso para epilepsia, Alzheimer e Parkinson.
O uso da cânabis medicinal, no entanto, tem um caráter desigual no país, com cerca de 73% dos pedidos concentrados em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e Distrito Federal.
Cassiano Gomes fundou, em 2017 em João Pessoa, na Paraíba, a Abrace Esperança, uma associação sem fins lucrativos com o objetivo de apoiar familiares e pacientes que usam cânabis medicinal.
A ONG recebeu, no mesmo ano, autorização para cultivar, produzir e fornecer o canabidiol, e atualmente atende mais de 32 mil pacientes, sendo o único produtor no Brasil autorizado a fazer o CBD, embora ainda utilize matériaprima importada.