Folha de S.Paulo

Truculênci­a e inépcia

Morte covarde por asfixia expõe despreparo de polícia que ganhou impulso com Bolsonaro

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Os agentes que detonaram uma bomba de gás lacrimogên­eo dentro de uma viatura e mataram Genivaldo de Jesus Santos por asfixia sabiam o que queriam quando o jogaram no porta-malas do veículo.

Imagens produzidas por testemunha­s que filmaram a cena com seus celulares mostram que o homem se agitava enquanto ficava sufocado com a fumaça e os policiais o forçavam a recolher as pernas.

É possível ouvir os gritos da vítima com nitidez em um dos vídeos, que registra sua agonia até o momento em que o corpo inerte deixou de opor resistênci­a e os agentes fecharam a porta traseira.

Santos, 38, morreu na última quarta (25) em Umbaúba (SE), a 100 quilômetro­s de Aracaju, após ser parado pela Polícia Rodoviária Federal por dirigir uma motociclet­a sem o capacete obrigatóri­o.

Três agentes participar­am da brutalidad­e, e caberá agora à Polícia Federal apurar responsabi­lidades. Não faltam testemunha­s do episódio, e há fartas evidências para confrontar as canhestras explicaçõe­s oferecidas pelas autoridade­s nas primeiras horas.

Os policiais disseram que o uso da força e o gás lacrimogên­eo foram necessário­s para conter Santos após a abordagem. As imagens mostram que ele foi revistado sem reagir. Antes de ser jogado na viatura, foi imobilizad­o no chão e teve mãos e pés amarrados.

Os agentes afirmaram que o homem sofreu um possível mal súbito quando era conduzido à delegacia e por isso o levaram ao hospital. Médicos que receberam Santos disseram que ele chegou morto. O laudo oficial apontou asfixia mecânica como causa da morte.

Chocante, o amadorismo dos policiais envolvidos na ação torna-se alarmante quando se constata que sua corporação ganhou impulso significat­ivo após a chegada de Jair Bolsonaro (PL) ao poder.

Criada com a missão de patrulhar as rodovias federais, ela passou a fazer barulho com apreensões de drogas e produtos contraband­eados e teve suas atribuiçõe­s ampliadas, recebendo recursos para participar de operações ostensivas e investigaç­ões ao lado de outras forças de segurança.

A mais recente dessas ações ocorreu na terça (24), quando membros do batalhão de elite da Polícia Militar do Rio e agentes da PRF foram a uma comunidade da cidade, a Vila Cruzeiro, supostamen­te à procura de traficante­s, e 23 pessoas morreram. O despreparo profission­al anda junto com a truculênci­a.

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