Folha de S.Paulo

Zelenski agora fala em encarar realidade e negociar com Putin

Presidente coloca mais urgência no discurso em meio a avanços da Rússia

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Há uma semana, o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, acusava a Rússia de ter transforma­do o Donbass em um inferno. Ele se referia à gravidade dos ataques na região leste de seu país.

Outras autoridade­s ucranianas reiteraram de diferentes formas a expressão do presidente, como a vice-ministra da Defesa, que descreveu os novos ataques de Moscou no leste como uma ofensiva de “intensidad­e máxima”.

Agora, embora mantenha o discurso de que a comunidade internacio­nal deve ampliar o auxílio militar a Kiev, bem como as sanções contra a Rússia, Zelenski afirmou na sexta (27) que seu país precisa encarar a realidade e debater com Vladimir Putin os cenários possíveis para o fim da guerra.

“Há coisas para discutir com o líder russo. Não estou dizendo que nosso povo e eu estamos ansiosos para falar com ele, mas temos que enfrentar a realidade do que estamos vivendo”, afirmou o líder ucraniano durante um discurso feito a um think tank da Indonésia. “Queremos nossas vidas de volta, queremos recuperar a vida de um país soberano dentro de seu território.”

No início da semana, o presidente disse que não aceitaria discutir o fim da guerra com nenhuma outra pessoa que não fosse Putin. Nesta sexta, contudo, afirmou que a Rússia não parece estar pronta para uma negociação de paz, devolvendo a Moscou as acusações que ele próprio tem recebido.

Autoridade­s russas acusam a Ucrânia de má vontade nos diálogos para o fim do conflito. A crítica foi reiterada pelo porta-voz do Kremlin. “A liderança ucraniana com frequência faz declaraçõe­s contraditó­rias. Isso não nos permite entender completame­nte o que o lado ucraniano quer”, disse Dmitri Peskov.

O último encontro presencial entre as duas delegações ocorreu há quase dois meses, em 29 de março, quando nem sequer houve um aperto de mãos dos representa­ntes. Houve reuniões virtuais, mas que não chegaram a nenhum avanço concreto, e não há indícios de que a guerra esteja próxima do seu final.

Na verdade, os sinais indicam o contrário. Na mesma semana em que autoridade­s russas disseram que não estão preocupada­s com prazos e que até estariam desacelera­ndo o ritmo da ofensiva — sob o pretenso argumento de permitira retirada de civis das áreas mais atingidas—, o cenário segue sendo o de concentraç­ão de forças e operações no leste da Ucrânia.

Em Kharkiv, no nordeste, novos ataques ao já duramente bombardead­o município deixaram ao menos sete civis mortos e outras 17 pessoas feridas, de acordo com autoridade­s locais —a cifra não pôde ser verificada de forma independen­te. A segunda maior cidade da Ucrânia ainda é palco da resistênci­a das forças de Kiev, mas Moscou tomou outros pontos-chave da região.

Nesta sexta, separatist­as pró-rússia da região de Donetsk disseram ter assumido “controle total” de Liman. Importante centro ferroviári­o, a cidade esteve sob breve contro ledo grupo em 2014, e sua conquista agora pode permitir às tropas de Putin ultrapassa­rem o último obstáculo para avançar aos municípios de Sloviansk e Kramatorsk —capital da região de Donetsk, ainda sob controle ucraniano. Será também um reforço para a estratégia de manter o cerco sobre Severodone­tsk eLisitchan­sk,m ais aleste.

Autoridade­s ucranianas reconhecer­am a tomada da maior parte de Liman, mas dizem que aind ah átropas impedindo os russos de avançara Sloviansk. Já Severodone­tsk está 90% destruída por bombardeio­s e com dois terços do território tomados pela Rússia, segundo o governador de Lugansk, Serhii Gaidai.

Ele fala em “resistênci­a feroz” contra os inimigos e afirma que a província não será tomada nos próximos dias, como previam alguns analistas, mas admite a possibilid­ade de recuo ucraniano. “Teremos força e recursos suficiente­s para nos defender. No entanto, é possível que, para não sermos [totalmente] cercados, tenhamos que recuar”, escreveu no Telegram.

No campo diplomátic­o, o chanceler da Rússia, Serguei Lavrov,re agiu com vigoràposs­ib ilida dede que o Ocidente doe armasàUcrâ­n iaque possam atingir diretament­e o território russo —para ele, um “passo sério em direção a uma escalada inaceitáve­l”. Disse ainda que os países ocidentais declararam “guerra total à Rússia e ao mundo russo”, voltando a criticar o cancelamen­to da cultura de seu país.

Embora não tenha mencionado nenhum envio de armas específico, Lavrov pode estar se referindo aos relatos de autoridade­s dos EUA de que o governo deJoeBiden­con sidera f orne ceraKiev oM 142 HIMARS (sigla em inglês para sistema de artilharia de foguetes de alta mobilidade).

O armamento é capaz de atingir alvos a centenas de quilômetro­s. Washington evitou até agora de fornecer equipament­os como om 142 por temer um agravament­o do conflito.

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Aris Messinis/afp Bombeiros apagam fogo em fábrica bombardead­a em Bakhmut, no leste ucraniano
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