Folha de S.Paulo

Em primárias, Trump reforça sua influência

Republican­o vê aliado ter derrota simbólica em seletiva do partido na Geórgia, mas acumula vitórias importante­s

- Rafael Balago

Donald Trump confrontou Brian Kemp duas vezes. Em 2020, ainda presidente, pressionou o governador republican­o da Geórgia a ajudá-lo a fraudar as eleições; não conseguiu. Um ano e meio depois, tentou atrapalhá-lo na disputa pela reeleição estadual; também falhou.

Kemp venceu a primária republicad­a no estado na terça (24), ao lado de Brad Raffensper­ger, que busca um novo mandato como secretário de Estado —em 2020, ele recebeu uma ligação de Trump pedindo para “achar” alguns milhares de votos e reverter sua derrota. Ele não o fez, e a conversa chegou à imprensa.

Neste ano, Trump apoiou na seletiva o ex-senador David Perdue, defensor da teoria falsa de que a eleição de 2020 foi roubada. O ex-presidente se engajou na campanha e doou mais de US$ 2 milhões ao aliado, em vão.

O atual governador recebeu o endosso de vários outros republican­os (incluindo Mike Pence, ex-vice de Trump), gastou US$ 5,2 milhões só em anúncios de TV e usou a máquina pública: deu descontos em impostos sobre combustíve­is e criou novo auxílio social na época da votação. Acabou vencendo com 73% dos votos, contra 22% de Perdue.

Ainda que simbólica, a derrota pode ter sido pontual no poder de influência do ex-presidente nas primárias. Segundo levantamen­to do site Ballotpedi­a, ele anunciou apoio a 16 candidatos a governador; nos seis estados em que a votação já foi realizada, são três vitórias (Texas, Arkansas e Pensilvâni­a) e três derrotas (Nebraska, Idaho e Geórgia).

Trump também já viu aliados vencerem 13 disputas pela candidatur­a ao Senado (em 19 realizadas) e 71 primárias para a Câmara (de 72). Ao todo, ele anunciou ao menos 150 endossos para as duas Casas. Apesar de não ter acesso às principais redes sociais, o ex-presidente tem ido a comícios e divulgado mensagens em canais como o Telegram e a rede Truth Social, que pertence a ele.

Os resultados ajudam a mensurar o poder de Trump sobre o Partido Republican­o e em que medida seu apoio atrai ou afasta eleitores, mas ainda é cedo para conclusões definitiva­s, já que só 12 dos 50 estados tiveram primárias. O processo se estende ao longo de meses até a eleição em si, em novembro. Nas chamadas midterms, parte do Congresso e o comando de 36 estados serão renovados.

Entre tantas disputas, a atenção se concentra nos locais onde os partidos costumam se alternar no poder. São os estados-pêndulo, que costumam decidir o pleito presidenci­al.

Na Pensilvâni­a, Doug Mastriano venceu a primária do partido para governador. Ele questiona o resultado de 2020 e organizou caravanas para Washington em 6 de janeiro de 2021, quando apoiadores do ex-presidente invadiram o Capitólio para tentar mudar o resultado da eleição à força.

Já a primária para o Senado segue indefinida nesta sexta (27), dez dias após a votação. Com 99% apurados, Mehmet Oz, nome de Trump, lidera com 31,2%, só 900 votos à frente de David Mccormick. Pelas regras locais, haverá uma recontagem, a ser concluída em 8 de junho.

O ex-presidente usou a demora para voltar a criticar o sistema eleitoral americano. Disse que os EUA estão virando uma Venezuela e chegou a estimular Oz a declarar vitória antes do resultado final. Nas postagens, Trump segue com seu estilo de autopromoç­ão. “Dr. Oz parece estar em boa forma na Pensilvâni­a, mas LEMBREM que eu o apoiei muito tarde. Se eu tivesse o apoiado no começo, teria havido grande diferença!”, postou na Truth Social.

No Texas, governado por republican­os desde 1995, o ex-presidente viu 33 indicados seus vencerem, incluindo uma disputa simbólica: Ken Paxton bateu George P. Bush na primária para procurador-geral. O resultado reflete o declínio da dinastia Bush, que fez dois presidente­s que depois se tornaram críticos de Trump. (George Prescott, 46, é filho do ex-governador da Flórida Jeb Bush e neto do ex-presidente George H.W. Bush, morto em 2018.)

O foco de Trump nas primárias é voltado também para funções secundária­s do Executivo —em vários estados definidas por votação popular. O posto de secretário de Estado local, por exemplo, inclui a atribuição de organizar eleições, já que no país não há um órgão federal que centraliza a apuração e cada governo certifica o resultado de seu estado. Assim, o expresiden­te vê como estratégic­o ter aliados nessa posição, para o caso de encarar novamente uma eleição apertada e tentar algum tipo de manipulaçã­o. Ele pode concorrer de novo nas eleições de 2024.

Outro ponto para medir a influência do ex-presidente é como os candidatos se posicionam sobre 2020. Um estudo do Brookings com 493 republican­os que disputaram primárias já realizadas apontou que 74% não mencionam a posição sobre a eleição presidenci­al, 8% dizem crer que o pleito foi roubado e 15% defendem mais investigaç­ões, mas consideram Biden o mandatário legítimo.

A pesquisa aponta ainda que 46% dos candidatos citam ideias do político, mesmo que não tenham recebido seu apoio de modo formal. “Até agora, Trump e o trumpismo estão indo bem, mas há outro Partido Republican­o sem Trump que está aí, esquecido”, pondera Elaine Kamarck, pesquisado­ra do Instituto Brookings, em artigo recente.

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Maddie Mcgarvey - 3.mai.22/the New York Times Apoiadores de J. D. Vance celebram vitória do aliado de Trump nas primárias republican­as para o Senado pelo estado de Ohio, em Cincinnati

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