Mostra pergunta o que é um imigrante desejado
Artistas Anaís Escalona, Shambuyi Wetu e Zé Vicente expõem obras no Museu da Imigração em parceria com a Folha
Uma série de indagações impulsionou a montagem de “Eu Vim de Lá”, a principal instalação da mostra que o Museu da Imigração, em São Paulo, inaugura neste sábado. O brasileiro é mesmo um povo acolhedor? Diferentes fluxos migratórios foram recebidos da mesma forma ao longo das décadas?
A criação de três artistas que vivem na capital paulista —a venezuelana Anaís Escalona, o congolês Shambuyi Wetu e o brasileiros Zé Vicente— não oferece uma resposta fechada à pergunta, mas lança reflexões por meio decolagens, recortes, bordados e uma escultura.
Inicialmente, eles fizeram uma extensa pesquisa nos acervos fotográficos do museu e da Folha, instituições parceiras na realização da mostra. Essa busca por imagens de diferentes períodos se somou às vivências dos artistas. Escalona trocou Caracas por São Paulo há 16 anos, e Wetu deixou Kinshasa, capital da República Democrática do Congo, rumo à capital paulista oito anos atrás. “Tínhamos a intenção de desconstruir um discurso colonialista ao qual estamos acostumados”, afirma Zé Vicente, que também assina a curadoria ao lado de Rachel Amoroso. “No começo do século 20, quem eram os imigrantes desejados pelo Brasil? Quais são os desejados hoje? O que as fronteiras dizem sobre os nossos preconceitos?” Ao citar “imigrantes desejados”, ele se refere principalmente aos europeus estimulados a se mudar para o Brasil no final do século 19 e começo do 20, quando as ideologias de branqueamento eram muito populares no país.
A partir de questões como essa, os artistas criaram uma colagem com centenas de imagens, que ligam imigrantes de diversas origens e épocas.
Segundo Wetu, a intenção é apresentar de maneira realista as dificuldades de quem troca o país natal por uma terra desconhecida.
Ao lado dessa estrutura com colagens e recortes, no primeiro andar do museu, há uma série de bandeiras de tecido, elaboradas pelas Emprendedoras sin Fronteras, cooperativa de costureiras da Bolívia e de outros países da América Latina. Numa delas, o bordado anuncia que “o Brasil não recebe a cabeça do imigrante, recebe apenas o seu corpo”.
De acordo com Anaís Escalona, “o imigrante é valorizado no Brasil para o trabalho manual, não para trabalhos intelectuais ou artísticos”.
A exposição se estende pelo jardim. O visitante será recebido por um totem criado a partir de uma performance de Wetu intitulada “Bagagem”.
A mostra abre às 11h. Ao meio-dia, o museu recebe um show da banda La Caravana Orquestra, formada por instrumentistas de países como Chile, Cuba e Venezuela.