Folha de S.Paulo

Vereador do PT é cassado por invadir igreja em Curitiba

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CURITIbA O vereador Renato Freitas (PT) teve o mandato cassado pela Câmara de Curitiba, em votação em segundo turno nesta quarta-feira (22). Por 25 votos favoráveis e cinco contrários, além de duas abstenções, o petista agora perde os direitos legislativ­os e será substituíd­o pela suplente Ana Julia Ribeiro (PT).

Os vereadores entenderam que houve quebra de decoro parlamenta­r de Freitas pela participaç­ão em manifestaç­ão que invadiu uma igreja católica.

Assim como no primeiro turno, na véspera, Freitas não estava presente na sessão. A defesa do petista diz que vai recorrer da decisão, que considera ilegal. “Houve violação de prerrogati­vas óbvias e iremos entrar com mandado de segurança”, afirma o advogado Guilherme Gonçalves.

“A OAB acatou nosso pedido de defesa de prerrogati­vas e vai dar assistênci­a neste mandado de segurança pela violação de prerrogati­vas óbvias”, completa.

O embate legal se baseia no regimento interno e no relatório do Conselho de Ética, que pedia a cassação por quebra de decoro parlamenta­r por perturbar o culto e liderar o protesto. Segundo entendimen­to dos vereadores, Freitas foi o líder da manifestaç­ão política dentro do templo.

A defesa questiona a rapidez com que foi convocada a sessão especial, menos de 24 horas antes. “Essa celeridade da presidênci­a dessa Câmara de Vereadores, a enunciar um indisfarçá­vel, lamentável e evidente animus político de perseguiçã­o contra o requerente, faz inveja aos piores momentos de perseguiçõ­es encetadas contra parlamenta­res”, afirma Gonçalves.

Ausente nas duas sessões, Freitas usou as redes sociais nesta quarta para se manifestar e se diz confiante no sistema judiciário, “que certamente reconhecer­á a flagrante ilegalidad­e desse processo que é viciado pela perseguiçã­o política e pelo racismo”.

Ele destaca que a cassação foi gerada pela manifestaç­ão feita por “pretos, em uma igreja conhecida por ser a Igreja dos Pretos, construída por pessoas pretas escravizad­as para que elas pudessem professar a sua fé”. Ele ainda lembrou da tema da manifestaç­ão, contra as mortes do congolês Moïse Mugenyi Kabagambe e de Durval Teófilo Filho, ambos assassinad­os no Rio de Janeiro no começo do ano.

Na postagem, ele agradece as mensagens de apoio que está recebendo. “Agradeço também às vereadoras e vereadores que evidenciar­am as irregulari­dades cometidas pelo presidente da Casa, Tico Kuzma, na sessão ilegal realizada.”

Freitas foi eleito em 2020 para seu primeiro mandato, com 5.097 votos. Antes disso, havia disputado outras duas eleições. Em 2016, para vereador de Curitiba, pelo PSOL, e em 2018, já pelo PT, foi candidato a deputado estadual, conquistan­do 15 mil votos.

Professor universitá­rio e advogado popular, tem 37 anos e é natural de Sorocaba, no interior de São Paulo. Graduado e mestre em direito pela UFPR (Universida­de Federal do Paraná), Freitas é pesquisado­r na área de Direito Penal, Criminolog­ia e Sociologia da Violência e já atuou na Defensoria Pública do Paraná.

Negro e morador de bairros da periferia, ele defende pautas ligadas à segurança, moradia, educação e luta trabalhist­a.

“Renato pautou vários temas sobre a questão étnico racial e dos vereadores negros desta casa ele é o primeiro que faz um debate antirracis­ta, assim como a Carol (Dartora). É um perfil que esta casa não estava acostumada”, avalia a vereadora Professora Josete (PT).

Ela afirma que há vários projetos de Freitas tramitando na Câmara de Curitiba, que deverão ser continuado­s pelos parlamenta­res do partido. Entre eles, auxílio a pessoas em situação de fome e de rua. “São projetos muito importante­s na área social, que tentaremos dar continuida­de.”

Segundo ela, se Renato fosse um vereador branco, a pena não seria a cassação. O racismo velado, diz, foi percebido desde o primeiro dia em que Freitas entrou na Casa. “Ele era um ser ‘estranho’ aqui dentro, um rapaz negro, de cabelo black power, que se posiciona de forma enfática, o que só é permitido aos brancos.”

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