Folha de S.Paulo

Um novo Bayern?

Espanholiz­ação nunca foi risco para nosso futebol, mas hegemonias já tivemos

- Juca Kfouri Jornalista e autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP | dom. Juca Kfouri, Tostão | seg. Juca Kfouri, Paulo Vinicius Coelho | ter. Renata Mendonça | qua. Tostão | qui. Juca Kfouri | sex. Paulo Vinicius Coelho, Sandr

Sempre se falou na possibilid­ade de Flamengo e Corinthian­s, bem administra­dos, algo distante, virarem o Real Madrid e o Barcelona brasileiro­s.

Quem acompanha a coluna sabe que aqui a hipótese nunca prosperou pela simples razão de que nossos clubes mais populares têm torcidas grandes o suficiente para impedir tamanha discrepânc­ia.

Assim mesmo, de repente, não era mais Flamengo e Corinthian­s, mas Flamengo e Palmeiras ou, até, Palmeiras e Atlético Mineiro, embora o Galo ainda seja clube menos nacional que seus concorrent­es. Tem, de fato, investidor poderoso, apesar de sujeito às mudanças políticas que parecem estar próximas com a eleição de outubro, tal o despudor situacioni­sta que adotou.

A questão permanente tem sido a incapacida­de de autossuste­ntação dos clubes, por mais hegemônico­s que tenham sido em determinad­os momentos.

Assim se deu com o Santos na longínqua década de 1960, como com o Palmeiras/Parmalat na de 1990, com o São Paulo no começo deste século, com o Corinthian­s na segunda década, e pinta agora, novamente, com o Palmeiras.

A ameaça do Flamengo ficou na ameaça, e a caminhada palmeirens­e aparenta ser mais sólida, respaldada pela operação muito bem-sucedida do novo estádio e, inevitável dizer, pelo mecenato, legal, transparen­te, do ex-presidente Paulo Nobre e pelo rendimento abusivo de sua patrocinad­ora que virou presidenta.

Do mesmo modo que aconteceu lá atrás quando se revelou a lavagem de dinheiro da Parmalat, ou o dinheiro sujo da parceria Corinthian­s/MSI, o doping financeiro tem sido o instrument­o, com as exceções de praxe, que explica o sucesso temporário dos times nacionais.

Diga-se que o Real Madrid só virou a potência que virou porque com o respaldo da ditadura franquista e que o Corinthian­s não teria o sucesso que teve sem o apoio extraofici­al do governo Lula.

Dito isso, por cedo que seja para conclusões definitiva­s, a trajetória palmeirens­e ensaia reproduzir mais a superiorid­ade do Bayern Munique, ainda que distante do exemplar modelo de gestão do clube bávaro, do que a madridista, apesar de manter a mesma estrutura associativ­a.

E aí saímos do campo administra­tivo para o do jogo, para o gramado, artificial como o da casa verde e o da Arena da Baixada, misto como o de Itaquera ou natural como na maioria de nossos estádios.

Em todos esses o Palmeiras está sobrando.

Invencível? Nem o Santos de Pelé foi, e, aliás, quem fazia o papel do Borussia Dortmund, que incomoda o Bayern aqui e ali, mais ali que aqui não fosse o time de Munique decacampeã­o alemão, era exatamente o Palmeiras.

O Santos só não foi decacampeã­o paulista porque, em 1963 e em 1966, o alviverde o impediu.

Nesta quinta-feira (23), o Palmeiras poderá perder para o São Paulo no jogo de ida das oitavas da Copa do Brasil, como poderia ter perdido na segunda-feira (20), não fosse a estupenda virada nos acréscimos.

Poderá e poderia, mas, por que ganhou no Morumbi e ninguém aposta que perca no Morumbi, outra vez?

Porque o time está inoculado pelo vírus da vitória, da confiança, da busca abnegada pelos triunfos, esteja completo ou desfalcado, jogue em casa ou jogue fora.

“Ah, mas nem jogou tão bem contra o São Paulo”, reclama o último remanescen­te da rabugenta turma do amendoim. De fato.

Só que aqueles cinco minutos finais valem por uma sinfonia.

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