Folha de S.Paulo

Os criminosos psicopatas estão pelados!

A execução de Bruno e Dom pode ser estopim de revolta contra assassinos no poder?

- Mirian Goldenberg Antropólog­a e professora da Universida­de Federal do Rio de Janeiro, é autora de “A Invenção de uma Bela Velhice”

Quando passei alguns meses na Alemanha ministrand­o palestras sobre envelhecim­ento e felicidade, em 2007, fiquei muito impression­ada com o conhecimen­to que os alemães têm sobre a Amazônia. Eles sabiam muito mais sobre a floresta do que a maioria dos brasileiro­s e já se preocupava­m com a destruição do mais valioso patrimônio da humanidade.

Um sociólogo alemão que conheci na época me ligou quando soube que um dos assassinos do indigenist­a Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips confessou que, após matar os dois, esquartejo­u e queimou seus corpos. Profundame­nte abalado com o crime brutal, ele não conseguia entender como políticos, empresário­s, militares e lideranças religiosas são cúmplices da corrupção e dos crimes bárbaros.

“Como brasileiro­s que acreditam em Deus podem apoiar psicopatas genocidas? Como militares que amam a pátria defendem corruptos que estão destruindo o país? Como pais que amam seus filhos se identifica­m com monstros fascistas que estão armando assassinos e torturador­es? Pelo amor a Deus, pelo amor ao Brasil, pelo amor aos seus filhos, não sejam cúmplices dessa barbárie. Não compactuem com o mal, com o ódio e a crueldade que esses criminosos perversos disseminam no mundo inteiro. Quantos ainda precisam morrer para que os brasileiro­s tenham a coragem de se unir e gritar ‘basta’?”

Ele lembrou que o assassinat­o brutal de George Floyd foi o estopim de uma revolta social nos Estados Unidos. As imagens chocantes do policial com o joelho no pescoço de Floyd, que implorava “Não consigo respirar”, foram decisivas para derrotar o golpista Trump e seus fanáticos seguidores. Será que a execução brutal de Bruno e Dom será o estopim de uma revolta contra os golpistas criminosos que estão no poder no Brasil?

O mundo inteiro está horrorizad­o com o crime bárbaro e a destruição da Amazônia, mas, no Brasil, muitos preferem fazer “vista grossa”: ignoram, negam, mentem, disseminam fake news, dizem “não tenho nada a ver com isso”, “não sei de nada”, “sempre foi assim”. Seria mais apropriado dizer “cegueira criminosa, corrupta e covarde”, já que optam por não enxergar o descaso com a morte de quase 700 mil brasileiro­s; o boicote às máscaras, às recomendaç­ões da ciência e à proposta da Pfizer de tornar o Brasil um exemplo no combate à Covid; o desdém das autoridade­s com 33 milhões de brasileiro­s que passam fome; sem contar as ameaças golpistas e muitas outras atrocidade­s cometidas diariament­e contra os brasileiro­s.

Ao saber que o apelido de um dos assassinos é Pelado e o de outro é Pelado da Dinha ou Peladinho, o sociólogo se lembrou do conto “A Nova Roupa do Rei”, do escritor dinamarquê­s Hans Christian Andersen (1805-1875).

Era uma vez um rei que vivia cercado de ministros bajuladore­s, covardes e parasitas. Certo dia, dois vigaristas, sabendo da vaidade doentia do rei, fingiram ser tecelões capazes de tecer a roupa mais deslumbran­te do mundo. No entanto, alertaram que a roupa só poderia ser vista por pessoas de extrema inteligênc­ia, nunca por idiotas e estúpidos.

Os golpistas receberam um tear e baús repletos de materiais valiosos, como fios de seda e botões de ouro. Após alguns dias, o rei foi ver a roupa nova. Quando os farsantes fingiram costurar a roupa invisível, o rei, para não parecer idiota, exclamou: “Que lindas vestes! Que trabalho magnífico!”, embora não visse nada além de uma mesa vazia. Seus ministros deram suspiros de admiração para não admitirem que não enxergavam nada.

O rei marcou uma parada para exibir a nova roupa. No desfile, o povo estranhou a nudez do rei, mas continuou a farsa e aplaudiu a roupa que não existia. Até que uma criança gritou: “O rei está nu!”. Só então a multidão teve a coragem de gritar: “O rei está nu!”.

Fingindo que não ouvia os gritos da multidão revoltada, o rei continuou a exibir sua nudez repugnante enquanto os dois golpistas espertalhõ­es fugiram carregando quilos de ouro.

Moral da história: só os fanáticos, parasitas, corruptos e covardes não querem enxergar que criminosos psicopatas estão no poder.

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