Startups passam por ressaca com onda de demissões
Retração nos investimentos após liquidez da pandemia barateia empresas e cria pressão por lucro
Nos últimos dois anos, enquanto o comércio parava e as Bolsas derretiam, startups quebraram recordes de investimento. Mas dados de aportes de 2022 mostram que a conta da pandemia pode ter finalmente chegado ao setor.
Até maio, investidores direcionaram US$ 2,6 bilhões para startups, ante US$ 3,2 bilhões no mesmo período de 2021. Já o valor médio dos investimentos subiu de US$ 9,2 milhões para US$ 12,5 milhões, o que mostra uma concentração.
Ao todo, no ano passado, foram US$ 9,4 bilhões injetados na inovação brasileira, quase 2,6 vezes o que foi captado pelas empresas do segmento em 2020 —US$ 3,5 bilhões, o que já havia sido um recorde.
O ciclo mais recente de queda dos investimentos ajustou valores de mercado das startups, antes inflados pelos aportes, e causou cortes em massa.
Em abril, Quintoandar, Loft e Facily demitiram mais de 400 funcionários em uma semana, história que se repete em outras empresas do setor. Na terça-feira (21), 340 pessoas foram avisadas de desligamento no Ebanx, corte que representa 20% dos mais de 1.700 funcionários no Brasil.
O entusiasmo com startups nos últimos dois anos é explicado pela política monetária de quase todos os bancos centrais no mundo, que viram as atividades paralisarem na pandemia. A medida padrão foi diminuir as taxas de juros para incentivar a injeção de capital na economia.
Além disso, a digitalização forçada da população, que se bancarizou, impulsionou de aulas a distância a compras pela internet —segmentos de atuação de muitas startups.
Agora, os dois fatores mudaram. A volta das atividades presenciais joga dúvidas sobre o desempenho futuro das empresas de tecnologia. Não se sabe se hábitos online, como o ecommerce, serão mantidos.
Já os juros vêm sendo ajustados na tentativa de frear a inflação global, que não dá sinais de trégua. Taxas altas tornam mais rentáveis aplicações menos arriscadas que startups —empresas em fase de crescimento acelerado que, em muitos casos, queimam caixa para crescer e superar as concorrentes.
O resultado é escassez de dinheiro para aportes, pressão dos investidores por lucro e, por outro lado, oportunidades de negócio para companhias que querem adquirir startups por preços mais baixos.
“Antes, era crescimento a qualquer custo. Hoje, o investidor quer startups que deem resultado”, diz Roberto Pina, presidente-executivo do fundo de investimentos Sevensete. “O momento é de reduzir os riscos e o tamanho do cheque.”
Grandes companhias que querem incorporar inovações de startups serão beneficiadas pelo ajuste dos valores.
As startups do guarda-chuva da Sevensete estão recebendo mais propostas de compra. Se nos últimos anos 90% das propostas eram de fundos, hoje mais da metade das tentativas de negócio vem de grandes empresas.