Folha de S.Paulo

Tradiciona­l futebol de botão tem torneio com recorde de participaç­ão

Maior campeonato da modalidade na história reuniu 240 participan­tes no Morumbi e teve até transmissã­o online

- Alex Sabino

Christophe­r Barres Pereira perdeu o controle do carro e bateu em caminhão que estava parado. Isso não foi o mais grave. Havia uma mala de viagem solta no carro. Ela voou com o choque e acertou a nuca do fisioterap­euta de 45 anos. As fraturas resultante­s do acidente o deixaram 20 dias em coma.

A recuperaçã­o, lenta e ainda não finalizada, passa pelas sessões de fisioterap­ia e também pelo esporte que é a vida de Christophe­r: o futebol de mesa. Entre as crianças, conhecido como jogo de botão.

“Eu pratico isso desde os sete anos. É algo que me ajuda a voltar a ter sensibilid­ade nas mãos, a ter noção de força. A ajustar o que chamamos de habilidade fina, o que perdi na batida”, explica ele, que dá dicas para outros jogadores, após as partidas, do que fizeram de errado e onde podem melhorar.

A história dele não é isolada entre os 240 participan­tes do Campeonato Brasileiro de futebol de mesa, realizado na sede social do São Paulo, no Morumbi, e finalizado no último domingo (19). Foi o maior torneio da história da modalidade no país.

Com participan­tes de 11 estados diferentes, o que estava em disputa era apenas o amor pelo jogo. Não houve premiação em dinheiro. Foi oferecido um troféu.

Isso não impediu o enfermeiro Thiago Roco Rodrigues, 35, de mudar seu turno no Hospital Albert Einstein para jogar. Primeiro do ranking brasileiro, ele vê o botão como um apoio na sua profissão. Algo que o ensina a ter mais disciplina, concentraç­ão, respeito pelas pessoas. Está longe, muito longe, de ser uma brincadeir­a.

Há divergênci­as de regras entre diferentes estados, reclamaçõe­s com relação à qualidade da bola usada (e há apenas um fabricante em São Paulo) e provocaçõe­s entre jogadores. Por causa disso, foi implantada uma regra de que gols não devem ser comemorado­s de forma efusiva por quem o marca. Se isso acontece, o adversário pode reivindica­r uma falta técnica.

No futebol de campo, é a jogada vista como máxima expressão de alegria. No botão, não. Fazer festa significa infração.

Há semelhança­s nos esquemas táticos. O conhecimen­to do rival faz mudar o posicionam­ento dos “atletas” na mesa, e os zagueiros podem ser maiores do que os demais botões para atrapalhar as ações ofensivas da outra equipe. Não é sorte, gostam de dizer. É habilidade.

O Brasileiro foi disputado em diversas mesas armadas no ginásio do Morumbi. Uma delas, chamada de superarena, tinha transmissã­o pelo Youtube.

Como o campeonato aconteceu em São Paulo, a organizaçã­o coube à Federação Paulista da modalidade. A entidade é presidida por José Jorge Farah Neto, filho de Eduardo José Farah (19342014), que comandou a FPF (Federação Paulista de Futebol) de 1988 a 2003.

Farah tenta montar a equação financeira para que a cidade possa ser sede do Mundial neste ano. A arrecadaçã­o projetada no torneio é entre R$ 8.000 e R$ 9.000. A ideia era realizá-lo em um hotel, mas o aluguel do espaço sairia por cerca de R$ 35 mil.

Será a competição mais especial para Jefferson do Amaral, 52. Primeiro do ranking paulista e atleta do Palmeiras, ele espera obter o troféu mais uma vez. Em 2015, venceu na Hungria. “Eu sou fanático por futebol. Vejo tudo o que passa. No futebol de mesa, você faz jogadas que simulam o que acontece no futebol.”

A preocupaçã­o é torná-lo atrativo para as novas gerações, acostumada­s ao videogame. Embora as regras sejam fáceis, leva tempo para ficar bom no botão. É muito mais fácil estar com um controle de Playstatio­n ou Xbox nas mãos.

Na categoria sub-18, a organizaçã­o reservou 32 vagas. Houve apenas 16 inscritos.

A urgência é em preservar uma tradição que começou com tampas de garrafas servindo como jogadores, passou por acrílico, celulose, e hoje tem equipes compradas por mais de R$ 1.000, com detalhes banhados a ouro.

“É o melhor esporte que tem. Não troco por nada. E ainda me ajuda no tratamento, a ficar bom depois do acidente”, conclui Christophe­r, sempre com a camisa do Friburguen­se, clube que defende no futebol de mesa.

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Eduardo Knapp/folhapress, Mesas de futebol de botão no Morumbi

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