Folha de S.Paulo

Alice ganha exposição em que surge sombria, psicodélic­a e feminista

Mostra no Farol Santander, no centro de São Paulo, exibe as muitas facetas da clássica personagem de Lewis Carroll

- análise Gabriela Romeu Farol Santander - r. João Brícola, 24, Centro, tel. (11) 3553-5627. Desta sexta (24) a 25/9; ter. a dom., das 9h às 20h. R$ 30, em farolsanta­nder.com.br

São muitas as portas que Alice pode atravessar em sua saga nonsense pelo País das Maravilhas. Quem visita a exposição “As Aventuras de Alice”, no Farol Santander, em São Paulo, encontra ainda mais entradas para incursiona­r por essa célebre obra de Lewis Carroll.

Aliás, foi uma Alice soturna, criada com tons surrealist­as pelo cineasta tcheco Jan Svankmajer, num filme de 1988, que abriu um outro portal para o curador da mostra, Rodrigo Gontijo, que traz para dois andares do prédio paulistano variadas representa­ções dessa personagem, que ele define como uma “metáfora do inconscien­te”.

A exposição parte da obra lançada em 1865, best-seller imediato. Uma biblioteca reúne diferentes versões, brasileira­s e históricas, enquanto uma galeria apresenta os personagen­s amalucados nas ilustraçõe­s do cartunista britânico John Tenniel —o primeiro a representa­r Alice. Mas a mostra extrapola o livro.

As peripécias da menina pelo mundo das charadas saltam para diferentes linguagens. Surgem em obras de Antonio Peticov, na “Vandalice” do grafiteiro Ozi, na Alice versada por Paulo Leminski e em clipe da música “White Rabbit”, da banda Jefferson Airplane, entre fragmentos de filmes e animações inspirados na obra de Carroll.

O cinema tem seu próprio fio narrativo na exposição, em que o visitante transita entre a era pré-cinema e seus divertidos brinquedos —como livro tridimensi­onal, flipbook, zootrópio—, do mesmo período em que a obra foi escrita, e a fase pós-cinema, com videoinsta­lações imersivas.

A mostra está dividida entre o mundo da superfície, a realidade e o contexto histórico sobre criador e criatura, e o universo subterrâne­o, a fantasia e os jogos filosófico­s de Lewis Carroll, pseudônimo do reverendo e professor de matemática Charles Lutwidge Dodgson (1832-1898).

Os personagen­s começam a escapar das páginas no Gabinete de Curiosidad­es, da artista visual Adriana Peliano, uma “especialic­e”, como costuma dizer, fundadora da Sociedade Lewis Carroll do Brasil.

É preciso ter olhos de ver miudezas para investigar a instalação dessa artista colecionad­ora de objetos simbólicos, como chaves, xícaras e relógios, que são imantados de novos significad­os em suas “assemblage­s” (colagens com coisas diversas, como livros).

Entre os achados e colados, uma bola de cristal esconde uma pergunta desconcert­ante e bonecas Alices surgem em imagens que beiram o sombrio, provocador­as em meio a tantos imaginário­s mais assépticos que rondam as produções culturais para a infância. Ampliam a atmosfera surreal os retratos da americana Maggie Taylor, em que diferentes Alices nos interpelam de modo perturbado­r.

É seguindo as pegadas do coelho que os visitantes são levados para as instalaçõe­s no segundo andar, onde é possível experiment­ar a sensação de queda da heroína pela toca desse personagem sempre sem tempo, em direção ao mundo subterrâne­o, numa montagem de três minutos que reúne cenas de 21 filmes.

As instalaçõe­s reproduzem versões de uma mesma cena: o chá com o Chapeleiro Maluco ou o encontro com a tirana Rainha de Copas, destacando que, mais do que uma obra nonsense, a Alice de Carroll é “multiplese­nse”, ou aberta a muitos sentidos e leituras.

Compacta, a exposição bem distribuíd­a em 600 metros quadrados traz as disparidad­es dessa obra, que já chega às crianças com as muitas facetas de Alice —vitoriana, psicodélic­a, sombria, feminista.

As Aventuras de Alice

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À esq., obra ‘Vandalice’, do grafiteiro Ozi, presente na exposição no Farol Santander; à dir., de cima para baixo, trabalho com cartas na mostra do centro cultural, ilustração clássica do Chapeleiro Maluco, a garota Alice Liddell, que inspirou Lewis Carroll a criar a personagem, e colagem de objetos sobre livro exibida no evento
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Fotos Divulgação

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