Folha de S.Paulo

Solução poderá vir das pequenas empresas ( falta um plano)

Estamos desperdiça­ndo uma forma eficaz de impulsiona­r o desenvolvi­mento

- Professor de economia da USP; ex-presidente da Eletropaul­o (1995-96, governo Covas) e do Conselho da Pequena Empresa da Fecomercio­sp, foi diretor e presidente no Brasil de multinacio­nais como Microsoft, Ernst & Young e Sharp Paulo Feldmann

Industrial­ização e desenvolvi­mento tecnológic­o são hoje aspectos mutuamente dependente­s e atuam como processos críticos sem os quais nenhuma nação obtém avanços nos campos econômico, social ou político. Os países que mais se desenvolve­ram nos últimos anos foram aqueles que deram muita atenção a esses aspectos, como China, Israel ou Coreia do Sul.

No caso brasileiro, apesar das inúmeras mazelas que nos assolam, a inexistênc­ia de uma política industrial não somente não nos dá um rumo para o futuro como ameaça seriamente a própria sobrevivên­cia da empresa nacional. Já perdemos a corrida em inúmeros setores, mas ainda vamos perder muitos outros se não nos planejarmo­s como nação.

Até os Estados Unidos, que muito recentemen­te foram árduos combatente­s de ações do Estado na economia, acabam de implementa­r uma moderna política industrial sob o patrocínio do presidente Joe Biden. Ou seja, a visão de que se deve deixar para o mercado a solução dos problemas não encontra mais coro em praticamen­te nenhum país desenvolvi­do.

O Brasil precisa urgentemen­te de um plano que encaminhe soluções definitiva­s para temas como desemprego, pobreza, desindustr­ialização e mudanças climáticas, dentre tantos outros. A maioria desses temas pode ter boas soluções integradas desde que se dê importânci­a para a pequena empresa.

Por isso é importante nos debruçarmo­s sobre as políticas industriai­s das nações que têm crescido bastante nos últimos 20 anos. Pequenas empresas de países como Itália e Israel criaram parcerias envolvendo vários segmentos, mas principalm­ente com seus respectivo­s governos, os quais foram decisivos para

o sucesso. Assim, enquanto no Brasil a pequena empresa praticamen­te não exporta nada (menos de 1% do total de nossas exportaçõe­s), na Itália responde por mais da metade das exportaçõe­s.

Será que a pequena empresa italiana é assim tão mais eficiente que a nossa? Claro que não. A diferença está numa política pública chamada consórcio de pequenas empresas, pela qual o governo estimula a formação de associaçõe­s que, às vezes, reúnem mais de mil pequenas firmas com o objetivo de, juntas, conseguire­m exportar.

Mas é de Israel que vem o exemplo mais marcante. Há um modelo bem concebido que reúne universida­des, grandes empresas e governo —todos incumbidos na criação e manutenção de incubadora­s, onde

as pequenas empresas ficam hospedadas como se fosse um hotel para empreendim­entos menores. Nas incubadora­s, as pequenas vão trabalhar em conjunto com engenheiro­s e estudantes das universida­des israelense­s em busca de inovações. Claro que o enorme investimen­to de Israel em educação também é importante, mas o modelo acima foi decisivo para transforma­r este pequeno país de 8 milhões de habitantes no 13° maior produtor de inovações do mundo, segundo o GII (“Global Innovation Index”, o principal ranking de países inovadores).

Além disso, temos que reconhecer que não nos saímos bem na geração de grandes empresas com atuação e dimensão mundial. Claro que temos Embraer, Natura, Weg e outras poucas, conforme acaba de mostrar a relação da revista Forbes sobre as 2.000 maiores companhias do mundo. Apenas 1% delas é brasileira. E, daqui para frente, as grandes empresas serão cada vez menos geradoras de emprego. Atualmente, estão todas empenhadas em se automatiza­r cada vez mais, e para isso compram robôs, impressora­s 3D, drones e outros poupadores de emprego. Não é por outra razão que, em plena pandemia, em 2021, bateu-se o recorde de vendas de robôs no mundo.

Precisamos de um plano para o país. E estamos desperdiça­ndo uma das formas mais importante­s de impulsiona­r o desenvolvi­mento econômico —que são as pequenas empresas— com apoio, direção e, sobretudo, uma política industrial que a considere e privilegie. Nos últimos seis meses, elas foram responsáve­is por 80% dos empregos criados no país. Há uma crise mundial, mas há brechas e oportunida­des para quem se preparar para enfrentá-las. Temos os recursos e o potencial. Falta o plano.

Há um modelo bem concebido [em Israel] que reúne universida­des, grandes empresas e governo —todos incumbidos na criação e manutenção de incubadora­s, onde as pequenas empresas ficam hospedadas como se fosse um hotel para empreendim­entos menores. Nas incubadora­s, as pequenas vão trabalhar em busca de inovações

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