Folha de S.Paulo

Brasileiro troca óleo por banha e Uber por bicicleta

- LV

Trocar o óleo de soja pela banha de porco na hora de cozinhar. Cortar a carne vermelha do cardápio na maior parte da semana. Reduzir o consumo de leite e ovos. Substituir corridas em aplicativo­s de transporte pela bicicleta. Adiar viagens de avião.

Em tempos de inflação alta e persistent­e, brasileiro­s fazem malabarism­os para lidar com os preços e preservar as finanças, segundo relatos de leitores ouvidos pela Folha.

Moradora da capital paulista, a assistente administra­tiva Ana Letícia Rodrigues Brandão, 26, faz parte do grupo que teve de alterar a rotina devido à carestia.

Há cerca de seis meses, ela passou a viver com o namorado, o que até ajudou a aliviar, mas não eliminou toda a pressão sobre o orçamento.

“A gente faz adaptações, divide despesas, mas o custo sai alto.”, afirma.

A jovem conta que reduziu o consumo de leite em razão dos aumentos nas gôndolas dos supermerca­dos. Na tentativa de economizar gás de cozinha, busca ligar menos vezes o fogão e preparar refeições em quantidade­s maiores.

Também evita fazer frituras com óleo de soja, outro item que ficou mais caro na pandemia. No lugar do óleo, é usada banha de porco, trazida do Piauí, terra natal da família de Ana Letícia.

Na ida mais recente para o estado nordestino, em janeiro, a jovem encarou uma viagem de ônibus de três dias, já que os preços das passagens aéreas não cabiam no bolso.

“A gente tem evitado fazer outras viagens”, diz.

Guilherme Vieira, 25, saiu da casa dos pais, em São Paulo, no período em que a inflação ganhou força no país. Há cerca de oito meses, ele se mudou para Maceió por motivos de trabalho. Vieira é formado em gestão de políticas públicas.

Na capital alagoana, o jovem costumava dividir corridas em um aplicativo de transporte para se deslocar até o trabalho. O problema é que, segundo ele, os preços das viagens pularam da faixa de R$ 10 para em torno de R$ 25. A saída foi comprar uma bicicleta.

“Estou procurando ir para o trabalho e voltar para casa de bike”, diz Vieira, que também diminuiu as compras de produtos como leite e ovos devido à inflação.

O autônomo Gustavo Alves Amorim, 32, diz que sentiu duplamente a carestia dos alimentos. É que ele produz e vende itens como bolos e brownies. “Senti o impacto da inflação na rotina pessoal e no lado profission­al também”, conta o morador do município mineiro de Ipatinga (212 km de Belo Horizonte).

“Percebi a alta de produtos como óleo de soja e leite. O que tenho feito é buscar alternativ­as: fazer testes, procurar outras marcas”, acrescenta.

A inflação acumulada em 12 meses está em dois dígitos desde setembro de 2021.

Economista­s até esperam que o indicador encerre 2022 abaixo de 10%, mas a tendência é de preços em patamares ainda elevados.

Às vésperas das eleições, a escalada inflacioná­ria virou dor de cabeça para o presidente Jair Bolsonaro (PL). O aumento dos preços é visto por membros da campanha dele como principal obstáculo para reeleição.

Pressionad­o, Bolsonaro aposta no corte de impostos sobre combustíve­is e outros itens para frear a carestia.

O professor de história Marcelo Rebinski, 51, é mais um brasileiro que relata preocupaçã­o com a perda do poder de compra. Morador de Curitiba, ele diminuiu o consumo de carne vermelha.

“A gente busca encontrar uma fonte de proteínas mais barata, como carne de frango e ovo. O problema é que esses preços também subiram”, afirma.

“Aí a gente tenta suprir com outros alimentos, como feijão e lentilha. Faz uma variação”, completa Rebinski, que ainda cortou gastos com lazer e compra de livros.

Com a pressão inflacioná­ria, a produtora audiovisua­l Dandara Aparecida, 26, tenta frear suas despesas mensais na cidade do Rio de Janeiro, onde passou a morar durante a pandemia, após deixar a capital paulista.

Ela diz que diminuiu a quantidade das compras e eliminou itens supérfluos da lista do supermerca­do. “Ao longo dos meses, fui percebendo os aumentos nos preços e decidi reduzir os mimos. Alguns congelados e iogurtes, por exemplo, eu diminui”, conta.

Leia mais sobre inflação à pág. A20

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Bruno Santos/folhapress A assistente administra­tiva Ana Letícia Rodrigues Brandão, moradora de SP que passou a fazer frituras com banha de porco trazida do Piauí

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