Folha de S.Paulo

Troca no comando do Exército deve resultar em novas demissões

Mudanças podem ocorrer por insatisfaç­ão de Lula e dança das cadeiras natural com ida de militares para reserva

- Cézar Feitoza

brasília A decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de trocar o comando do Exército, tirando o general Júlio César de Arruda do cargo, deve acarretar novas mudanças em cargos estratégic­os da Força. Alguns por insatisfaç­ão do petista, outros por mudanças naturais com as trocas de comando.

As decisões, no entanto, serão tomadas em conversas entre o presidente, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, e o novo comandante do Exército, Tomás Paiva.

Uma das mudanças considerad­as certas é com o tenentecor­onel Mauro Cid. Ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o militar foi designado no ano passado para comandar o 1⁰ Batalhão de Ações de Comando, em Goiânia,

como revelou a Folha.

A saída de Cid de Brasília se deu em acordo entre o Exército e o Palácio do Planalto, enquanto avançavam investigaç­ões contra o tenente-coronel na PF (Polícia Federal).

Assumir um cargo de comando, segundo militares ouvidos pela Folha, era um processo natural pelo posto a que havia chegado —Cid foi promovido de major a tenentecor­onel na gestão Bolsonaro.

A situação de Cid foi considerad­a a gota d’água para a queda de Arruda. Segundo pessoas próximas, Lula queria a retirada do tenente-coronel do posto de comando enquanto investigaç­ões sobre transações suspeitas feitas por ele, com recursos da família de Bolsonaro, estivessem na mira da Polícia Federal, como revelou a Folha.

Arruda, no entanto, resistiu à mudança. De acordo com aliados de Lula, a postura do general neste caso foi decisiva para a troca no comando do Exército.

A manutenção do general Gustavo Henrique Dutra no cargo de comandante Militar do Planalto também passou a ser discutida. General de três estrelas oriundo das Forças Especiais, Dutra é considerad­o um militar habilidoso e com grandes chances de receber a quarta estrela no ombro em 2024.

Nos últimos dois meses, ele defendeu uma retirada gradual do acampament­o em frente ao QG do Exército, em Brasília, sem que houvesse conflito ou violência contra os apoiadores de um golpe militar que estavam no local.

Apesar de a estratégia ter o aval de Múcio, a demora para o desmonte do acampament­o golpista é considerad­a pelo Planalto uma das principais razões para que os ataques contra as sedes dos três Poderes fossem viabilizad­os, em 8 de janeiro.

Pesa também a postura adotada por Dutra, junto com Arruda, de evitar que a Polícia Militar prendesse os golpistas na noite do ataque.

Como a Folha mostrou, o intervento­r Paulo Cappelli queria desmontar o acampament­o bolsonaris­ta após a invasão aos prédios públicos, mas foi barrado pelos militares, que defenderam uma ação coordenada somente na manhã do dia seguinte.

O tenente-coronel Paulo Jorge Fernandes da Hora, chefe do Batalhão da Guarda Presidenci­al, também pode perder o posto. Ele tem sido acusado de dificultar a prisão de golpistas dentro do Palácio do Planalto.

Um inquérito policial-militar foi aberto para investigar a conduta de Fernandes. A aliados ele tem afirmado que não agiu para proteger os golpistas. A versão na caserna é que os policiais militares agiram de forma mais agressiva no Planalto porque um colega, que fazia policiamen­to a cavalo, havia sido agredido momentos antes.

Segundo essa versão, o tenente-coronel teria discutido com os policiais, como mostram vídeos, para conter o ímpeto e evitar agressões quando os manifestan­tes golpistas já estavam controlado­s.

Além dos três, a última mudança que deve ocorrer é a saída do general Valério Stumpf Trindade. Ele e Tomás Paiva ascenderam ao posto de general de Exército juntos em julho de 2019 e, pelas regras militares, o comandante da Força não pode ter entre os subordinad­os nenhum militar mais antigo.

Stumpf é o atual chefe do Estado-Maior do Exército, cargo considerad­o como número 2 da Força. A vaga da chefia do Comando Militar do Sudeste, até então comandando por Tomás, também ficará em aberto.

Com a mudança, devem ser realizadas novas trocas em cargos da cúpula do Exército para evitar uma carência no cargo de chefia.

A função no Estado-Maior costuma ser assumida por um dos oficiais-generais mais antigos da Força.

A demissão de Arruda foi confirmada no sábado (21) por José Múcio Monteiro, após o ministro apresentar formalment­e o novo comandante Tomás Paiva ao presidente Lula.

“Evidenteme­nte que com esses últimos episódios, a questão dos acampament­os, a questão do [ataque] dia 8 de janeiro, as relações no comando do Exército sofreram uma fratura no nível de confiança. Achávamos que podíamos estancar isso logo no início”, disse Múcio, em breve declaração a jornalista­s.

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Alan Santos - 8.mar.20/Divulgação Presidênci­a O tenente-coronel Mauro Cid (de verde), então ajudante de ordem de Bolsonaro, durante viagem do ex-presidente aos EUA

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