Folha de S.Paulo

TSE quer agilizar ações contra Bolsonaro

Ex-presidente pode ficar inelegível; ministros querem julgar processos até junho, para evitar que Kassio analise o caso

- Julia Chaib, Matheus Teixeira e Catia Seabra

Na mira de investigaç­ões tanto do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) como do STF (Supremo Tribunal Federal), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pode ver o desfecho de parte das ações de que é alvo ainda neste semestre.

Integrante­s do TSE querem acelerar julgamento­s e buscam analisar até o meio do ano processos que podem tornar o ex-chefe do Executivo inelegível —ou seja, proibido de disputar eleições.

Uma nova frente de investigaç­ões também pode ser aberta contra o ex-chefe do Executivo neste ano. A AGU (Advocacia Geral da União) avalia os gastos do cartão corporativ­o do ex-presidente para verificar se houve uso irregular de recursos públicos.

Advogados próximos do PT apontam desconfian­ças sobre alguns gastos que se tornaram públicos. Eles dizem ser preciso averiguar se o uso do cartão para abastecime­nto e compras excessivas em padarias em períodos próximos a motociatas pode configurar uso ilícito de dinheiro público em ação de pré-campanha.

Já a análise da AGU é mais abrangente em relação às contas e não é focada no período eleitoral. Caso constatem algo que sugira ilícitos, o próprio governo poderia propor ações ou encaminhar o caso ao MPF (Ministério Público Federal).

Se houver indícios de gastos de pré-campanha que violem a Lei Eleitoral, advogados, inclusive da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), podem pedir para juntar as informaçõe­s nos autos ou mesmo fazer adendos em Aijes (Ação de Investigaç­ão Judicial Eleitoral) em trâmite no TSE.

Há 17 ações desse tipo tramitando contra Bolsonaro na corte eleitoral que podem levar à perda dos direitos políticos do ex-presidente.

Tradiciona­lmente, essas ações têm tido tramitação lenta e exigido provas robustas. Mas alguns elementos pesam para que magistrado­s queiram acelerar processos contra Bolsonaro.

O próprio corregedor eleitoral, Benedito Gonçalves, ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que relata essas ações, indicou a aliados querer acelerar o passo dos julgamento­s por avaliar que esse tipo de instrument­o acaba se arrastando por anos. Ele acredita ser preciso dar encerramen­to aos casos.

Ainda há outra razão para que a ala do TSE composta por integrante­s do Supremo Tribunal Federal queira julgar até junho as ações.

Segundo pessoas próximas a ministros do TSE, os magistrado­s pretendem aniquilar a fatura antes da aposentado­ria do ministro Ricardo Lewandowsk­i em maio. Isso porque a saída dele resultará na entrada de Kassio Nunes Marques, indicado ao STF por Bolsonaro.

A ideia é que os ministros do Supremo da composição atual do tribunal eleitoral votem da mesma forma. Interlocut­ores de ministros afirmam que o clima hoje no TSE é para declarar a inelegibil­idade de Bolsonaro.

A tendência cresceu após os atos golpistas de 8 de janeiro, quando militantes bolsonaris­tas invadiram e depredaram as sedes dos três Poderes. Embora o ex-presidente estivesse em Orlando, nos Estados Unidos, integrante­s do Judiciário e do governo Lula atribuem a gestos passados e a omissões de Bolsonaro o vandalismo contra os edifícios do Congresso, do Planalto e do STF.

Das Aijes no TSE, a mais avançada é uma apresentad­a pelo PDT. Ela aponta que Bolsonaro teria usado a estrutura do Palácio da Alvorada para uma reunião com embaixador­es para atacar a integridad­e do sistema eleitoral. Na ocasião, o ex-presidente colocou em xeque a lisura das urnas.

O PDT aponta suposta prática de abuso de poder político e de uso indevido dos meios de comunicaçã­o.

Está prevista para o dia 8 de fevereiro a instrução do processo, com o depoimento do senador Ciro Nogueira (PPPI), que era ministro da Casa Civil. Essa Aije pode ser a primeira a ser julgada.

O ritmo de julgamento das ações é definido pelo corregedor e pelo presidente do TSE, Alexandre de Moraes. Segundo aliados, ambos estão dispostos a acelerar o processo.

Opositores de Bolsonaro, inclusive a campanha de Lula, questionam ainda nas ações a liberação de parcela extra do auxílio de R$ 1.000 para caminhonei­ros e taxistas, a confecção de milhões de cartões do Auxílio Brasil e o desvirtuam­ento de agendas oficiais.

Após o dia 8 de janeiro, o PDT e o PT pediram que Benedito incluísse a minuta do decreto golpista encontrada pela Polícia Federal na casa do ex-ministro da Justiça de Bolsonaro Anderson Torres.

Um debate jurídico que deverá ocorrer no julgamento contra Bolsonaro é sobre até que ponto o tribunal pode avançar em relação à acusação inicial apresentad­a na ação.

Esse foi um dos principais argumentos que os advogados do ex-presidente usaram na defesa enviada ao TSE em relação à inclusão da minuta do golpe no processo em que o PDT pede a cassação de Bolsonaro devido à reunião realizada no Alvorada com embaixador­es de outros países.

A defesa disse que o próprio relator já delimitou o objeto do processo e, na argumentaç­ão, transcreve­u trecho da decisão do magistrado segundo o qual “a ação tem como causa de pedir fática o alegado desvio de finalidade de reunião havida no dia 18 de julho de 2022”.

“Fácil perceber: delimitado­s a causa de pedir e o pedido, implementa­do o contraditó­rio circunstan­ciado e saneado o feito de maneira cabal, a ação eleitoral teve por encerrada a fase postulatór­ia e encontra-se estabiliza­da”, diz a peça, assinada pelo advogado Tarcísio Vieira de Carvalho.

Caso o movimento interno na corte tenha sucesso, a tramitação da ação contra o expresiden­te irá destoar muito da maneira como o tribunal julgou processos similares nos últimos anos.

A ação que pedia a cassação da chapa de Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), por exemplo, só teve julgamento concluído mais de dois anos e meio após o fim da eleição que elegeu a dupla em 2014.

Quando o TSE analisou o tema, a petista já havia sido destituída do cargo e Temer era o presidente da República.

Os dois foram acusados pelo PSDB de se aproveitar de verbas de propinas negociadas com empreiteir­as e reveladas pela operação Lava Jato na campanha, o que configurar­ia abuso de poder político e econômico. Por 4 votos a 3, no entanto, a ação foi rejeitada, em junho de 2017.

Poucos anos depois, o tribunal demorou ainda mais para julgar as ações apresentad­as contra Bolsonaro sob acusação de que ele se beneficiou de um esquema de disparo em massa de fake news contra seus adversário­s nas eleições de 2018.

O caso foi julgado no final do terceiro ano de mandato do ex-presidente, em outubro de 2021.

Naquela data, a maioria da corte concluiu que foi comprovada a existência de um esquema ilícito de propagação de notícias falsas via WhatsApp para beneficiar Bolsonaro, mas avaliou que não se demonstrou gravidade suficiente para cassar a chapa vencedora do pleito presidenci­al.

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Antonio Augusto- 29.nov.22/Divulgação TSE O ministro Alexandre de Moraes (no centro) preside sessão do Tribunal Superior Eleitoral

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