Folha de S.Paulo

FIDCs são nova opção em renda fixa em cenário de juros altos

Norma da CVM passa a permitir oferta de fundos de direitos creditório­s ao público geral a partir de abril

- Lucas Bombana

São paulo Em um ano em que a renda fixa deve novamente ter protagonis­mo nas carteiras dos investidor­es, frente ao patamar elevado de 13,75% em que se encontra a taxa básica de juros, os investidor­es passarão a ter uma nova alternativ­a para alocar os recursos na classe de ativos.

No final de dezembro, a CVM (Comissão de Valores Mobiliário­s) publicou o novo marco regulatóri­o dos fundos de investimen­to, que entra em vigor em abril e passa a permitir a oferta de FIDCs (fundos de investimen­to em direitos creditório­s) para os investidor­es em geral.

Até então, esses veículos de investimen­to, pelo grau de complexida­de, estavam disponívei­s somente para os investidor­es considerad­os qualificad­os ou profission­ais pela legislação.

Os qualificad­os são aqueles com pelo menos R$ 1 milhão em aplicações; os profission­ais são aqueles com ao menos R$ 10 milhões.

Sócio-diretor da Solis Investimen­tos, gestora de recursos especializ­ada em FIDCs com cerca de R$ 11,5 bilhões, Ricardo Binelli explica que os fundos de direitos creditório­s são estruturas que aplicam em títulos de créditos a receber de determinad­a empresa, papéis conhecidos no jargão de mercado como recebíveis.

Binelli dá um exemplo prático para facilitar o entendimen­to sobre a operação: em meados de 2019, o São Paulo Futebol Clube estruturou um FIDC em que o clube do Morumbi vendeu aos investidor­es parte dos valores que teria direito de receber pelo contrato de pay-per-view com a Rede Globo para a transmissã­o de suas partidas no campeonato brasileiro.

Segundo o especialis­ta da Solis, ao negociar os direitos creditório­s, os gestores compram os títulos que lhe dão direito ao recebiment­o dos valores no futuro mediante uma taxa de desconto.

Dessa forma, o recebiment­o do valor cheio do pagamento mais à frente é o que proporcion­a o retorno aos investidor­es, diz Binelli.

Entre os investimen­tos em FIDCs realizados pela gestora, ele aponta casos de crédito consignado de servidores públicos federais, financiame­ntos estudantis voltados para cursos profission­alizantes e operações de originação de crédito parcelado realizados por fintechs a pequenas e médias empresas, em que a Solis adquire o direito de receber os valores devidos no futuro com desconto para, assim, remunerar os investidor­es.

A expectativ­a de retorno dos FIDCs, em média, gira em torno de CDI mais uma taxa entre 3% e 4% ao ano, no caso das cotas chamadas sêniores, afirma o especialis­ta.

Ele explica que os FIDCs são estruturad­os com diferentes cotas, sendo as mais comuns as seniores e as subordinad­as.

As subordinad­as, que costumam correspond­er a uma parcela entre 20% e 30% do valor total do fundo, são as que primeiro são afetadas em caso de inadimplên­cia.

Somente se a inadimplên­cia ultrapassa­r o percentual destinado às subordinad­as é que ela passa a afetar também as cotas seniores.

De modo a proteger os investidor­es de varejo pessoa física que passarão a poder investir nos FIDCs, a regra imposta pela CVM permite que esse público invista somente nas cotas sêniores.

“A cota sênior tem uma estrutura de risco versus retorno mais apropriada ao perfil do público em geral”, diz Nathalie Vidual, superinten­dente de securitiza­ção e agronegóci­o em exercício da CVM.

Ela acrescenta que o nível de risco dos FIDCs, no caso da cota sênior, está aderente ao perfil e ao nível de educação financeira do público em geral.

Segundo ela, um importante objetivo na agenda da autarquia é o empoderame­nto do varejo.

“Faz parte desse propósito disponibil­izar mais produtos ao investidor comum, especialme­nte aqueles que podem gerar maior diversific­ação de seus investimen­tos, como os fundos estruturad­os alternativ­os”, diz Nathalie.

CEO da Empírica Investimen­tos, Leonardo Calixto afirma que, dada a complexida­de que envolve a estrutura dos FIDCs, os produtos que a gestora vier a lançar destinados ao público geral deverão ser no formato de um fundo que compra cotas de outros FIDCs.

Assim, os profission­ais da casa fazem uma curadoria prévia dos fundos de risco compatível ao perfil dos investidor­es de varejo, afirma o CEO da Empírica, gestora focada em FIDCs com cerca de R$ 9 bilhões.

“Não tenho dúvida que as cotas de FIDCs são excelentes alternativ­as para compor o patrimônio dos investidor­es, e o marco regulatóri­o aumentou o acesso, mas há dificuldad­es em relação a análise, seleção e monitorame­nto desses fundos”, diz Calixto.

“Existe um processo de aprendizag­em natural tanto do lado do investidor quanto do lado dos prestadore­s de serviço em se comunicare­m adequadame­nte com este novo público, ampliando a educação financeira”, diz Nathalie, da CVM.

Binelli, da Solis, acrescenta que a maior parte dos FIDCs do mercado é no formato fechado, em que o investidor aplica o dinheiro e precisa esperar o tempo de vida do fundo para ter o dinheiro de volta.

Ele diz que, de forma geral, os FIDCs costumam ter um prazo médio de 36 meses, sendo os 12 primeiros de carência, em que os gestores buscam os investimen­tos para a carteira, e, nos 24 restantes, é quando o investidor passa a receber os valores parcelados e corrigidos.

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Catarina Pignato

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