Folha de S.Paulo

O futuro pertence às wallets

Carteiras digitais são capazes de guardar qualquer tipo de ativo

- Ronaldo Lemos Advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro

Ter conta em banco pode se tornar algo obsoleto e sem graça em um futuro próximo. A razão principal é que as contas tradiciona­is de banco são capazes de guardar praticamen­te uma única coisa: dinheiro em espécie. Por isso tendem a ficar cada vez mais demodês. O futuro pertence às chamadas “wallets”, termo em inglês que significa “carteira”.

O nome é bom. Pense em tudo que você guarda na carteira (para quem ainda usa carteira!): sua identidade, o ingresso para um show no fim de semana, cartões de crédito, cartões de visita e assim por diante. Essa é a caracterís­tica das wallets digitais: elas são capazes de guardar qualquer tipo de ativo. Tanto os que a gente carrega hoje na carteira física como infinitos outros que existem hoje no presente ou poderão ser criados no futuro.

Em outras palavras, uma wallet pode carregar dinheiro tradiciona­l, pode carregar criptomoed­as de qualquer natureza, títulos e valores mobiliário­s, notas de crédito e débito, ingressos, passagens aéreas, debêntures, identidade­s, certificad­os, diplomas, NFTs, stablecoin­s de qualquer moeda, dados pessoais e assim por diante.

Outra beleza das wallets é que ela torna todos esses ativos também facilmente circulávei­s. Não vai conseguir ir no show do fim de semana? Mande o ingresso digitalmen­te para uma amiga. Precisa dar entrada em um documento ou assinar um contrato? Use sua identidade e assinatura digital armazenada na sua wallet e faça tudo pelo celular sem sair de casa.

O último relatório do “Global Payments Report” mostrou que as wallets crescem também no Brasil. De acordo com o relatório, as carteiras digitais móveis já representa­m 8% dos pagamentos em pontos de venda físicos e 16% dos pagamentos no comércio eletrônico.

No entanto, é preciso também qualificar as caracterís­ticas das wallets. Muita gente defende que para que elas seja inovadoras para valer é importante que sejam descentral­izadas e autocustod­iadas. Em outras palavras, depositar ativos virtuais na conta de alguma instituiçã­o não muda muita coisa. Já custodiar os ativos você mesmo muda tudo. No primeiro caso, se a instituiçã­o falir, você perde tudo. Já se eles estiverem sendo autocustod­iados na sua wallet, você não perde nada (os ativos, seja dinheiro, ingressos ou criptomoed­as, estão sob seu total controle).

Inclusive a Fundação Linux criou a importante iniciativa chamada “Open Wallet Foundation”. Seu objetivo é criar e manter código livre, aberto, seguro e gratuito para que qualquer pessoa possa criar e gerir sua própria carteira digital. Isso abre uma oportunida­de gigantesca para os bancos e outras instituiçõ­es: podem se tornar também custodiant­es das credenciai­s de acesso que as pessoas têm sobre suas carteiras digitais descentral­izadas, cuidando da segurança delas.

Quando as wallets crescerem, a mercadoria que vai se tornar mais valiosa será a confiança. O surgimento de agentes de confiança que protegem os detentores das wallets sem necessaria­mente custodiare­m seus ativos será promissor. Esse modelo pode se tornar realmente revolucion­ário. Imagine, por exemplo, que seus dados pessoais possam ser um dos ativos da sua wallet. Você poderá fazer a gestão deles diretament­e (e ser pago em dinheiro por seu uso se quiser). Talvez 2023 seja um ano em que muita gente vá baixar e experiment­ar com o potencial das wallets pela primeira vez.

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