Folha de S.Paulo

São Paulo intensific­a buscas por crianças com vacina da Covid atrasada

Agentes comunitári­os de saúde monitoram faltosos e vão até a casa de famílias para aplicar doses esquecidas contra o coronavíru­s

- Patrícia Pasquini

“Nós não encontramo­s com frequência casos de recusas [...]. Nossa realidade é mais desatenção, talvez relacionad­a à baixa percepção de risco —os pais não conseguem ver gravidade na doença e acabam deixando para depois Luiz Artur Caldeira coordenado­r da vigilância em Saúde de São Paulo

sÃO PaUlO A cidade de São Paulo intensific­ou a busca ativa para vacinar crianças com doses contra a Covid-19 em atraso. Desde o dia 20 de dezembro, foram feitas mais de 18 mil abordagens em toda a capital.

A ação é voltada principalm­ente para crianças de 6 meses a menores de 3 anos (2 anos, 11 meses e 29 dias) do grupo prioritári­o —com comorbidad­es, deficiênci­a física permanente, imunossupr­imidos e indígenas. A vacinação para esse público nas UBS (Unidades Básicas de Saúde) teve início em 17 de novembro de 2022.

Na busca ativa, a Secretaria Municipal de Saúde também contempla outras faixas etárias infantis, com ou sem comorbidad­es. Além disso, já vacina com doses remanescen­tes as crianças da mesma faixa etária cujos pais deixaram o nome na lista da xepinha.

Segundo Luiz Artur Caldeira, coordenado­r da vigilância em Saúde do município, há outras estratégia­s de busca ativa.

“Verificamo­s se as crianças desta faixa etária que vão à unidade para consulta, retirar medicament­o, tomar outra vacina estão no grupo prioritári­o. Até os irmãos se estiverem juntos. Muitos pais não entendem essas classifica­ções de comorbidad­es. Em alguns casos, os filhos têm doenças crônicas e os pais não sabem.”

A busca ativa de rotina, voltada a qualquer criança que não foi ao posto ser vacinada, é baseada num sistema que aponta os faltosos.

“A criança comparece pela primeira vez na unidade e faz a vacinação. O sistema eletrônico de registro de doses aponta quando ela já deveria ter voltado e não voltou”, explica. “Com a lista, os funcionári­os telefonam e vão à casa delas para saber o porquê não vacinou. O procedimen­to é o mesmo se essa criança ainda não tomou nenhuma dose.”

Manuella, 1 ano e 9 meses, recebeu a segunda dose da Pfizer Baby em casa, no Tremembé, na zona norte. Quem aplicou foi Luciana Nepomuceno, 41, técnica de enfermagem da UBS Dona Mariquinha Sciáscia.

A vacina deveria ter sido tomada no dia 4 de janeiro. Apesar de ter sido informada sobre a data do retorno na unidade, a mãe, Laura Cristina Alves, 35, que é professora de educação infantil da rede pública, achou que a distância entre as doses deveria ser de três meses.

A reportagem acompanhou a busca ativa nos dias 6 e 9 de janeiro, no Tremembé e no Parque Edu Chaves, ambos na zona norte da capital paulista.

Depois de Manuella, em cerca de uma hora e meia, a equipe foi a endereços de outras crianças no Tremembé. Dois deles eram inexistent­es e no terceiro não havia ninguém em casa. Os telefonema­s feitos às famílias também foram em vão.

Theo, 3, deveria ter sido vacinado dia 15 de dezembro. O atraso se deu porque a família ficou alguns dias fora da área de abrangênci­a da unidade de referência —a UBS Parque Edu Chaves—, segundo justificat­iva da dona de casa Juliana Fernandes, 23, mãe do garoto.

Entre as visitas, a enfermeira Leila Cristina, 36, e a técnica de enfermagem Débora de Souza Gilo, 32, pararam na casa de Nicolly, 12. A menina deveria ter tomado a segunda dose da Pfizer em maio do ano passado e não compareceu à unidade porque o posto de saúde é distante de onde mora e não tinha quem a levasse. A avó trabalha muito, segundo ela.

O trabalho também foi justificat­iva da costureira Rozemary Quispe, 37, para não não ter levado o filho, Miguel, 7, para tomar a segunda dose da Pfizer pediátrica em junho.

“Nós não encontramo­s com frequência casos de recusas que precisam ser trabalhado­s, no sentido de convencime­nto ou mesmo tomar providênci­as. Nossa realidade é mais desatenção, talvez relacionad­a à baixa percepção de risco —os pais não conseguem ver gravidade na doença e acabam deixando para depois”, diz Caldeira.

Nas UBS tradiciona­is, o trabalho é feito pela equipe de enfermagem; nas que operam no modelo ESF (Estratégia Saúde da Família), tudo começa pelos agentes comunitári­os de saúde durante as visitas casa a casa.

“Eles verificam a carteirinh­a de vacinação, fazem uma conferênci­a mais padronizad­a: última data de vacinação e a idade. Havendo criança sem carteirinh­a ou a data de vacinação não é condizente com a idade, encaminham para avaliação do auxiliar de enfermagem da equipe de ESF.”

Mônica Levi, presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizaçõe­s) diz que o percentual de internaçõe­s e complicaçõ­es causadas pela Covid é maior em crianças, porque é uma faixa etária que não está adequadame­nte vacinada.

“A Covid não pode ser negligenci­ada. É um sofrimento para a criança ficar intubada, necessitan­do de oxigênio ou com essa SIM-P (síndrome inflamatór­ia multissist­êmica pediátrica), que é grave e mata, fora a Covid longa. Hoje, é muito claro para a pediatria que as crianças são vítimas importante­s da Covid”, afirma Levi.

Até o último dia 10, haviam sido aplicadas 30.501 doses da Pfizer Baby em crianças de 6 meses a 2 anos, 11 meses e 29 dias —23.958 primeiras doses (D1) e 6.543 segundas doses (D2).

Estão incluídas 27.094 crianças que receberam a D1 por meio de doses remanescen­tes (xepinha), além das 5.677 que já tomaram a D2. Do grupo prioritári­o —que possui comorbidad­es, os imunossupr­imidos, indígenas e com deficiênci­a—, 2.541 receberam a D1 e 866 a D2.

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Zanone Fraissat/Folhapress A técnica de enfermagem Débora de Souza Gilo e a enfermeira Leila Cristina na zona norte

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