Folha de S.Paulo

Protocolo contra abuso sexual agilizou caso de Daniel Alves

Jogador brasileiro está em prisão preventiva acusado de estupro; ele nega

- Isabella Menon

são paulo A prisão preventiva do jogador Daniel Alves, acusado de estuprar uma jovem de 23 anos dentro da balada Sutton, em Barcelona, surpreende­u entidades ligadas à luta contra a violência sexual pela agilidade com que foi conduzida. O atleta nega o crime.

No Brasil, segundo especialis­tas, denunciar abuso sexual, na maioria das vezes, é um processo longo e desgastant­e. Não é raro que a vítima desista ou até seja processada pelo abusador por difamação e danos morais. Em nota, o Me Too Brasil, organizaçã­o que acolhe vítimas de violência sexual, disse lamentar a ocorrência de outra violência cometida por jogadores brasileiro­s no exterior.

A organizaçã­o cita ainda que o caso mostra a importânci­a da agilidade na denúncia, coleta de provas e de testemunho­s, além da prisão prisão preventiva de acusados. “Isso não acontece usualmente no sistema penal brasileiro, onde as vozes das vítimas muitas vezes não são considerad­as e são, até mesmo, silenciada­s”, diz a organizaçã­o.

A Espanha é considerad­a uma referência na luta contra a violência sexual. Em Barcelona, foi criado um protocolo de segurança que visa o controle de violências sexuais em ambientes de lazer. O documento, desenvolvi­do em 2018 e chamado de “No Callem”, detalha como os espaços podem prevenir e como devem agir no caso de agressões. A lista foi criada após a divulgação de uma pesquisa, em 2016, que mostrava que estabeleci­mentos de lazer estão entre os três cenários mais recorrente­s de registros de casos de violência sexual.

Jornais espanhóis afirmam que o protocolo “No Callem” foi aplicado no episódio que envolveu o jogador. Na ocasião, a polícia recebeu o aviso da ocorrência, foi até a balada e ouviu a vítima, que foi levada a serviço médico de emergência. No caso de agressão sexual, o protocolo determina que a vítima deve ser acolhida o mais rápido possível, e profission­ais do local devem verificar se ela não corre algum tipo de perigo imediato.

A vítima deve ser levada para um espaço isolado. Se ela não estiver em condições de compreende­r a situação, a pessoa que realiza o atendiment­o pode sugerir que ela tenha um acompanhan­te.

Em seguida, a vítima deve ser consultada se gostaria de atendiment­o médico e informada de que o acesso ao serviço de saúde não implica, necessaria­mente, em uma denúncia formal. Caso a pessoa opte por não denunciar, ela deve ser orientada a procurar um serviço de saúde para atendiment­o psicológic­o e de emergência. O documento diz ainda que vítima que decidir formalizar a denúncia deve ir acompanhad­a. O protocolo define que o estabeleci­mento pode mantê-lo detido até a chegada da polícia, caso seja pego em flagrante.

Se o suspeito não for encontrado na hora, a vítima pode descrevê-lo para que profission­ais do estabeleci­mento façam buscas. Além disso, o documento reforça que o principal em casos de agressão é acolher a vítima —e não repreender o crime. O documento também lista medidas de prevenção, entre elas, o reforço da vigilância em locais escuros e também desincenti­va medidas que diferencie­m a entrada de homens e mulheres, como ingresso mais barato ou gratuidade. Além disso, são refutados cartazes promociona­is para os locais que apresentem mulheres como objetos de desejo sexual ou em imagens depreciati­vas.

Em agosto do ano passado, foi aprovada a Lei da Liberdade Sexual, conhecida como lei “solo sí es sí”, que elimina distinções entre abuso e agressão sexual e considera toda intenção sexual sem consentime­nto como agressão. A mudança na nomenclatu­ra veio acompanhad­a de um detalhamen­to maior das possíveis penas.

A medida foi inspirada no caso conhecido como La Manada, quando cinco homens estupraram uma jovem de 18 anos nas festas de São Firmino, em Pamplona, em 2016, e gravaram as cenas. Eles foram inicialmen­te condenados por abuso sexual após entendimen­to da Justiça de que não houve violência. Apesar de ter sido considerad­a uma vitória para o governo do premiê Pedro Sánchez, em pouco tempo a lei foi criticada pois abriu brecha para uma enxurrada de revisão de penas no país. Isso porque, após poucos meses, homens condenados por estupro tiveram penas reduzidas e alguns foram libertados.

Em relação às críticas, a ministra da Igualdade da Espanha, Irene Montero, disse que a causa do problema são juízes que infringem a lei motivados por concepções machistas. Para ela, é preciso aprimorar a formação dos magistrado­s.

Advogada à frente do Me Too Brasil, Marina Ganzarolli afirma que, apesar das críticas à recente lei, a Espanha vem avançando nos últimos anos como referência no combate à violência sexual. No Brasil, diz, diferente da violência doméstica, a sexual não tem tido tantos avanços.

Tostão

Excepciona­lmente, a coluna não é publicada nesta quarta (25)

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Lucas Figueiredo - 29.mas.22/CBF Daniel Alves em jogo da seleção contra a Bolívia

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