Folha de S.Paulo

Jornalista americana encontra ‘lista de sonhos’ e cumpre desejos do pai, que morreu há 20 anos

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São paulo Em 27 de dezembro do ano passado, a jornalista americana Laura Carney, 44, marcou o último dos 54 itens de uma lista de tarefas para fazer antes de morrer. Sua saúde, porém, estava ótima; a compilação não tinha sido feita originalme­nte por ela, mas pelo seu pai, que morreu em 2003.

“Ela queria encontrar uma maneira de entender um pouco mais o pai”, disse o marido de Carney, Steven Seighman, ao jornal The Washington Post. “Assim que vimos a lista, imediatame­nte pensamos: é isso.” Era 2016 quando o irmão dela achou o papel, perdido embaixo de uma bolsa de camurça com a carteira de motorista do pai.

A lista, escrita em 1978, ano em que Carney nasceu, incluía atividades já concluídas, como “fazer um monólogo de comédia em um bar” e “ver um jogo da World Series [campeonato americano de beisebol] ao vivo”. Uma delas —“devolver US$ 1.000 ao meu pai, com juros”, cerca de R$ 5.100— estava marcada como fracassada.

E outras restavam por fazer: dirigir um Corvette, plantar uma melancia e trocar correspond­ências com o papa. Ao todo, eram 54 das 60 tarefas originais. Carney contou ao jornal americano que completar a lista era algo de que precisava para entrar em contato consigo mesma. “Eu ainda carregava o luto e o trauma, mas não fazia ideia disso”, disse ela, que cumpriu as tarefas com o marido, o irmão e, por vezes, sozinha.

Seu pai, Michael, tinha 54 anos quando foi atropelado por um motorista de 17 que falava ao telefone enquanto dirigia e ultrapasso­u o farol vermelho em Limerick, na Pensilvâni­a. Por muito tempo, ela não falou sobre o assunto.

“Parecia um jeito tão indigno de morrer”, disse ela, que tinha 25 anos à época.

Anos depois, a jornalista se tornou uma ativista pela segurança no trânsito, escrevendo artigos, dando palestras e entrevista­s. A lista surgiu como uma oportunida­de para superar a dor e se reconectar com Michael. “Me ajudou a vê-lo como um ser humano completo, não só como meu pai.”

Até encontrar a lista, segundo o relato que fez ao Washington Post, ela se achava mais parecida com a mãe, mas, à medida que completava as tarefas, descobriu muitas semelhança­s com o pai. “Ele era um sonhador. Sabia o que significav­a estar vivo, sabia como se divertir.”

Para falar com o presidente, um dos objetivos relacionad­os no papel, Carney foi até a Geórgia se encontrar com Jimmy Carter, que estava à frente da Casa Branca quando Michael compilou seus objetivos —ela descobriu que o hoje ex-líder americano dava aulas em uma escola dominical ali.

Também houve viagens para Nova Orleans, San Diego, Las Vegas, Chicago, Paris, Londres e Viena. Alguns itens da lista foram cumpridos sem esforço: correr 10 milhas (16 km), por exemplo, foi fácil, uma vez que ela já tinha pago a inscrição para uma maratona.

Mas sonhos que não puderam ser realizados foram adaptados. Um deles era “cantar no casamento da minha filha”; para substituir a tarefa, a jornalista abriu um vinho comprado em 1978 que tinha o bilhete “abrir no dia do casamento de Laura”. Uma garrafa da mesma marca foi comprada e reservada para a sobrinha, de forma a cumprir o sonho “dançar no casamento das minhas netas”.)

Carney depois escreveu a própria lista e encoraja outras pessoas a fazer o mesmo. “Isso ajuda a começar a viver com mais intenções. Quando você tem intenções, sente mais propósito na vida.”

No final do ano passado, ela completou a última tarefa de seu pai: gravar cinco músicas —o prazo para concluir a lista, 2020, precisou ser adiado devido à pandemia. Ela escolheu as favoritas de Michael, como “The Rainbow Connection”, de Jim Henson, e “Good Night”, dos Beatles.

Em breve, o livro em que conta a jornada completand­o a lista será lançado nos EUA. A publicação recebeu o nome de “My Father’s List: How Living my Dad’s Dreams Set me Free” (a lista do meu pai: como viver os sonhos do meu pai me libertou, em tradução livre).

“Essa é uma história sobre segredos —e a liberdade que sentimos quando aprendemos a confiar novamente: na vida, no amor e nas lições de um pai sobre como viver plenamente”, afirma.

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@myfathersl­ist A jornalista Laura Carney, 44, durante viagem que fez a Londres para cumprir uma das tarefas da lista

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