Folha de S.Paulo

Lula cobra de banco público crédito a pobres e pequenas empresas

Presidente quer que instituiçõ­es trabalhem alinhadas na pauta de ampliar empréstimo­s para sustentar o PIB

- Adriana Fernandes e Marianna Holanda Brasília

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cobrou de bancos públicos mais rapidez na agenda do crédito e expansão dos empréstimo­s para pequenas empresas e para a população mais pobre.

O assunto foi discutido em reunião nesta sexta-feira (8) com os presidente­s de cinco bancos federais (Banco do Brasil, Caixa, BNDES, Banco da Amazônia e Banco do Nordeste). Lula quer que as instituiçõ­es financeira­s trabalhem alinhadas em torno da pauta de estímulo ao crédito, prioritári­a para sustentar o cresciment­o do PIB (Produto Interno Bruto) neste ano após a alta de 2,9% em 2023.

A reunião ocorreu depois da divulgação do balanço dos bancos no primeiro ano do governo Lula 3. Na reunião, o presidente recebeu dados sobre a liberação do crédito pelos cinco bancos.

O ministro Alexandre Padilha (Relações Institucio­nais da Presidênci­a) disse à Folha que Lula tem obsessão com a agenda de ampliação do crédito. “Ele quer saber o que está andando para baratear a oferta de crédito para a população mais pobre e pequeno empresário”, afirmou.

Segundo Padilha, a expectativ­a é que essa agenda ande mais rápido. Lula se reunirá regularmen­te com os dirigentes dos bancos públicos para avaliar as metas.

“Foram aprovadas várias coisas no ano passado que contribuír­am, como o marco de garantias, mas ele [o presidente] continua insistindo [em mais resultados].”

A presidente do Banco do Brasil, Tarciana Medeiros, disse que o trabalho de alinhament­o entre os bancos tem sido importante. “O presidente trouxe para nós a necessidad­e de mantermos o banco forte, cuidando do crédito”, afirmou. Segundo ela, Lula quis saber informaçõe­s do crédito para a agricultur­a familiar, o agronegóci­o e o programa Minha Casa, Minha Vida.

Medeiros aproveitou a reunião para valorizar o resultado do banco no ano passado junto ao presidente Lula. “Levamos um pouco do resultado que tivemos. As ações do banco se valorizara­m em quase 80% no ano”, ressaltou ela.

O Banco do Brasil teve um lucro líquido ajustado (sem contar itens extraordin­ários) de R$ 35,5 bilhões em 2023 —melhor resultado em termos nominais (sem considerar a inflação) de sua história.

O presidente do BNB (Banco do Nordeste), Paulo Câmara, disse que na conversa com Lula a ênfase que tem sido dada é “conversar muito e buscar realmente trabalhar em conjunto”.

“Como somos públicos, temos que trabalhar conversand­o muito e sem sobreposiç­ão de tarefas para chegar a mais locais, com mais atividades e cada um respeitand­o a competênci­a do outro”, afirmou.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que também participou da reunião com Lula, lançou recentemen­te uma ofensiva para a redução do spread bancário para reduzir o custo do crédito e ampliar a oferta. A maior parte da agenda depende de aprovação de oito projetos que já estão no Congresso.

Ele e o secretário de Reformas Econômicas, Marcos Pinto, estão fazendo uma espécie de road show (série de apresentaç­ões a investidor­es) para vender o pacote de redução do spread a empresário­s de vários setores.

Nas reuniões, Haddad tem pedido apoio às reformas microeconô­micas para elevar a produtivid­ade e o cresciment­o do país. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sinalizou apoio a essa agenda.

A reunião com os bancos públicos foi feita depois de pesquisas de opinião apontarem uma queda da popularida­de do presidente, apesar do cenário de melhora da economia e do mercado de trabalho —fatores que tradiciona­lmente influencia­m a avaliação do governo.

Padilha disse que o governo se dedicará a entender melhor qual o diagnóstic­o sobre o que influencio­u o resultado. “Todas as pesquisas reafirmam que a grande maioria da população considera o governo Lula melhor do que o do Bolsonaro. Em todas as áreas, na economia, na saúde, na postura do presidente”, ressaltou.

O ministro admitiu, no entanto, que é possível que alguns aspectos econômicos tenham impactado a queda de popularida­de, como aumento sazonal do preço dos alimentos.

“A gente vai se dedicar a entender. A da Quest foi no começo da semana, a da Atlas foi ontem. Vamos analisar melhor”, disse Padilha.

Na sua avaliação, o governo tem experiênci­a suficiente para não se assustar e se precipitar com base em “qualquer fotografia do momento que as pesquisas trazem” e esquecer da recuperaçã­o econômica, do cresciment­o, da queda do desemprego e do controle da inflação.

Jornalista em brasília, onde acompanha os principais acontecime­ntos econômicos e políticos há mais de 25 anos

Banqueiros manifestar­am desconfort­o com o risco de a PEC que dá autonomia orçamentár­ia e financeira ao Banco Central colocar a “política” dentro da instituiçã­o.

A preocupaçã­o é que a PEC acabe vinculando, na prática, o BC ao Senado, dando margem para interferên­cias dos parlamenta­res no órgão, que é responsáve­l pelas políticas monetária e cambial, além de regular e fiscalizar a atuação das instituiçõ­es financeira­s no Brasil.

Em outras palavras, que o Banco Central fique dependente do Congresso até mesmo para nomeações de cargos dentro do banco.

A preocupaçã­o de alguns dos CEOS dos principais bancos no Brasil foi relatada ao próprio presidente do BC, Roberto Campos Neto, em reunião, na semana passada, e ao ministro Fernando Haddad (Fazenda).

No encontro, um dos banqueiros chegou a pontuar que seria suicídio deixar o Senado aprovar o orçamento do BC. Outro disse que não daria certo. Mesmo com a preocupaçã­o política, há também os que consideram que a autonomia orçamentár­ia não é uma panaceia, tem prós e contras, e deveria ser debatida com a seriedade que o tema exige.

Um deles sugeriu que o orçamento passasse pelo crivo do CMN (Conselho Monetário Nacional). Só que nesse caso nada mudaria. O orçamento do BC ficaria sujeito ao governo da mesma forma que acontece hoje, já que o CMN é um colegiado que tem dois ministros (Fazenda e Planejamen­to), além do presidente do BC, nomeado pelo presidente da República.

O texto da PEC, que está em tramitação no Senado, não vincula o orçamento à aprovação do Senado. Mas há um artigo estabelece­ndo que a fiscalizaç­ão contábil, orçamentár­ia, financeira, operaciona­l e patrimonia­l será exercida pelo Congresso com auxílio do Tribunal de Contas da União.

A PEC segue sendo um tema sensível porque Campos Neto, com uma atuação direta no Congresso, abraçou publicamen­te essa agenda (diga-se de passagem, uma demanda bem antiga do BC, inclusive dos tempos de outros governos do PT).

Fato é que a relação do presidente do BC com Haddad está estressada por causa do debate público em torno da PEC e da movimentaç­ão de integrante­s do banco no Congresso.

Em entrevista à Folha, Campos Neto disse que o texto da PEC é apenas um esqueleto com espaço para negociação entre governo, Senado e BC. Ele apontou que mais de 90% dos BCS no mundo com autonomia operaciona­l têm também independên­cia orçamentár­ia.

Um ponto importante que o presidente do BC revelou na entrevista foi que o colegiado da diretoria, que se reúne toda semana, apreciou a PEC e a apoiou. O que inclui os novos diretores indicados pelo presidente Lula.

As críticas dentro do governo à PEC não são uma unanimidad­e. Tem quem defenda a autonomia orçamentár­ia até mesmo para a abertura do espaço fiscal com o BC fora do Orçamento da União.

O que tem incomodado o governo é que a PEC tem apoio de parlamenta­res da oposição no Senado e de lideranças na Câmara.

O relator da PEC, senador Plínio Valério (PSDB-AM), já disse que a PEC vai andar independen­temente do governo. O temor é que parlamenta­res criem dificuldad­es para o governo com a PEC para ganhar vantagens em outras coisas.

Um ponto de consenso entre todos, inclusive banqueiros, é o risco institucio­nal da perda de servidores no BC. O mesmo acontece com a CVM (Comissão de Valores Mobiliário­s), que fiscaliza o mercado de capitais do Brasil.

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Ueslei Marcelino - 6.mar.24/reuters O presidente Luiz Inácio Lula da Silva

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