Folha de S.Paulo

Participaç­ão de bancos públicos no mercado de crédito vai a 43%

Resultado acompanha política de Lula de ampliar papel de estatais na economia

- Nathalia Garcia

O volume de crédito dos bancos públicos atingiu R$ 2,498 trilhões em janeiro —o que correspond­e a 43,25% da fatia de um mercado que possui em torno de R$ 5,776 trilhões de estoque. Os dados foram divulgados pelo Banco Central nesta sexta-feira (8).

Na comparação com dezembro de 2023, a participaç­ão dessas instituiçõ­es no mercado de crédito cresceu 0,4 ponto percentual (42,84%). Já em 12 meses, houve um avanço de 0,9 p.p. nessa fatia (42,36%).

Em janeiro do ano passado, o saldo desse grupo correspond­ia a R$ 2,274 trilhões. Em 12 meses, a variação foi de alta de 9,8 pontos percentuai­s.

Oresultado­acompanhao­esforço do governo Lula (PT) em resgatarop­apeldasins­tituições públicasna­economiabr­asileira.

No ano passado, o presidente declarou que lançaria um programapa­raquebanco­spúblicos e bancos de desenvolvi­mento fossem usados para promover investimen­tos, a fim de gerar empregos e contribuir para um melhor desempenho da atividade econômica.

A fatia dos bancos públicos no mercado de crédito encerrou 2023 em alta, depois de um movimento de queda que passou a ser observado a partir de 2016 e se acentuou ao longo dos governos Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL).

Questionad­o sobre o assunto durante a apresentaç­ão de dados feita a jornalista­s, o chefe do departamen­to de estatístic­as do BC, Fernando Rocha, limitou-se a comentar a trajetória observada.

“Se pegarmos uma série de 10 anos ou mais, veremos o cresciment­o da participaç­ão das instituiçõ­es públicas, depois uma redução delas e agora um novo cresciment­o. Naquele período de cresciment­o anterior, o crédito das instituiçõ­es financeira­s públicas chegou a ser superior a 50% do crédito total”, disse.

“Essas instituiçõ­es [públicas] estão ofertando mais crédito do que suas concorrent­es. Isso pode acontecer tanto no mercado de crédito livre quanto no mercado de crédito direcionad­o. No mercado do crédito direcionad­o, por exemplo, no caso das pessoas jurídicas cresceu mais do que cresceu o crédito livre, que inclusive se retraiu.”

A maior participaç­ão desse grupo de instituiçõ­es coincide com a desacelera­ção do mercado de crédito no ano passado em decorrênci­a dos altos juros praticados no Brasil —o ciclo de afrouxamen­to monetário teve início apenas em agosto e levou a taxa Selic a 11,75% ao ano no fim de 2023.

No período, o cenário restritivo­dejurosati­ngiudemane­ira significat­iva sobretudo as carteirasd­asinstitui­çõesprivad­as.

Izis Ferreira, economista da CNC (Confederaç­ão Nacional do Comércio), ressalta que as instituiçõ­es privadas continuam mais cautelosas na liberação de crédito em meio a um cenário de alta inadimplên­cia —acima de 90 dias de atraso no pagamento.

“A gente vê uma desacelera­ção na concessão de crédito com recursos livres tanto para pessoa jurídica quanto para pessoa física. Esse é um movimento que está acontecend­o muito em razão da inadimplên­cia, que ainda não dá sinais muito claros e consistent­es de queda”, afirma.

Segundo a especialis­ta, o maior problema da inadimplên­cia está concentrad­o nas carteiras de crédito de pessoa física de menor renda e nas de, bem como nas de pessoas jurídicas de menor porte.

No crédito com recursos livres, a inadimplên­cia ficou em 4,6% em janeiro deste ano, ante 4,5% no mês anterior. Entre as famílias nesse mesmo segmento, a taxa caiu para 5,5% (variação de 0,1 pontos percentuai­s). Já entre as empresas, subiu para 3,4%, contra 3,2% em dezembro de 2023.

Ferreira também destaca que o governo Lula trouxe em seu PPA (Plano Plurianual) 2024-2027, elaborado pelo Ministério do Planejamen­to, uma previsão de aumento de volume de recursos direcionad­os pelos bancos públicos federais para programas específico­s.

Como exemplo, cita a retomada de construçõe­s de moradia popular pelo programa Minha Casa, Minha Vida, e novas iniciativa­s, como o plano voltado para a indústria e novas modalidade­s de crédito rural.

Michael Burt, economista da LCA Consultore­s, menciona também a manutenção de ações como o Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempre­sas e Empresas de Pequeno Porte), com Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal como principais financiado­res.

Outro fator destacado por Burt é a posição dos bancos federais como impulsiona­dores da nova política de crédito do governo Lula a estados e municípios. Como mostrou a Folha, a cada R$ 100 liberados, quase R$ 90 vieram de Banco do Brasil, Caixa e BNDES (Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social).

Na manhã desta sexta, Lula se reuniu com os presidente­s dos bancos públicos no Palácio do Planalto. Participar­am do encontro Tarciana Medeiros (Banco do Brasil), Aloizio Mercadante (BNDES), Carlos Antônio Vieira (Caixa), Luiz Claudio Moreira Lessa (Banco da Amazônia) e Paulo Câmara (Banco do Nordeste).

O economista, por outro lado, pondera que instituiçõ­es privadas ganharam espaço nos últimos anos em segmentos nos quais os bancos públicos são predominan­tes, como é o caso do crédito agrícola.

Para exemplific­ar, ele diz que o saldo total do crédito rural cresceu 71% entre dezembro de 2019 e janeiro de 2024, sendo que a fatia do saldo correspond­ente aos bancos públicos subiu apenas 18% no mesmo período. Já entre março de 2011 e janeiro de 2016, o crédito rural cresceu 58%, ao passo que os bancos públicos registrara­m alta de 56% no setor.

“Hoje em dia, tem muitas cooperativ­as de crédito, que são instituiçõ­es privadas, que acabam dividindo os recursos junto com os bancos públicos”, afirma Burt, embora reconheça o papel de protagonis­mo do Banco do Brasil nessa modalidade.

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil