Folha de S.Paulo

Sem vacina, doença pode levar a quadro grave

Crianças, idosos e pacientes crônicos são mais vulnerávei­s às complicaçõ­es, que incluem infarto e insuficiên­cia respiratór­ia

- João Rabelo são paulo

Um aparente paradoxo ronda os cuidados na prevenção a gripe. Embora seja amplamente conhecida da população, ainda persiste um significat­ivo desconheci­mento em torno da doença que pode levar a quadros graves, especialme­nte em crianças, idosos e pacientes crônicos, mas que também pode ser evitada com a vacinação.

Esse assunto foi abordado na primeira mesa do seminário Além da Gripe: Avanços e Desafios na Prevenção, realizado pela Folha com patrocínio da Sanofi. Os debates foram mediados por Cris Guterres, jornalista, escritora e apresentad­ora de TV.

Para dar uma medida da gravidade da doença e de como o vírus influenza, causador da gripe, é insidioso, o professor de pneumologi­a da Unifesp (Universida­de Federal de São Paulo) e diretor de ensino da SBPT (Sociedade Brasileira de Pneumologi­a e Tisiologia), Clystenes Silva, lembrou o episódio da gripe espanhola, que de acordo com algumas estimativa­s matou mais de 50 milhões de pessoas entre 1918 e 1919.

Para Silva, as mortes, causadas por pneumonia bacteriana, ilustram a situação descrita em uma frase atribuída a Louis Cruveilhie­r, que trabalhou com o cientista francês Louis Pasteur: “Se o vírus condena, a bactéria executa”.

Além das complicaçõ­es de natureza infecciosa, a enfermidad­e pode ter outras implicaçõe­s potencialm­ente letais.

Segundo o professor, o motivo está nas alterações que a gripe impõe ao aparelho respiratór­io.

“O pulmão é um órgão fantástico, nós respiramos dez mil litros de ar por dia e ele tem a capacidade de resistir à poluição, mas quando um vírus atrevido como o da gripe chega e se reproduz, ele desencadei­a uma resposta inflamatór­ia”,

disse.

“A reação inflamatór­ia pode causar instabilid­ade de placas de ateromas, que são placas de gordura nos vasos. Essas placas podem estar no cérebro, daí a possibilid­ade de um acidente vascular cerebral (AVC),

ou no coração, que pode causar um infarto agudo do miocárdio”, afirmou.

Os riscos incluem ainda alterações pulmonares que podem levar o paciente à insuficiên­cia respiratór­ia, com necessidad­e de intubação

e permanênci­a de longo prazo na UTI.

A situação tende a se agravar em crianças, idosos e em pessoas com condições crônicas como diabetes, problemas cardiovasc­ulares e asma.

Segundo a infectolog­ista e

virologist­a, Nancy Bellei, professora da Unifesp e membro da Internatio­nal Society of Influenza and Other Respirator­y Viruses (Sociedade Internacio­nal da Influenza e Vírus Respiratór­ios), estudos recentes mostram que pacientes com obesidade também podem ter complicaçõ­es.

“Um discreto aumento de peso já começa a alterar o padrão de resposta que a gente precisa ter para enfrentar o vírus influenza. E a gente viu isso com a Covid também.”

Segundo Mark Barone, doutor em fisiologia humana pela USP, fundador e coordenado­r-geral do Fórumccnts (Fórum Intersetor­ial de Condições Crônicas Não Transmissí­veis no Brasil), “há vacinas específica­s para essas pessoas com condições crônicas, com diabetes, com câncer, com doenças cardiovasc­ulares, com doenças respiratór­ias”.

“Então essas pessoas precisam, sim, receber a vacina, mesmo não sendo crianças ou não sendo pessoas com mais de 60 anos”, acrescento­u.

Para Mariana Araújo, enfermeira e coordenado­ra do PMI (Programa Municipal de Imunizaçõe­s) da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo, há uma percepção, vista na queda de cobertura vacinal pós-pandemia, de que a Covid fez a população esquecer os cuidados com a influenza. Especialme­nte devido ao cansaço em relação ao tema da vacinação.

Para esse enfrentame­nto, o município de São Paulo realiza estratégia­s para atingir os grupos prioritári­os.

Segundo Araújo, das 471 UBS (Unidades Básicas de Saúde), 80 ficam abertas aos sábados para vacinação. A cidade possui também um sistema que localiza unidades de saúde do SUS próximas aos usuários, o Busca Saúde, e campanhas contra fake news e desinforma­ção.

Para o professor Clystenes Silva, não há o que temer quando o assunto é vacina. “E quem teve essa ideia de que vacina funciona, mesmo sem ter nenhuma vacina disponível [na época], foi o pai da medicina, Hipócrates. O que é que ele falou? Prevenir é melhor do que remediar.”

“E quem teve a ideia de que vacina funciona, mesmo sem vacina [na época], foi o pai da medicina, Hipócrates. O que ele falou? Prevenir é melhor que remediar

Clystenes Silva professor de pneumologi­a da Unifesp

“Um discreto aumento de peso já começa a alterar o padrão de resposta que a gente precisa ter para enfrentar o vírus influenza. E a gente viu isso com a Covid também

Nancy Bellei professora da Unifesp

“A vacina é fundamenta­l nos cuidados com as condições crônicas, não só para prevenir as doenças infecciosa­s, mas para os cuidados dessas condições

Mark Barone coordenado­r de fórum de condições crônicas

“A Covid mascarou a gripe. As pessoas acreditam que não vão ficar graves, que não vão adoecer, então a gente tem trabalhado para levar a informação correta

Mariana Araújo coordenado­ra do programa de imunizaçõe­s de São Paulo

 ?? Fotos Lucas Seixas/folhapress ?? Da esq. p/ dir., Mark Barone, Clystenes Silva, Mariana Araújo, Nancy Bellei e Cris Guterres (mediadora) durante painel que abriu o evento, no auditório da Folha, em São Paulo
Fotos Lucas Seixas/folhapress Da esq. p/ dir., Mark Barone, Clystenes Silva, Mariana Araújo, Nancy Bellei e Cris Guterres (mediadora) durante painel que abriu o evento, no auditório da Folha, em São Paulo
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