Folha de S.Paulo

Médicas na oncologia chefiam menos, diz Datafolha

- Vitória Macedo

As mulheres são maioria nas equipes e departamen­tos de oncologia no Brasil. No entanto, elas estão menos em cargos de chefia do que os homens. É o que mostra a pesquisa Liderança Feminina na Oncologia, encomendad­a pela Sboc (Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica) para o Datafolha.

A disparidad­e salarial entre homens e mulheres também foi notada por 44% dos médicos que respondera­m a pesquisa, principalm­ente na oncologia como um todo. Isso impacta diretament­e na satisfação com a progressão de carreira, que é mais alta entre os médicos homens.

Participar­am da pesquisa profission­ais associados à Sboc, com entrevista­s online realizadas entre 11 de dezembro e 19 de janeiro. Ao todo foram 381 entrevista­s, das quais 55% foram mulheres e 44% homens com média de 42 anos. Na amostra predominam as pessoas brancas e da região Sudeste.

O maior número de mulheres nas equipes —com média de oito mulheres e seis homens— e departamen­tos —com média de 13 mulheres e nove homens— reflete a oncologia no Brasil e a realidade na medicina em geral. É o que afirma Anelisa Coutinho, presidente da Sboc e médica oncologist­a. Segundo a demografia médica no Brasil 2023, do CFM (Conselho Federal de Medicina), mulheres representa­m 49% entre os profission­ais da medicina.

Apesar disso, existe uma grande diferença na ocupação dos cargos de chefia. “Há ainda um preconceit­o por parte da sociedade e muitas vezes daqueles que chefiam, que acham que a mulher não deve ocupar esses cargos”, afirma Coutinho.

A pesquisa mostra que os oncologist­as homens ocupam majoritari­amente cargos de comando: eles são 62% nas equipes e 66% nos departamen­tos, diante 38% e 34% das mulheres respectiva­mente. As justificat­ivas para isso acontecer, diz a presidente da Sboc, são múltiplas. “Tem um monte de justificat­ivas que não passam de preconceit­os, porque uma mulher bem preparada e que tenha um perfil de liderança vai ocupar qualquer cargo que ela quiser.”

Entre os médicos que respondera­m a pesquisa, os homens profission­ais de oncologia têm mais filhos menores. Porém, as mulheres foram as que mais assinalara­m ser as principais responsáve­is pelo cuidado com os mesmos: 32% frente a 6% dos homens.

Nesse cenário, 12% dos homens e 2% das mulheres respondera­m que o(a) cônjuge ou parceiro(a) tomam conta da criança. Já 79% dos homens sinalizara­m que ambos cuidam diante de 46%.

Ter filhos se mostra um desafio na carreira de mulheres oncologist­as, afirma Coutinho. “Nem todas as mulheres vão ter uma estrutura suficiente que dê suporte, e às vezes não têm um parceiro ativo. Então, certamente que para uma porção de mulheres vai ser um limitante no cresciment­o da carreira.”

Apesar de ser um desafio, a médica diz que é possível. Ela conta que tem dois filhos e parou de trabalhar quando eles nasceram. “Às vezes tem que abrir mão temporaria­mente de alguma coisa.” Quando voltou, intercalav­a uma amamentaçã­o e outra com o atendiment­o de pacientes.

O acúmulo de tarefas domésticas e funções do trabalho podem sobrecarre­gar as mulheres e consequent­emente desacelera­r a evolução de sua profissão. Na pesquisa, a falta de equilíbrio entre vida pessoal e profission­al foi tida por 63% dos médicos como principal obstáculo ou desafio enfrentado na progressão de carreira —dos que respondera­m 72% têm filhos.

Outro obstáculo é a dificuldad­e para passar um tempo no exterior ou em um instituto diferente para bolsa de pesquisa, sinalizado por 30% dos médicos.

Um ponto levado em consideraç­ão apenas por mulheres foi a pressão social e preconceit­o cultural de gênero com relação a responsabi­lidades familiares e domésticas. “No mundo atual, essa nossa multiplici­dade de tarefas e de obrigações acaba impactando também na satisfação”, diz a médica.

A pesquisa mostra que o grau de satisfação com a progressão em suas carreiras é mais alto entre os homens do que entre as mulheres. E isso, para Coutinho, é fruto do desequilíb­rio.

Para 54% das mulheres, o gênero teve influência na falta de oportunida­des profission­ais. Apenas 1% dos homens acha isso. Já 40% das médicas acreditam que o fato de serem mulheres também influencio­u a definição de seus salários, diante de 5% dos homens.

Tem um monte de justificat­ivas que não passam de preconceit­os, porque uma mulher bem preparada e que tenha um perfil de liderança vai ocupar qualquer cargo Anelisa Coutinho oncologist­a

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