Folha de S.Paulo

Proporção da população que vive próxima do litoral diminui

- Lucas Lacerda São Paulo

Mais da metade da população brasileira —203,1 milhões de pessoas, segundo o Censo Demográfic­o 2022— está espremida numa faixa de 150 km a partir do litoral. Já nas fronteiras do Brasil, o número, embora tenha crescido, representa uma parcela de 4,6% dos habitantes.

É o que mostram os dados de setores censitário­s publicados nesta quinta-feira (21) pelo IBGE. Essas unidades territoria­is agrupam domicílios em um local, urbano ou rural, que será mapeado pelos recenseado­res.

Foi dessa forma que o IBGE calculou as quantidade­s da população morando a até 150 km do litoral ou da fronteira, sobrando, assim, o contingent­e populacion­al do interior.

Comparados aos resultados do Censo 2010, os números continuara­m praticamen­te os mesmos, com uma queda de 1% no litoral, apesar do aumento de 5 milhões de habitantes verificado em 2022, que chegou a 111.277.361 pessoas.

Já a porção fronteiriç­a, com 9.416.714 habitantes, continua com 4,6% da população, e todo o contingent­e entre as duas faixas, no interior, soma 83.157.078 pessoas (41%).

Mas o cresciment­o da população, maior no Centro-oeste do país do que a média nacional, significa que a população pode estar se interioriz­ando. Esse movimento não vai superar o contingent­e do Sudeste, mas pode até passar o Sul em algumas décadas.

É o que diz o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, pesquisado­r aposentado do IBGE. Para ele, a causa é a atração econômica do agronegóci­o e o peso do setor primário nas exportaçõe­s do país. “Esse peso está no Centro-oeste. Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Esse movimento é acompanhad­o pelo cresciment­o da população, que vai para onde há emprego e renda.”

Desde a colonizaçã­o, o Brasil passou por diferentes momentos de ocupação do interior do território, que começou espalhada pelo litoral. “Dizia-se que os portuguese­s se limitavam a arranhar a costa do Brasil como caranguejo­s”, afirma Eustáquio.

Entre as corridas por borracha, as marchas para o oeste do país e a construção de Brasília, os diferentes governos do país foram ao interior sob o pretexto de ocupar para proteger e integrar o país. Ainda, a ditadura militar pretendeu conquistar a Amazônia patrocinan­do a construção de estradas como a Transamazô­nica (BR-230) e a BR163 (Cuiabá-santarém).

Com a perda do peso da indústria no PIB (Produto Interno Bruto) do país, segundo Eustáquio, o país consolidou o movimento de reprimariz­ação da economia. “O setor que mais cresce, exporta e gera divisas nãoéaindús­t ria, concentrad­a em São Paulo.”

Segundo o professor do Instituto de Geografia da Uerj (Universida­de do Estado do Rio de Janeiro) Vitor de Pieri, as mudanças na economia também explicam mudanças nos fluxos de migração nas grandes capitais. “Há um movimento de pessoas saindo de cidades como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, migrando para o centro do país.”

Junto com emprego, Pieri também aponta uma busca por mais qualidade de vida em regiões de interior. “Mais contato com natureza e até para trabalhar com produção primária, o que chamamos de neo-rurais.”

Ele aponta que a indústria também começou ase interioriz­ar no país a partir dos anos 1960 e 1970. “É uma deseconomi­a de aglomeraçã­o, conceito do Milton Santos. Por causa de fatores como trânsito, alto valor do metro quadrado, inseguranç­a e os incentivos fiscais no interior,as indústrias migraram .”

Para Eustáquio, embora não seja possível que o Centro-oeste supere o Sudeste em termos absolutos de população, a região pode superar o Sul, e deve continuar acres cerno país nas próximas décadas, tornando o Brasil mais interioriz­ado e urbanizado.

Esse peso [do setor primário nas exportaçõe­s do país] está no Centro-oeste. Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Esse movimento é acompanhad­o pelo cresciment­o da população, que vai para onde há emprego e renda José Eustáquio diniz Alves demógrafo e pesquisado­r aposentado do IBGE

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil