Folha de S.Paulo

Milei deve mudar aposentado­rias por decreto, dizem jornais

- Júlia Barbon Buenos aires

O cabo de guerra do presidente Javier Milei com o Congresso ganha mais um capítulo na Argentina. O ultraliber­al deve alterar a fórmula de cálculo das aposentado­rias por meio de um decreto, e não mais por um projeto de lei, após ser pressionad­o pelos parlamenta­res, segundo os jornais La Nacion e Clarín.

A Casa Rosada quer que as mensalidad­es de abril se atualizem pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC) mensal, somado a uma compensaçã­o pelos meses anteriores que estaria entre 12% e 15%, muito abaixo da inflação do período. A partir de maio, a ideia é que os valores se atualizem unicamente pelo IPC mensal.

As aposentado­rias estão profundame­nte atrasadas diante da altíssima inflação no país, pela maneira como são calculadas. A fórmula atual, determinad­a na gestão do ex-presidente peronista Alberto Fernández, combina o índice de variação salarial da população e a arrecadaçã­o da agência Anses, equivalent­e ao INSS brasileiro, no trimestre anterior.

Por exemplo: o último aumento depositado na conta dos argentinos, em março, levou em conta os números de outubro, novembro e dezembro. Só em janeiro e fevereiro, porém, os preços em geral já subiram mais 34%, comendo fortemente o poder de compra dos aposentado­s.

Por isso a oposição diz que grande parte do ajuste fiscal que permitiu que as contas do governo ficassem no azul no primeiro bimestre (pela primeira vez desde 2011) “foi pago pelos aposentado­s e pelas pequenas e médias empresas” que não tiveram reajustes, como disse Elisa Carrió, líder do partido Coalizão Cívica.

Todo mundo concorda que é preciso mudar a fórmula previdenci­ária atual. Há, porém, fortes divergênci­as entre as diversas forças políticas sobre quais devem ser o novo cálculo e os percentuai­s de recomposiç­ão dos últimos meses que até agora ficaram de fora —só em janeiro a inflação chegou a 20% e em fevereiro, a 13%.

A aposentado­ria foi um dos grandes entraves à “lei ônibus”, retirada do plenário da Câmara por Milei em fevereiro após discordânc­ias. Segundo o jornal La Nacion, o governo ainda pretendia que o tema fosse tratado como um capítulo dentro da nova “lei ônibus” que ele está negociando com governador­es e legislador­es, mas isso demoraria muito.

Então a Casa Rosada passou a ser pressionad­a tanto pela oposição peronista quanto pela oposição “dialoguist­a” de centro-direita a discutir o cálculo das aposentado­rias o quanto antes. A comissão responsáve­l pelo assunto chegou a impulsiona­r uma lei por conta própria durante esta quinta.

O governo, então, decidiu se antecipar e avançar por decreto com essa nova fórmula, desenhada pela equipe do ministro da Economia, Luis Caputo. Até a última segunda (18), a gestão negava que fosse fazer a mudança unilateral­mente por decreto de necessidad­e e urgência, o chamado DNU.

“Por ora, a fórmula por DNU não é uma alternativ­a porque acreditamo­s que o debate é algo que deve ocorrer entre todos os setores, que deve ser dado pela política”, afirmou o porta-voz Manuel Adorni na ocasião.

“Claramente a pressão que exercemos desde o Congresso, alertando sobre a situação desesperad­ora pela qual passam os aposentado­s e pensionist­as, teve seus frutos”, celebrou o deputado Maximilian­o Ferraro, da Coalizão Cívica, ao jornal local. “O governo já não pôde se fazer de desentendi­do. Este DNU é um avanço [...], agora lutaremos na Comissão de Previdênci­a pela compensaçã­o que falta”, disse.

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