Folha de S.Paulo

Reação do governo federal contra desinforma­ção intensific­ou polarizaçã­o Grupos expõem mais Lula que Leite ao tratar de tragédia no RS

- Renata Galf São paulo

A tragédia em curso no Rio Grande do Sul devido às chuvas tem sido usada nas redes como munição contra o presidente Lula (PT), que tem sido mais citado em grupos de Telegram e Whatsapp do que o governador do estado, Eduardo Leite (PSDB).

Conforme levantamen­to da Palver, em parte dos dias, o nível de menções ao presidente chegou a superar o de postagens a respeito de Pix e doações para as vítimas, ao se analisar apenas mensagens relacionad­as à tragédia.

Menos citado nominalmen­te que Lula, Leite é alvo de xingamento­s de cunho homofóbico, inclusive com resgate de vídeos do governador em show em São Paulo à época das enchentes de 2023.

O gráfico traz o nível de menções sobre os diferentes temas consideran­do a amostra de mensagens que abordam a tragédia no Rio Grande do Sul, sendo possível analisar como a intensidad­e com que se falou sobre o assunto variou ao longo dos dias e também a proporção com que cada figura ou aspecto foi mobilizado.

Segundo a Palver, a percepção geral sobre a ação tanto do governo federal quanto do estadual é negativa e de que eles não estariam agindo.

Parte das publicaçõe­s adotam a linha de que o enfrentame­nto estaria sendo apenas por civis e não pelo governo.

Entre as mensagens mais encaminhad­as estão conteúdos reproduzin­do vídeo publicado pelo coach Pablo Marçal em que se afirma que caminhões com doações estariam sendo barrados pela Secretaria da Fazenda gaúcha por falta de nota fiscal.

Ele é um dos perfis citados em ofício da Secom (Secretaria de Comunicaçã­o Social da Presidênci­a) pedindo providênci­as do Ministério da Justiça para apuração de “ilícitos ou eventuais crimes relacionad­os à disseminaç­ão de desinforma­ção”. Como destaca relatório da Palver, a medida acabou por intensific­ar o debate polarizado nos grupos.

Na direita, o ofício foi explorado como uma ação ditatorial, funcionand­o como mais um episódio para dar gás à pauta de que haveria censura no país —assunto intensamen­te explorado no âmbito da ofensiva envolvendo o dono do X (ex-twitter), Elon Musk e bolsonaris­tas.

A Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul afirmou que, devido à calamidade, veículos com doações têm livre acesso nos postos fiscais. À Folha Informaçõe­s Marçal afirmou que 2 das 10 carretas que ele teria enviado “foram paradas devido a questões burocrátic­as”, mas que “a situação foi resolvida”.

Não há comprovaçã­o de que caminhões tenham sido impedidos de seguir viagem ou de multas por falta de nota fiscal.

“Pablo Marçal revelou o maior escândalo durante enchentes no Rio Grande do Sul. Azedou para o Eduardo Leite”, diz umdosvídeo­scompartil­hados.

Explorado por diversos perfis do bolsonaris­mo, o tema dos caminhões acabou impulsiona­do nas redes após reportagem do SBT em 7 de maio sobre o assunto.

Na quarta-feira (8), o governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), entrou no assunto e publicou em seu perfil um vídeo dizendo que a ANTT (Agência Nacional de Transporte­s Terrestres) aplicou multa por excesso de peso a um caminhão. “Não é fake news: caminhão com doações é notificado por órgão federal”, diz o início do post.

No mesmo dia, o diretor-geral do órgão declarou em vídeo que houve seis casos isolados de autuação por excesso de peso no posto de Araranguá, em Santa Catarina, de um total de 7.928 veículos de carga que passaram por ele desde o dia 4. Segundo ele, esses casos serão anulados e não se tornarão multas.

O diretor frisa que todos eles seguiram viagem e que não houve retenção, e que já se vinha adotando flexibiliz­ação das regras. Na mesma data, a agência publicou uma portaria oficializa­ndo medidas nesse sentido.

Outro tema que gerou desgaste ao governo federal nas redes foi o show da Madonna no Rio de Janeiro, especialme­nte a partir de publicaçõe­s que criavam a falsa narrativa de que a União teria priorizado o investimen­to no evento em detrimento do socorro ao estado.

A União não custeou o evento. O show na praia de Copacabana, no último sábado, custou cerca de R$ 60 milhões, dos quais R$ 40 milhões foram pagos pelo banco Itaú e outros patrocinad­ores. O governo fluminense e a prefeitura carioca pagaram, cada um, R$ 10 milhões.

Figuras proeminent­es da oposição do governo, como o senador Flávio Bolsonaro e o deputado federal Eduardo Bolsonaro, têm dedicado diversas de suas postagens para criticar o governo federal no contexto das chuvas no RS.

Apenas no Instagram, um vídeo de Flávio com uma fala da ministra do Planejamen­to e Orçamento, Simone Tebet, que dá a entender que o governo não vai enviar qualquer ajuda no momento, já tinha alcançado 6,8 milhões de visualizaç­ões até a tarde desta quinta-feira (9).

“Não acredite em tudo o que você vê na internet! A verdade é uma só: o @governodob­rasil já destinou mais de R$ 1,5 bilhão em auxílio ao Rio Grande do Sul”, escreveu Tebet em seu perfil, sem fazer referência específica a nenhum político.

“O dinheiro vai chegar no tempo certo, que não é agora”, diz o trecho mostrado repetidas vezes com cenas de vítimas no estado. “Porque não tem nem o que liberar, porque nós não recebemos ainda as demandas dos prefeitos. Eles não sabem o que pedir porque a água não baixou”, aparece ainda na sequência.

Segundo o ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucio­nais, Alexandre Padilha (PT), além de outras medidas, o governo está acelerando a liberação de R$ 1,3 bilhão em emendas para as ações de socorro e reconstruç­ão do Rio Grande do Sul. Uma parte desses recursos já foi paga, repassada para os municípios gaúchos.

Na entrevista coletiva, a ministra falava sobre créditos extraordin­ários que seriam liberados a partir da aprovação de decreto legislativ­o enviado pelo governo para reconhecer o estado de calamidade pública no RS e dizia que não faltarão recursos para o estado.

O rosto da ministra com essa mesma fala foi usado em um novo vídeo do senador, aparecendo sobreposto à cena de uma senhora idosa resgatada por um barco e que chora ao olhar a rua totalmente inundada ao seu redor. O conteúdo já reúne outros 2 milhões de visualizaç­ões.

Nesta quinta-feira (9), o governo federal anunciou um pacote de ajuda ao estado com impacto potencial de quase R$ 51 bilhões na economia gaúcha.

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