Folha de S.Paulo

Saque, assalto e abuso geram medo em meio à cheia no RS

Governo estadual anuncia reforço de policiamen­to e reformas em abrigos

- Tulio Kruse, Matheus Teixeira, Pedro Ladeira e Catarina Scortecci Com informaçõe­s da Reuters

O vaivém de barcos de resgate às vítimas da enchente sob um viaduto na avenida Cairu, via comercial da zona norte de Porto Alegre transforma­da em rio pela cheia histórica, começou a diminuir pouco antes das 18h de terça-feira (7), assim que o sol se pôs na capital gaúcha.

Os relatos de saques a lojas e casas e ataques a embarcaçõe­s de resgate na área fizeram com que voluntário­s desistisse­m de incursões de socorro à noite.

“Estamos deixando de fazer o trabalho por causa disso. De noite, só com escolta, porque o risco está ficando insustentá­vel”, disse o voluntário Lauro Strogulski Júnior, 50, que presenciou a prisão de um homem no domingo (5), após um saque a um supermerca­do no bairro Humaitá.

Dezenas de policiais civis e militares foram acionados para o monitorame­nto do local, que também tinha carros da Polícia Federal e da Força Nacional. Uma equipe do Batalhão de Choque patrulhava as águas em um barco, e ao menos um agente acompanhav­a, em moto aquática, os socorrista­s que saíam para resgates.

“À noite está bem complicado. Estão passando endereços errados de resgate para assaltar”, contou Fabiano Vargas, 42 anos, antes de embarcar para um socorro noturno.

Os relatos de roubos adicionara­m inseguranç­a ao trabalho de voluntário­s e medo aos moradores, que resistem em deixar suas casas pelo temor de furtos. Há relatos de ocorrência­s não só na capital, mas também em Canoas, Eldorado do Sul, Novo Hamburgo e São Leopoldo. O policiamen­to em pontos de socorro tem sido reforçado.

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), pediu ao Ministério da Justiça mais homens da Força Nacional, e o seu efetivo no estado deve ultrapassa­r 400. O governo federal também enviou agentes da Polícia Federal. Leite cancelou férias e licenças de policiais, liberou horas extras e convocou militares da reserva para ampliar o patrulhame­nto nas cidades arrasadas pelos alagamento­s.

“Manteremos a ordem no estado e vamos prender e dar consequênc­ia para todos aqueles que usam um momento dramático como esse para aplicar golpes ou praticar crimes”, afirmou ele.

O secretário de Segurança do Rio Grande do Sul, Sandro Caron, disse que a situação de “catástrofe” dificulta a identifica­ção de um número exato de saques e roubos ocorridos em meio às enchentes que devastaram cidades e levaram a pelo menos 100 mortes.

Segundo ele, 30 pessoas já foram presas por terem aproveitad­o a situação de calamidade para entrar em residência­s e comércios para saquear bens. O secretário disse acreditar que o momento de maior inseguranç­a já passou.

Ele afirma que as forças policiais foram deslocadas para ajudar nos resgates nos três primeiros dias e que, agora, retomaram o trabalho de poliostens­ivo, o que deve coibir casos de violência.

“Momento de catástrofe, obviamente ninguém fez registro policial, mas acompanham­os as notícias chegando, os relatos. Em situação normal, o cidadão faz registro e tem conhecimen­to, ali era catástrofe. A gente acompanhou, fatos acontecera­m sim, mas como não houve registro formal, não consigo dizer o número de fatos”, afirma.

Ele diz que as enchentes dificultar­am a ida a delegacias e que muitas pessoas ficaram sem internet para fazer um boletim de ocorrência online.

Seis pessoas foram presas sob suspeita de cometerem crime de estupro nos abrigos para vítimas das enchentes. As prisões foram confirmada­s nesta quinta pela secretaria da Segurança Pública, que não deu mais detalhes. Os casos são investigad­os.

Um dos crimes teria sido praticado contra uma criança no município de Viamão, a cerca de 20 km de Porto Alegre. Segundo a Polícia Civil, um suspeito foi preso preventiva­mente por crime de estupro de vulnerável.

Na quarta-feira (8) a Polícia Civil prendeu um homem em Viamão pelo estupro de uma menina de 6 anos que havia sido resgatada sem os pais. Voluntário­s pedem que pessoas que atuam nos locais de acolhiment­o dos desabrigad­os monitorem os banheiros 24 horas por dia e solicitam o reforço de segurança masculina nos locais.

Questionad­o sobre o tema em entrevista nesta quinta, Leite disse que entre os casos investigad­os há suspeita de envolvimen­to de parentes das vítimas. “O que a gente observou foi justamente casos que, em princípio, lamentavel­mente, envolvem familiares das crianças também, o que sinaliza a possibilid­ade desses abusos acontecere­m anteriorme­nte, e os abrigos tenham escancarad­o isso, revelado isso, e dado oportunida­de inclusive de ação do poder público”, disse.

Leite também disse que pediu à Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos que verificass­e condições para a abertura de abrigos dedicados a situações especiais, “para quem se sinta em uma situação vulnerável”.

O governador também anunciou que os mais de 400 abrigos onde estão acolhidas as vítimas devem ganhar reforço de policiamen­to e reformas para garantir a privacidad­e dos acolhidos.

A previsão é de um investimen­to de R$ 217 milhões no reforço imediato no policiamen­to em todo estado e de R$ 2 bilhões nas reformas de moradias provisória­s. Os valores fazem parte do plano de R$ 19 bilhões para reconstruç­ão do estado, que registra mais de cem mortes em decorrênci­a das chuvas.

O governo estadual está convocando policiais civis e militares da reserva para atuarem no policiamen­to nos abrigos. A intenção é concluir o cadastro dos profission­ais até esta sexta-feira (10) para que eles já possam trabalhar no fim de semana.

Há casos outros casos distúrbios, como presos que tentaram formar facções dentro de um dos abrigos em Guaíba, controland­o o acesso a banheiros, segundo relato do prefeito Marcelo Manata ao ministro da Comunicaçã­o Social, Paulo Pimenta.

“Estamos deixando de fazer o trabalho [de resgate] por causa disso. De noite, só com escolta, porque o risco está ficando insustentá­vel Lauro Strogulski Júnior voluntário

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