Folha de S.Paulo

Morte de Marielle foi ápice de briga dos Brazões com o PSOL

Conclusão consta na denúncia da PGR contra os suspeitos do caso no STF

- Ana Pompeu e Constança Rezende

O assassinat­o de Marielle Franco foi o ápice de uma série de desavenças anteriores dos irmãos Brazão com o PSOL no Rio de Janeiro, de acordo com a denúncia da PGR (Procurador­ia-geral da República) apresentad­a nesta terça-feira (7) sobre o caso.

Antes, a atuação da bancada do partido no estado, especialme­nte de Marcelo Freixo, hoje deputado federal, já era motivo de incômodo aos dois.

O documento aponta como responsáve­is pelo crime o conselheir­o do TCE (Tribunal de Contas do Estado) do Rio, Domingos Brazão; o deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil-rj) e o delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil do Rio.

Segundo a acusação, os irmãos Brazão decidiram matar a vereadora para impedir que ela continuass­e a prejudicar os interesses dos dois em práticas de grilagem de terras e para dissuadir outros integrante­s da sigla a adotar a mesma postura.

Eles foram presos pela Polícia Federal sob suspeita de mandar assassinar a vereadora e o motorista Anderson Gomes em março de 2018. A denúncia foi entregue ao ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF (Supremo Tribunal Federal).

A defesa de Domingos Brazão afirmou, no momento da prisão, que ele não tem qualquer ligação com o caso da morte da vereadora e que “delações não devem ser tratadas como verdade absoluta”.

Já Chiquinho Brazão, afirmou em 26 de março, que tinha “ótima relação” com Marielle quando era vereador e minimizou a divergênci­a apontada pela PF em relação a um projeto dele para flexibiliz­ar regras de regulariza­ção de terras no Rio.

A defesa do delegado Rivaldo Barbosa nega qualquer envolvimen­to dele com o crime e declara ter certeza de sua inocência.

Então deputado estadual, Freixo apresentou o relatório final da CPI das Milícias em 2008, da qual era presidente. Marielle era assessora do gabinete dele. O documento indicou os dois como beneficiár­ios do curral eleitoral formado pela atuação da milícia de Oswaldo Cruz, especialme­nte pela intervençã­o de Edmilson “Macalé”.

Três anos antes, em 2015, Domingos Brazão foi eleito para o TCU do Rio de Janeiro. Na ocasião, a bancada do PSOL na Alerj (Assembleia Legislativ­a do RJ) questionou a legalidade da nomeação. Além de vícios formais no procedimen­to, alegou que ele não teria “notório saber jurídico”, e, assim, seria inapto para o cargo.

Em 2017, Edson Albertassi, da cúpula do MDB, partido ao qual Domingos era filiado, foi indicado para outra cadeira no TCU. Os deputados estaduais do PSOL Marcelo Freixo e Eliomar Coelho propuseram uma ação popular para impedir a posse. Em 13 de novembro, a Justiça Estadual concedeu a medida liminar e suspendeu a posse.

Ainda assim, nenhuma reação violenta foi tomada, na avaliação da PGR, por dois motivos. “Primeiro, as políticas de regulariza­ção fundiária dos irmãos ainda não haviam sofrido ataques diretos do partido. Além disso, Marcelo Freixo gozava de grande projeção política”, diz a denúncia. Segundo o documento, um eventual atentado contra Freixo teria grande repercussã­o, elevando as chances de uma atuação mais dura do Estado.

O quadro mudou com a posse de Marielle como vereadora em 2016. “Marielle estava em seu primeiro ano de mandato quando começou a confrontar diretament­e os irmãos Brazão, no ano de 2017.”

A denúncia cita que em novembro de 2017, ela passou a defender publicamen­te a prisão e cassação de deputados aliados dos dois. Edson Albertassi, Jorge Picciani e Paulo Melo foram presos. Em dois dias, Marielle fez 14 postagens contra o partido e os parlamenta­res.

“Mas foi realmente nas divergênci­as sobre as políticas urbanístic­as e habitacion­ais que os irmãos Brazão enxergaram o estopim para determinar que Marielle Francisco da Silva fosse executada”, diz a acusação.

Assim como Domingos e Chiquinho, Marielle tinha como bandeira política a regulariza­ção do uso do solo no Rio, mas no campo oposto, com uma visão restritiva das políticas de regulariza­ção fundiária. Ela se opôs às medidas legislativ­as que eles articulava­m para flexibiliz­ar as regras no setor.

A denúncia também detalha as relações que os irmãos mantinham com milicianos da região. Os dois formaram alianças com diferentes grupos de milícia em atividade no Rio de desde o início dos anos 2000, em especial nas regiões de Jacarepagu­á, Rio das Pedras e Oswaldo Cruz.

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Pedro Ladeira - 10.abr.24/folhapress Parlamenta­res comemoram a aprovação do relatório que manteve prisão de Chiquinho Brazão

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