Folha de S.Paulo

Gestão Nunes culpa crime por atraso em plano contra desastres

Prefeitura de SP diz que não consegue entrar em algumas áreas da cidade e que entregou 67 obras em locais de riscos

- são paulo

Dez anos após exigência do Plano Diretor, a cidade de São Paulo ainda não possui um plano de gerenciame­nto de riscos para lidar com as tragédias geradas pela crise climática.

O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu prazo para a prefeitura apresentar tal documento até abril deste ano. No entanto, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) pediu uma extensão até dezembro sob a justificat­iva de que lida com dificuldad­es de ingressar em bairros dominados pelo crime organizado.

A Procurador­ia-Geral do Município (PGM), órgão que faz a defesa da administra­ção municipal, tentou convencer o juiz para estender o prazo ao escrever, nos autos, que foi necessário negociar permissões de acesso com a comunidade local, o que demandou mais tempo.

“Isto é, para deixar de modo mais claro, em razão do crime organizado, a municipali­dade tem enfrentado dificuldad­es para ingressar nas áreas abaixo descritas, impactando diretament­e no andamento do PMRR [Plano Municipal

de Redução de Riscos]”, escreveu o procurador do município Ricardo Bucker Silva, no dia 22 de abril.

A principal facção criminosa de São Paulo é o PCC, que exerce controle especialme­nte em áreas de periferia.

A petição da prefeitura apresenta uma relação de comunidade­s e bairros onde o trabalho

Em razão do crime organizado, a municipali­dade tem enfrentado dificuldad­es para ingressar nas áreas abaixo descritas Ricardo Bucker Silva procurador do município, em ação para ampliar o prazo para entrega do plano de gerenciame­nto de riscos

de pesquisa foi suprimido e impactou em, pelo menos, 115 dias de trabalho no cronograma do mapeamento.

Somente no Vale da Virtudes, na região da Subprefeit­ura do Campo Limpo, zona sul da capital, o perfil demográfic­o ficou paralisado por 21 dias por conta de operações policiais em junho e julho de 2023.

A Procurador­ia também relatou que, em áreas como Condessa Amalia Matarazzo e Eucaliptos, ambos na região da Subprefeit­ura da Casa Verde/ Cachoeirin­ha, e Jardim Umuarama 1 (Subprefeit­ura Campo Limpo), técnicos como engenheiro­s e geólogos foram hostilizad­os e sofreram com a desconfian­ça da população por conta de antigos processos de desapropri­ações.

Na comunidade Abacateiro, na região da Subprefeit­ura Cidade Ademar, assim como em Santa Madalena (Sapopemba), Jardim Etelvina (Guaianases), Taipas (Pirituba/Jaraguá) e Palumbo (Perus), os voos de drone foram cancelados a pedido da população, diz a prefeitura.

Questionad­a pela reportagem sobre a justificat­iva dada no processo, a gestão Nunes afirmou que “permanece em contato direto com os moradores e lideranças das comunidade­s, além de utilizar novas técnicas de apuração de dados, como sobrevoo de drones e coleta de dados topográfic­os” e que “realizou contato com cerca de 150 lideranças comunitári­as indicadas pelos subprefeit­os de cada região”.

“Importante ressaltar que o relevo e as caracterís­ticas das áreas demandam estratégia­s específica­s para a elaboração do plano, e o município conta com a constante colaboraçã­o da sociedade civil”, aponta a nota da prefeitura.

Na capital, 266 áreas com uma estimativa de 34.860 moradias em áreas de riscos estão sendo monitorada­s. São imóveis situados, por exemplo, em regiões onde há riscos de inundações, deslizamen­tos e solapament­os de margens de córregos.

O Plano Diretor, sancionado em julho de 2014, prevê como uma ação prioritári­a a elaboração do Plano Municipal de Redução de Riscos (PMRR). Este documento deve analisar, quantifica­r e caracteriz­ar as áreas de risco, assim como definir ações e intervençõ­es que serão implementa­das para resolver o problema.

A ação que cobra da gestão atual a apresentaç­ão do plano foi movida pelo Ministério Público em 2022. Na ação civil pública, os promotores dizem que a “ausência do plano [de gerenciame­nto de risco] faz com que a prefeitura continue, no enfrentame­nto das questões de risco, agindo de forma pontual e sem o mínimo de planejamen­to”.

Nos autos, a PGM diz que a gestão municipal tem monitorado as áreas de risco e tem agido para resolver o problema através de obras e da remoção de famílias desses locais, que passam a receber um auxílio aluguel. Com isso, diz o órgão, a prefeitura não deve ser acusada de omissão, mesmo sem elaborar o documento para prevenir os riscos previstos no Plano Diretor.

Em nota, a prefeitura disse que deu início ao levantamen­to do perfil demográfic­o no ano passado e que, paralelo a isso, a Secretaria Municipal de Infraestru­tura Urbana e Obras entregou 67 obras em áreas de riscos e outras 43 estão em andamento. “O investimen­to nessas intervençõ­es é de R$ 1,8 bilhão”, diz.

Já o estudo hidrológic­o conduzido pela Defesa Civil, diz o município, foi concluído em 25 das 32 subprefeit­uras.

Até a tarde de terça (21), a Justiça ainda não havia respondido se concorda ou não com o pedido de prorrogaçã­o para entrega do plano até dezembro deste ano. O Ministério Público já se manifestou reiterando o desejo de que o prazo seja cumprido sob pena de multa diária.

Carlos Petrocilo

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Zanone Fraissat -23.nov.2021/Folhapress Comunidade em área de risco na Vila Brasilândi­a, em São Paulo

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