Feministas e gamers se enfrentam on- line
Mobilização # gamergate pede maior transparência no segmento de jogos, mas é acusado de fomentar misoginia
Brasileiro é apontado como autor de ameaças a quem critica sexismo em jogos eletrônicos; ele nega as acusações
Do término problemático de um namoro a ameaças de morte, passando por questionamentos de alguns sites jornalísticos. O # gamergate, como outras mobilizações que nasceram e se desenrolaram nas redes sociais, é uma mescla de fatos e interpretações.
Desde que o ex- namorado de uma desenvolvedora de jogos americana, chamada Zoe Quinn, divulgou em um site a história do relacionamento deles em que citava uma suposta traição dela com um crítico de games, em agosto, o movimento não parou de crescer em notoriedade — e em número de facetas.
Os “gamergaters”, adeptos dessa mobilização, dizem que há uma conspiração entre a imprensa especializada em videogames e alguns desenvolvedores, como Quinn. Os críticos rebatem.
“Os gamers acreditam que alguém virá tirar os brinquedos deles”, diz Leigh Alexander, que escreveu um artigo no “Gamasutra” que acarretaria a perda de um grande anunciante desse site, a Intel. Aempresafoi pressionada pelos “gamergaters” a tanto.
Para Alexander, a fachada de crítica aos sites de videogame esconde o caráter misógino, de discriminação contra as mulheres, da cultura de jogos eletrônicos.
É a mesma opinião da universitária Marina Rocha Ciavatta, 21, que se considera gamer e trabalha esporadicamente com jogos eletrônicos. “A mulher vem perdendo o medo de se expor e, para um meio tão misógino quanto esse, isso é chocante.”
VIOLÊNCIA
Quinn, assim como outra desenvolvedora, Brianna Wu, e uma crítica de games on- line, Anita Sarkeesian, foram ameaçadas de morte nos últimos meses, alegadamente em consequência da eclosão do movimento gamergate.
Sarkeesian cancelou uma palestra na Universidade de Utah no dia 15 depois de ter recebido por e- mail uma ameaça de atentado.
“Detetives” anônimos divulgaram on- line que uma das contas no Twitter responsáveis por outras ameaças feitas a Sarkeesian era de um brasileiro, Mateus Prado Sousa, dono de um site com vários artigos contra a ativista.
Ele nega ter feito as ameaças e afirma que está investigando com seus advogados os autores da acusações. Sousa diz que Sarkeesian é moralista ao criticar a sensualização da mulher nos jogos.
“Ela quer censura”, disse à Folha. “Anita não é apenas feminista, é moralista. O feminismo se torna um problema quando vira moralismo.”
Para a historiadora Ana Bourg, 25, que diz jogar regularmente e que já colaborou com o desenvolvimento de games, o incentivo para a entrada no segmento pode ser um passo para a igualdade.
“Acho também que deveria haver canais de denúncia melhores”, diz. “Há toda uma cultura machista que mantém as mulheres segregadas nesse meio. As mulheres são uma parte muito grande do público gamer e nerd, mas muitas preferem não se identificar para evitar assédio.”
Coordenadora da Associação Brasileira dos Desenvolvedores de Jogos Digitais, Eliana Russi diz que o quadro de dominância masculina atual tende a mudar, em parte por causa de um novo processo de criação dos games. “Está deixando de ser só das carreiras exatas e se voltando a designers, roteiristas.”