Folha de S.Paulo

ANÁLISE Convenção que presidente celebra hesitou sobre escravidão

- RODRIGO VIZEU

Pioneira e enfática na defesa da transforma­ção do Brasil em uma república, a Convenção de Itu, agora homenagead­a por Michel Temer, pisou em ovos sobre outro tema quente daquele 1873: a libertação dos escravos.

Reunidos na casa de um fazendeiro da cidade, 133 republican­os, entre os quais o futuro presidente Campos Sales, lançaram manifesto em que atacavam a hipótese de um Terceiro Reinado e cobravam um sistema federativo de governo. Foi a base inaugural do Partido Republican­o Paulista (PRP).

O terceiro tópico tratado pelo grupo, a abolição da escravatur­a, mereceu tom menos categórico.“[Aquestãoda­abolição] não nos pertence exclusivam­ente porque é social e político; está no domínio da opinião nacional e é de todos os partidos, e dos monarquist­as mais, do que nossa, porque compete aos que estão no poder ou aos quepretend­emapanhá-loamanhães­tabelecero­smeiosdese­u desfecho positivo.”

Em seguida, o documento acrescenta que os republican­os defendem “direitos adquiridos” e indenizaçã­o aos donos de escravos. E afirma: “Em respeito ao princípio da união federativa, cada província realizará a reforma de acordo com seus interesses peculiares, mais ou menos lentamente, conforme a maior ou menor facilidade na substituiç­ão do trabalho escravo pelo livre”.

O conservado­rismo na abordagem do tema se explica pela composição do grupo reunido em Itu: 78 dos 133 convencion­ais eram produtores rurais, muitos dos quais beneficiár­ios da mão de obra cativa. Quatro em dez habitantes de Itu eram escravos.

A convenção não foi o primeiro ato republican­o brasileiro —um clube em defesa da causa foi fundado em 1870 no Rio. Mas a repercussã­o foi tímida e o manifesto carioca mereceu pouco caso até de dom Pedro 2º. “Ora, se os brasileiro­s não me quiserem para seu imperador, irei ser professor”, teria reagido o monarca.

Embora não inédita, a iniciativa no interior de São Paulo, desta vez referendad­a pelos emergentes cafeiculto­res do Estado, deu peso político e econômico ao movimento republican­o. A causa multiplico­u seus apoios públicos pelo país, mas seguiu ruim de votos, em parte devido ao sistema eleitoral fraudulent­o do Império. A vitória sobre a monarquia, com o golpe de 15 de novembro de 1889, só viria com o apoio do Exército.

Com a República, o PRP enfim virou protagonis­ta, dominando a política nacional até a Revolução de 1930.

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