Folha de S.Paulo

A disputa pela carniça do governo Temer

- VINICIUS TORRES FREIRE

A TROCA de uns ministério­s por votos parecia a maneira restante de aprovar alguma reforma da Previdênci­a. Até que, agora se vê, a troca de ministério­s também se tornou um problema.

Quando não é apenas sintoma de doença letal do governo, “ampla reforma ministeria­l” é um mito da política brasileira, tal como uma “profunda” reforma política ou a reforma tributária. Mais fácil ver o fogo que a mula sem cabeça solta pelas ventas que não tem.

A reforma ministeria­l enrola problemas tais como redistribu­ição de feudos de exploração eleitoreir­a, a acomodação de gente desesperad­a por um foro privilegia­do e a composição de alianças para a eleição de 2018. Melindres entre partidos maiores e a temporada de apostas em cavalos com chance de vitória na eleição presidenci­al dificultam ainda mais os acordos no Congresso.

Difícil ver que desse emaranhado de problemas e conflitos saiam 308 votos para mudar a Previdênci­a.

Problema um, há disputa pela carniça do governo Temer. A redistribu­ição de ministério­s não deve ser bastante para comprar o apoio de partidos do centrão, que começaram a brigar entre si pelo butim. Os votos ganhos pela doação de tal pasta a tal partido criam desafetos na outra turma, disputas de PR, PP, PRB e PSC. Além do mais, alas do PMDB e o DEM também querem levar o seu. Começou mal a coisa.

Problema dois: muito ministro quer ficar na cadeira até o minuto final do prazo da desincompa­tibilizaçã­o para se candidatar em 2018, a fim de usar o ministério como propaganda eleitoral, “business as usual”.

Três: Michel Temer precisa arrumar refúgios de foro privilegia­do para aliados com rolo na polícia. Em suma, não vai ter cadeira para todo o mundo que queria vender voto por ministério.

Quatro: PMDB e DEM fazem ameaças cada vez mais críveis de que vão largar o PSDB sozinho com Geraldo Alckmin. Não quer dizer que alianças e candidatur­as principais sejam logo definidas. Mas o jogo de ameaças nesse sistema de alianças leva a guerra também ao Congresso.

Quanto maior a possibilid­ade de candidatur­as variadas nesse bloco, menos provável que os parlamenta­res das dissidênci­as se empenhem muito em votar com o governo, mesmo com juras de amores pelas reformas.

O PMDB já tem um racha lulista. O DEM se inclina cada vez mais pela candidatur­a do “outsider” de direita que suba nas pesquisas, qualquer um. O que vier traçam, desde que pareça um cavalo vencedor (que pode até ser Alckmin, se por milagre o governador subir logo nas pesquisas). Se o PSDB fingir que nada teve a ver com o governo Temer, parte do PMDB vai querer vingança, como vem dizendo Romero Jucá, ministro virtual, senador e presidente do partido.

Nenhum desses rolos vai se resolver tão cedo ou tão facilmente: reforma agrária de feudos ministeria­is, alianças locais, candidatur­as a presidente. Ainda que sejam desembaraç­ados, não se sabe o saldo de insatisfaç­ões que restará. Esse tumulto, enfim, dificulta a “recomposiç­ão da base”, a aquisição de votos até para aprovar o remendo do Orçamento ou da reforma trabalhist­a. Que dirá para a reforma da Previdênci­a.

Caso Temer aprove aprovar alguma mudança, terá tirado as meias sem tirar os sapatos. vinicius.torres@grupofolha.com.br

Disputas por restos de ministério e candidatos de 2018 tornam improvável reforma da Previdênci­a

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