Folha de S.Paulo

Contratado aos 54 anos, gerente recebeu até 10 propostas de concorrent­es em 2 anos

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DE SÃO PAULO

O advogado João Luiz Cunha dos Santos, 58, gerente jurídico corporativ­o da seguradora Tokio Marine, sentiu na pele uma mudança de cultura das empresas em relação a profission­ais com mais de 50 anos. Nos últimos dois anos, recebeu mais de dez propostas de trabalho de empresas concorrent­es, relata.

Há seis anos, quando voltou a São Paulo depois de um trabalho no Rio, ficou dois anos procurando emprego: avançava sem problemas nas fases de análise de currículo, “mas nas entrevista­s sempre aparecia aquela pergunta: ‘Você tem gás? Não está já pensandoem­seaposenta­r?’”.

Ao perceber que sua idade estava sendo uma barreira, Santos adotou a estratégia de procurar empresas japonesas: “Para os japoneses, quanto mais velho, mais merecedor de respeito”.

Com uma equipe cuja idade varia de 18 a 33 anos, ele diz que o mix de gerações melhora a qualidade do serviço.

O profission­al mais velho, segundo ele, consegue reduzir a ansiedade dos mais jovens, oferece saídas para obstáculos que eles desconheci­am e ajuda a olhar os problemas sob outras perspectiv­as.

As empresas que têm contratado profission­ais mais velhos confirmam a percepção de Santos: “Os mais velhos conseguem transmitir parte de sua maturidade para os mais jovens. O saldo da ba- lança é muito positivo”, diz Jean Carlo Nogueira, da Gol.

Santos diz que também aprende muito no convívio com os mais novos. “É fundamenta­l se atualizar, saber o que mudou na área, estar pronto, ter a mente aberta e vontade de aprender.”

A percepção de boa convivênci­a de Santos parece ser regra entre pessoas da sua faixa etária que, em sua vasta maioria, não se sentem discrimina­das por sua idade no ambiente de trabalho.

Segundo o Datafolha, apenas 6% dos maiores de 60 anos dizem já ter sofrido discrimina­ção nesse contexto. Na faixa etária de 45 a 49 anos, o percentual é o triplo.

Mas isso não quer dizer que não haja percalços, principalm­ente quando os mais velhos são chefiados por jovens. inédita feita pelo Datafolha, a série “Ao Seu Tempo” mostra como o brasileiro se relaciona com a idade. Desde novembro de 2017, foram abordados os novos valores e imagens dos mais velhos e sua relação com sexo, cultura e esportes, entre outros: folha.com/aoseutempo.

A Tokio Marine, onde Santos trabalha, percebeu isso quando fez um programa-piloto para inserção de profission­ais mais velhos.

“Não estávamos preparados, por exemplo, para questionam­entos que os mais maduros costumam fazer sobre os procedimen­tos internos. E esse questionam­ento, dependendo de como é feito, traz ruído”, diz Juliana Zan, gerente de Recursos Humanos.

Quando decidiu lançar uma nova versão do projeto, em 2017, a empresa considerou essa lição. Segundo Zan, a gestão foi previament­e preparada para lidar com os profission­ais maduros. “Dissemos aos gerentes: ‘Esse pessoal já vem com bagagem, tem o dobro da sua idade, então tem de estar preparado para ouvir e ser receptivo’.”

De acordo com ela, o treinament­o aparou as arestas e trouxe resultados positivos.

A gerente de RH diz que a política da Tokio já era tratar a inclusão de forma abrangente, sem criar “cotas” para diferentes grupos.

Apesar disso, em 2017, a seguradora sentiu necessidad­e de reforçar o quadro de atendiment­o com profission­ais acima de 50 anos.

Em outubro, abriu cinco vagaserece­beumaisde2.000 currículos. Contratou sete, em vagas temporária­s, de seis meses. Nesse intervalo, um dos selecionad­os já foi contratado de forma definitiva.

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