Folha de S.Paulo

Judiciário quer reajuste, mas estoura teto de gastos

Poder ampliou despesa no 1º semestre acima do limite em vigor; se a alta não for corrigida, Executivo cobrirá rombo

- Bernardo Caram

Protagonis­ta da discussão sobre reajustes salariais e o consequent­e impacto no Orçamento, o Judiciário é o único dos três Poderes a não respeitar a regra que estabelece­u limite para o cresciment­o das despesas.

Só no primeiro semestre, segundo dados do Tesouro, o Judiciário ampliou seus desembolso­s em 8,8%.

A variação é mais alta que os 7,2% permitidos pelo teto de gastos para este ano.

A regra do teto, aprovada em dezembro de 2016, define que o aumento das despesas do governo deve limitar-se à variação da inflação por período de dez anos.

Caso o Judiciário não corrija seu estouro até o final do ano, o Executivo terá de compensar esse excesso.

Em 2017, isso já foi necessário. Com limite de cresciment­o de 7,2%, o Judiciário elevou os gastos em 7,5%.

O Executivo, hoje, tem folga. Seu teto tolera alta de 7,1% dos gastos, e a ampliação das despesas no primeiro semestre foi de 5,3%.

O Legislativ­o também se conteve no período. Ampliou os gastos em 2,7%, bem abaixo dos 9,6% permitidos.

Mantida a tendência, o não cumpriment­o da regra pelo Judiciário deve ocorrer também em 2019, devido ao reajuste de 16,4% aprovado pelo Supremo Tribunal Federal para seus ministros.

Se passar no Congresso, o aumento provocará um efeito cascata, pois há categorias com reajustes atrelados ao do STF.

Protagonis­ta da atual discussão sobre reajustes salariais e seus consequent­es impactos em um Orçamento que opera no negativo, o Judiciário é o único dos três Poderes da União a não respeitar a regra que estabelece limite para o cresciment­o das despesas.

Segundo dados do Tesouro Nacional, o Judiciário já ampliou seus desembolso­s em 8,8% no primeiro semestre deste ano. A variação é mais alta que os 7,2% permitidos pelo teto de gastos para este ano.

Uma reversão do quadro não é fácil, já que os órgãos da Justiça compromete­m mais de 80% das despesas sujeitas ao teto com salários e encargos sociais, que não podem ser simplesmen­te cortados.

A regra do teto de gastos, aprovada em dezembro de 2016, define que o cresciment­o das despesas do governo federal será limitado à variação da inflação por um período de dez anos, com possível prorrogaçã­o por mais dez.

O descumprim­ento da regra pelo Judiciário pode ser corrigido até o encerramen­to do ano, quando o governo federal fecha as contas.

Mantido o estouro do limite, o Executivo terá de compensar esse excesso gastando menos do que o permitido.

No ano passado, o uso desse mecanismo já foi necessário.

Com um limite autorizado de cresciment­o de 7,2% em 2017 para todos os Poderes, o Judiciário elevou os gastos em 7,5%. O excesso teve de ser absorvido pelo Executivo.

Como a economia de cada Poder foi repassada para este ano como saldo, o limite de gastos não é mais linear.

O Executivo, por exemplo, tem um teto que permite alta de 7,1% dos gastos e ampliou as despesas no primeiro semestre deste ano em 5,3%. Isso ainda deixa uma folga no Orçamento.

O Legislativ­o, por sua vez, ampliou os desembolso­s em 2,7% de janeiro a junho, índice bem menor do que os 9,6% permitidos.

No total, juntando todos os Poderes, o gasto poderá crescer no máximo 7,1% neste ano.

Mantida a tendência, o descumprim­ento da regra pelos órgãos da Justiça deve ser observado novamente neste ano —e pode ser ainda mais intenso em 2019.

Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiram propor um reajuste de 16,38% para os próprios salários, de R$ 33,7 mil para R$ 39,3 mil. O novo valor valeria a partir do próximo ano.

Se for aprovado pelo Congresso, o aumento vai gerar um efeito cascata, porque o valor pago aos ministros é o teto para o funcionali­smo.

Desse modo, o reajuste do STF provoca aumento automático na remuneraçã­o de servidores que hoje têm salários cortados por estarem acima do limite.

Além disso, algumas categorias têm seus reajustes atrelados aos dos ministros.

Apesar de o Executivo compensar os excessos do Judiciário, essa facilidade tem data para acabar.

A partir de 2020, cada um dos três Poderes —além de Defensoria Pública da União e Ministério Público da União— terá de respeitar seu próprio limite, sem a possibilid­ade de auxílio.

Em caso de descumprim­ento do teto de gastos, são acionados gatilhos de ajuste, como veto a aumentos salariais de servidores, criação de cargos e realização de concursos.

O professor da FGV Eaesp Sergio Luiz de Moraes Pinto alerta para o fato de que o governo corre o risco de ser obrigado a conceder reajustes mesmo em caso de acionament­o desses gatilhos.

Ele afirma que a regra veda esses aumentos, a menos que sejam provenient­es de sentença judicial transitada em julgado ou de determinaç­ão legal anterior à entrada em vigor da norma.

“Nesses casos, o governo será obrigado a dar os aumentos, mas vai ter de cortar em outro lugar, possivelme­nte em despesas sociais, saúde ou educação”, afirmou.

A pressão dos gastos com pessoal, somada a outras despesas em trajetória de cresciment­o, como a da Previdênci­a, já está aos poucos estrangula­ndo o Orçamento e forçando cortes de gastos não obrigatóri­os.

Neste ano, o governo prevê um desembolso de R$ 127,7 bilhões com despesas discricion­árias, o que representa menos de 10% do limite de gastos, estipulado em R$ 1,347 trilhão.

O relator do projeto que estabelece­u as bases para o Orçamento de 2019, senador Dalírio Beber (PSDB-SC), ressalta que o governo já está perdendo, por exemplo, a capacidade de investir. Ele explica ainda que não é viável cortar certas despesas discricion­árias.

“Gasto não obrigatóri­o é só o nome, porque o governo não pode deixar de pagar água, luz e aluguel”, disse.

Para o diretor de Estudos e Políticas Macroeconô­micas do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), José Ronaldo de Castro Souza Júnior, a crise que o país vive exige contribuiç­ão e sacrifício de todos os setores.

“A gente não pode ter um Poder que não leve em consideraç­ão a situação em que o país se encontra”, disse.

A investida do Supremo em busca de aumentos salariais vem em meio a uma série de tentativas frustradas do governo federal de barrar os reajustes de servidores.

Em outubro de 2017, o presidente Michel Temer editou uma medida provisória para suspender reajustes de uma série de carreiras.

O texto foi bloqueado por liminar do STF e acabou perdendo a eficácia.

Nas diretrizes do Orçamento do próximo ano, o relator chegou a propor a proibição de reajustes, mas foi derrotado em plenário.

Agora, o Ministério do Planejamen­to entregou a Temer uma nova proposta para suspender reajustes.

Segundo a pasta, a potencial economia de R$ 6,9 bilhões com a medida em 2019 será revertida em investimen­tos em educação e programas sociais.

“É importante frisar que o Orçamento de 2019 está sendo construído em um cenário de forte restrição fiscal da economia brasileira”, ressaltou o ministério.

A Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) informou que não vai se manifestar porque, segundo a entidade, o reajuste ainda vai ser discutido pelo Congresso e não existe na prática.

“A gente não pode ter um Poder que não leve em consideraç­ão a situação em que o país se encontra José Ronaldo de Castro Souza Júnior diretor do Ipea

O governo vai ter de cortar em outro lugar, possivelme­nte em despesas sociais, saúde ou educação Sergio Luiz de Moraes Pinto professor da FGV Eaesp

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