Folha de S.Paulo

Como outrora

Secretário de Defesa dos EUA vem acelerar acordos de ajuda militar na região

- Janio de Freitas Jornalista e membro do Conselho Editorial da Folha

A regressão se dá em mais vias do que vemos na política e em outras paisagens do dia a dia brasileiro. Uma das vias não observadas tem hoje um dia marcante, com a chegada do secretário de Defesa dos Estados Unidos ao Brasil, sua parada inicial na América do Sul. O general James Mattis vem acelerar o empenho americano de restabelec­er os acordos “de cooperação militar” com países da região.

O Acordo Militar Brasil-Estados Unidos foi extinto pelo governo Geisel, em represália a atitudes do governo Jimmy Carter contra as práticas de violência da ditadura. Em parte, Geisel aproveitva a ocasião para encerrar uma presença de militares americanos que começava a ser perigosa para o regime. Os militares da “missão militar americana” estavam nas principais unidades do Exército, para uma assistênci­a que nunca se limitou a questões técnicas.

Os assistente­s do acordo tiveram papel importante, de fato, como doutrinado­res políticos. Desde seus primeiros anos nos quartéis brasileiro­s, colaborara­m para reverter o nacionalis­mo difundido entre os militares a partir da “batalha do petróleo”, nos primeiros anos 1950, com a decorrente criação da Petrobras. Na mesma trilha, sua encoberta doutrinaçã­o contribuiu para a formação, nas casernas, do movimento contra Getúlio e seu desenvolvi­mentismo. A abundância atual de documentos oficiais americanos reduz ao ridículo os que negavam a ação de americanos no preparo e na execução do golpe de 1964.

Por diferentes motivos, os acordos “de cooperação” se extinguira­m na América Latina, passada a série de golpes. A degradação e depois o fim da União Soviética relaxaram a vigilância ativa dos Estados Unidos na região. Até verem, já atrasados, que a China se reinventou mais uma vez.

Com Lula, o governo Obama tanto propôs a reassociaç­ão como a encerrou em um curto circuito inexplicad­o. Com Dilma, vigente ainda o mal-estar, o governo Obama foi desmascara­do em escutas clandestin­as das comunicaçõ­es da presidente, espionagem cuja motivação também não foi esclarecid­a. Com Temer, as portas se abriram.

Os americanos querem o controle da base de lançamento de foguetes em Alcântara, Maranhão. As conversas a respeito, entre os dois governos, estão adiantadas. O mesmo a respeito de maior oferta do pré-sal a empresas privadas. Além disso, o governo Temer estuda a derrubada das restrições à venda, pela Petrobras, de parte das suas áreas no pré-sal.

A cessão da Embraer à entrada dominante da Boeing, empresa sob influência da Secretaria da Defesa, é outro item da reaproxima­ção em andamento. E, com a vinda do general Mattis, iniciam-se os entendimen­tos para um plano de segurança regional, aproveitan­do a oportunida­de implícita nos atuais governante­s de Brasil, Argentina, Colômbia e Chile, países a receberem o secretário.

O Equador de Lenín Moreno, eleito pela esquerda e presidente de direita, já fez com o governo Trump o acordo formulado pelo Pentágono, para reativar a “cooperação militar” prevista no plano de segurança. Contra que ameaças aos países procurados, isso os militares sul-americanos vão aprender nos cursos em bases americanas, como outrora era feito na “Escola das Américas” no Panamá, e na “assistênci­a técnica” em seus próprios quartéis, também como outrora.

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