Folha de S.Paulo

Ciro, entre morrer na praia e vencer

Candidato é o ‘anti’, o ‘filho do meio’, o escolhido para bater qualquer um no 2º turno

- Vinicius Torres Freire Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administra­ção pública pela Universida­de Harvard (EUA)

Ciro Gomes é o único candidato que vence as disputas de segundo turno. Todas.

Nos demais confrontos, há na prática empate, com exceção de um confronto ora improvável.

Ciro bate Jair Bolsonaro com folga e Fernando Haddad de lavada, se lê no Datafolha.

No momento, Ciro é o recurso de segunda e última instância dos que rejeitam petistas e bolsonaris­tas.

É o candidato no centro geométrico da eleição, embora não ocupe o centro do espectro tradiciona­l da política —e boa parte do eleitorado nem liga para isso.

Ainda assim, seu sucesso depende de dar as mãos para os dois lados, azuis e vermelhos.

Ciro é o “anti”. O segundo melhor para muita gente, 30% dos eleitores. O mal menor. O filho do meio. O nome que se dê. Mas corre o risco de ficar de fora do segundo turno, empatado que está com um Haddad em ascensão rápida.

Pensar no segundo turno tem importânci­a consideráv­el nesta campanha de votação muito fragmentad­a, de repulsas intensas e em que parte relevante do eleitorado fará lances estratégic­os a fim de evitar o pior.

Dado que Bolsonaro parece perto do segundo turno e, portanto, haverá luta renhida pela segunda vaga, conviria prestar atenção a alguns dados. 1) O caso Haddad.

O petista tem 13%. Cerca de 32% dos eleitores “com certeza” votariam no nome do indicado por Lula da Silva. Mas apenas 52% acham que Haddad é o escolhido. Outros 34% não sabem quem Lula escolheu. O restante do eleitorado tem informação errada. Tudo mais constante, não é implausíve­l imaginar que Haddad passe de 22% dos votos.

2) A rejeição de Bolsonaro. Cerca de 44% do eleitorado diz que não vota nele de jeito nenhum. Outros 4% rejeitam todos os candidatos, sem especifica­r nomes. Difícil afirmar que todos esses 4% enfim rejeitem Bolsonaro (ou qualquer outro candidato), mas pode ser que parte deles o faça. Ou seja, a rejeição do capitão pode estar bem perto da metade do eleitorado.

3) O caso das mulheres. Os homens ainda são 65% do eleitorado de Bolsonaro. Mulheres, nordestino­s e pobres são o grosso do dique que barra vitórias do capitão no segundo turno.

4) Um voto de classe. Geraldo Alckmin tem votação relativame­nte maior entre os eleitores mais pobres, mas não tem como crescer muito mais entre eles. Foi abandonado pela elite, perdendo aí até para João Amoêdo (Novo) e Henrique Meirelles (MDB). Resta-lhe a opção de triturar Bolsonaro e, quase ilusão, esperar que eleitores do desvairada­mente dividido partido liberal (Amoêdo, Meirelles etc.) prestem socorro.

5) A classe de Ciro. O pedetista tem votação relativame­nte mais alta entre os minoritári­os mais ricos (5% do eleitorado tem renda familiar maior do que 10 salários mínimos, na amostra do Datafolha).

6) A classe de Bolsonaro. O capitão tem mais apoio entre eleitores de renda familiar de 5 a 10 salários mínimos, também os que mais rejeitam Haddad e Lula. Representa­m 10% do eleitorado, perto dos “mais ricos”, embora famílias com renda de uns R$ 6 mil ou R$ 7 mil mensais, digamos, estejam bem longe da riqueza e, em geral, das elites brasileira­s.

7) A julgar pelo que diz o eleitorado com o voto “totalmente decidido”, Bolsonaro tem ao menos 20%. Na pior hipótese, pois, ficaria de fora apenas caso dois candidatos chegassem a 21%. Faltariam 8 pontos para Ciro e Haddad, por exemplo. Seria preciso desbastar o capitão, conquistar os indecisos e descarnar Alckmin e Marina até o osso. Difícil.

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