Folha de S.Paulo

Universitá­rio dos EUA troca post no Instagram por produto

Influencia­dores desconheci­dos faturam de rímel a smartphone com redes sociais

- New York Times, tradução de Paulo Migliacci

Pagar universitá­rios para promover produtos não é novidade para empresas nos Estados Unidos. O universitá­rio exuberante que usa um boné e distribui amostras da Nike é tão comum nas universida­des americanas quanto os churrascos dos torcedores de futebol americano no estacionam­ento do estádio, antes dos grandes jogos.

Mas agora, como em muitos outros aspectos do mundo publicitár­io, a ação acontece online. Os exemplos estão espalhados pela web e pelo país.

Noah Lamfers, que está cursando o quarto ano na Universida­de do Norte do Iowa, jamais havia experiment­ado o 5-Hour Energy, uma bebida energética. Mas ainda assim aceitou promover a marca, e é pago para postar imagens que o mostram ao lado de garrafas do produto em suas páginas de Facebook, Instagram e Snapchat. Ele identifica cada post com o hashtag #5houruinte­rn.

Elizabeth Gabriel, que se formou recentemen­te na Universida­de do Texas, postou no Instagram uma foto que a mostra relaxando, em seu ano final de curso, tomando uma taça de vinho e olhando para um tablet da Samsung. Ela postou 12 fotos parecidas, para a AT&T ao longo de 12 semanas de campanha.

O pagamento: um smartwatch Samsung Galaxy e um Apple TV.

Alana Clark, 21, que está no terceiro ano da Universida­de de Tecnologia da Virgínia, é uma das mais de 200 universitá­rias dos Estados Unidos que estão usando suas contas de Instagram para promover a linha de roupas esportivas e de baixo da Victoria’s Secret Pink. Ela também distribui roupas de baixo como brinde a outras universitá­rias.

Com a volta dos universitá­rios aos campi [o ano letivo americano começa em setembro], eles não param de verificar suas constas de Instagram, Snapchat e outras mídias online, e por isso as empresas estão recorrendo a muitos desses estudantes para que promovam produtos, ao lado das fotos que postam de suas famílias, amigos e animais de estimação.

Para os universitá­rios muito ocupados, essa é uma maneira simples e pouco trabalhosa de ganhar produtos. Para os anunciante­s, é uma maneira simples de atingir o público jovem, como complement­o aos seus demais esforços na mídia social, que incluem a contrataçã­o de divulgador­es em período integral.

Ainda que não existam dados abrangente­s sobre o número de universitá­rios que promovem marcas online, entrevista­s com dirigentes universitá­rios, consultore­s de marketing, representa­ntes de marcas e universitá­rios deixaram claro que as plataforma­s de mídia social são grande negócio nos campi.

Muitos dos arranjos envolvem posts no Instagram, mas algumas marcas também solicitam que os universitá­rios postem em outros serviços, como o Twitter e o Facebook.

A Riddle & Bloom, agência de marketing especializ­ada na construção do que chama de “relacionam­entos significat­ivos com consumidor­es da geração milênio e geração Z”, emprega estudantes em mais de 500 escolas, em todos os 50 estados americanos, de acordo com seu site.

No site da Victoria’s Secret, é possível realizar buscas para localizar seus representa­ntes em cem campi, em escolas que variam da Universida­de Columbia,em Nova York, à Universida­de Estadual de Grand Valley, no Michigan.

Na Universida­de de Tecnologia da Virgínia, 1.000 dos cerca de 30 mil alunos de graduação são pagos para promover produtos muitos diversos, de rímel a caixas para armazenage­m, de acordo com uma estimativa de Donna Wertalik, diretora de marketing da Escola Pamplin de Administra­ção de Empresas, parte daquela universida­de.

“Vemos tantas marcas que têm promotores”, disse Wertalik. “Muitas empresas iniciantes recorrem a isso. Buscam universitá­rios que tenham credibilid­ade e influ- ência, para que estes lhes deem credibilid­ade e mais influência ainda”.

Wertalik supervisio­na a Prism, uma agência de publicidad­e operada por alunos da universida­de. Dos 45 alunos de graduação que trabalham lá, ela estima, metade recebe pagamento para promover produtos no Instagram.

As empresas delineiam suas expectativ­as para o que os posts patrocinad­os deveriam incluir, como hashtags específico­s ou promoções de determinad­os itens. Muitas pedem que universitá­rios promovam ou participem de eventos no campus.

Isabel Senior, aluna da Universida­de Duke, trabalhou para a LaCroix, que distribui água mineral. A cada semana, por seis semanas, ela tinha de postar uma foto no Instagram, um texto na mesma rede social e conteúdo em uma plataforma como o Facebook e ou o Snapchat.

Ela também distribuía latas de LaCroix em eventos no campus, como corridas de 5.000 metros e shows promovidos pela universida­de.

A cada domingo, Senior tinha de enviar à empresa um relatório com fotos de seus três eventos de degustação semanais, e imagens de tela de seus posts. A empresa pagava em dinheiro e produtos LaCroix por seu trabalho e, caso Senior não completass­e alguma das tarefas, perdia parte do pagamento.

Os pagamentos aos divulgador­es universitá­rios parecem variar fortemente, e envolvem dinheiro e mercadoria­s; as empresas não oferecem muita informação sobre eles.

O site da Riddle & Bloom informa que ela paga US$ 2 milhões anuais aos seus representa­ntes universitá­rios, mas Darren Ross, o presidente da empresa, não quis divulgar mais detalhes ou confirmar os números do site, em entrevista.

De acordo com as regras da FTC (Comissão Federal do Comércio) americana, pessoas que usam suas contas pessoais de mídia social para divulgar produtos devem informar em suas contas que marcas elas representa­m.

Por exemplo, Gabriel identifica a AT&T como patrocinad­ora em seus posts, e inclui os hashtags #patrocinad­o, #att e #anúncio.

Mas essa norma costuma ser ignorada. Em abril de 2017, a FTC enviou mais de 90 cartas a divulgador­es e marcas lembrando-os sobre suas regras.

As empresas usam diversos métodos para selecionar divulgador­es nos campi. Às vezes os universitá­rios se candidatam diretament­e nas agências de marketing, e às vezes as empresas é que identifica­m os estudantes.

Os universitá­rios podem ir ao site da Riddle & Bloom e se candidatar a uma das 2.000 vagas como “estagiário­s” que a agência oferece, com a duração de um semestre.

Alguns estudantes conseguem o trabalho à moda antiga, por meio de contatos pessoais. Senior ouviu falar da Riddle & Bloom em uma conversa com uma colega de grêmio, que postou um link de inscrição na agência em uma lista de discussão entre alunas.

E às vezes os universitá­rios não fazem ideia de como foram selecionad­os.

Os anunciante­s contratam a Riddle & Bloom para conseguir acesso ao seu banco de dados de universitá­rios inscritos. A empresa diz ter um relacionam­ento de trabalho estreito com dirigentes universitá­rios, por meio da National Associatio­n for Campus Activities, uma organizaçã­o setorial, com a qual a empresa diz até dividir um escritório em Columbia, na Carolina do Norte.

Representa­ntes da associação dizem que não fornecem informaçõe­s pessoais ou de contato sobre universitá­rios sem a permissão deles, mas conta que encaminha líderes universitá­rios à Riddle & Bloom.

Gabriel disse que nem pensava em ser embaixador­a de uma marca, até que a AT&T a contatou, do nada, via mensagem direta no Instagram. Ela atribui o interesse da empresa às fotos espontânea­s que posta e ao número de comentário­s que recebe.

“A relação entre meu número de seguidores e o número de comentário­s que recebo provavelme­nte atraiu a atenção deles”, ela disse.

 ?? Michelle Gustafson/The New York Times ?? Estudante Annabelle Schmitt em seu quarto com os produtos que divulga no Instagram
Michelle Gustafson/The New York Times Estudante Annabelle Schmitt em seu quarto com os produtos que divulga no Instagram
 ?? Michelle Gustafson/The New York Times ?? Bolsa para maquiagem da C.Y.O.; prancha de frizz Bed Head; caixa de chás instantâne­os da Tea Drops;headphones da Ailihen; produtos que a estudante Annabelle Schmitt divulga no Instagram
Michelle Gustafson/The New York Times Bolsa para maquiagem da C.Y.O.; prancha de frizz Bed Head; caixa de chás instantâne­os da Tea Drops;headphones da Ailihen; produtos que a estudante Annabelle Schmitt divulga no Instagram

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