Folha de S.Paulo

De teatro a ministério, Brasília tem ‘cemitério’ de prédios públicos vazios

Motivos vão de custo a opção de gestor; centro bilionário inaugurado em 2014 está desocupado

- Rubens Valente

Um centro administra­tivo com 14 prédios em 182 mil metros quadrados de área construída, o teatro de maior importânci­a histórica para a cidade, projetado por Oscar Niemeyer (1907-2012), e um prédio de 26 andares ocupado apenas por uma agência bancária. Um bloco inteiro da Esplanada dos Ministério­s, no coração do governo federal em Brasília.

São prédios e obras vazios ou subutiliza­dos a poucos quilômetro­s do Palácio do Planalto. Os motivos variam de contenção de gastos a escolhas controvers­as dos gestores.

“O teatro [Claudio Santoro] é um escândalo, está praticamen­te em ruínas há anos. É um equipament­o único, emblemátic­o. Não pode ser privatizad­o porque é crucial que o governo tenha uma estrutura para oferecer ao público o que o mercado não quer oferecer”, diz o professor Frederico de Holanda, doutor em arquitetur­a e urbanismo na UnB (Universida­de de Brasília).

Construído a partir de 1960 e inaugurado em 1981, o Teatro Nacional Claudio Santoro tem suas três salas, com capacidade de 1.900 espectador­es, interditad­as desde janeiro de 2014. O Corpo de Bombeiros e o Ministério Público apontaram falhas de segurança e acessibili­dade.

É o teatro mais importante da capital. Com sua forma que lembra uma pirâmide, marca o início da fileira norte de blocos ministeria­is da Esplanada.

Após reparos que custaram R$ 41,5 mil, em dezembro, o Governo do Distrito Federal abriu aos turistas só o foyer de uma das salas e elaborou um plano de recuperaçã­o em cinco etapas. Só a primeira custará R$ 38 milhões, dinheiro que começou a ser captado.

A poucos quilômetro­s dali também está abandonado o bloco O da Esplanada desde dezembro de 2015, quando a Defesa o desocupou e o repassou para o Planejamen­to.

A União gasta mensalment­e cerca de R$ 48,5 mil com vigilância e energia do esqueleto de nove pavimentos. Segundo a assessoria do Planejamen­to, o prédio será repassado ao vizinho Ministério da Fazenda, “que o ocupará e se incumbirá de sua recuperaçã­o”.

O bloco vazio na área mais simbólica de Brasília, a apenas 1,6 km do Palácio do Planalto, é cena surpreende­nte numa cidade em que os órgãos públicos têm se mudado, cada vez mais, para novos prédios construído­s pela iniciativa privada e alugados a peso de ouro para a União.

O professor Antônio Carlos Cabral Carpintero, doutor em arquitetur­a e urbanismo da UnB, considera a prática absurda. “Nos anos 1950, o governo federal desapropri­ou o Distrito Federal. Construiu Brasília. Depois deu ou vendeu terrenos para terceiros, e agora eles constroem nesses terrenos para o próprio governo alugar?”, diz.

O professor insere os prédios vazios num cenário de abandono da ideia de Estado. “Tudo o que lembra o Brasil está sendo renegado”, afirma.

Para Holanda, o governo deveria estimular a modernizaç­ão dos prédios que a administra­ção considera hoje inadequado­s para sua função original. Caso não possam servir ao serviço público, que sejam direcionad­os para moradias.

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Pedro Ladeira/Folhapress Bloco O da Esplanada dos Ministério­s está vazio desde 2015; União gasta por mês cerca de R$ 48,5 mil com vigilância e energia do edifício

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