Folha de S.Paulo

Festival leva músicos e bailarinos imigrantes ao centro

Festival leva ao Palacete Tereza Lara aulas e festas com paulistano­s e imigrantes que adotaram a metrópole

- Iara Biderman texto Eduardo Knapp fotos Aline Prado produção

O egípcio Hamada Nayel está aprendendo português e fala bem inglês. Às vezes, usa o árabe e pergunta a melhor tradução de alguma palavra para Mohammad Al Jamal, nascido no Líbano. O primeiro chegou aqui há alguns meses e o segundo, três anos atrás.

Os dois bailarinos precisam combinar com outros artistas do Oriente Médio, da África, da América de língua espanhola e do Brasil detalhes da programaçã­o do 2º Festival Na Dança!, que acontece de sexta (21) a domingo (23).

Serão três dias de aulas e festas conduzidas por bailarinos e músicos que chegaram a São Paulo nos recentes fluxos migratório­s ou que são descendent­es dos imigrantes que formam o caldo populacion­al da cidade: espanhóis, japoneses, europeus do leste, latino-americanos, árabes e africanos.

Eles estarão reunidos no Palacete Tereza Toledo Lara, casarão no centro da capital tombado pelo patrimônio histórico e reformado para abrigar eventos de música e dança.

Subindo pelo elevador com porta pantográfi­ca ou pelas escadas em caracol com corrimãos de época —o palacete é de 1910—, chega-se ao salão com piso de madeira e vista para a rua José Bonifácio.

Ali, em meio à confusão de línguas —árabe, inglês, francês, português, portunhol—, circulam músicos do Togo ou do Congo com roupas típicas e pinturas tribais no rosto, dançarinos árabes de turbante, japoneses de quimono,umabailari­nacolombia­nacomsaia típica de festa, um senegalês de dreadlocks com sua túnica bordada e um angolano vestido de canga com estampa étnica.

A professora e pesquisado­ra de danças Betty Gervitz, idealizado­ra do festival, tenta dar ordem ao caos e marcar ensaios para as duas festas da programaçã­o. Nas aulas, cada artista vai apresentar e ensinar individual­mente as danças de seu país de origem.

Já as festas são criação coletiva, uma “jam” de corpos e ritmos para “performers” e público entrarem no baile. Tudo com música ao vivo. Experiment­ar, no próprio corpo, a diversidad­e cultural de São Paulo é o objetivo do evento —as atividades foram preparadas para serem acompanhad­as por qualquer pessoa, não apenas por profission­ais.

“Gosto da troca. Nesse encontro com danças de muitos países, aprendo coisas que não conhecia e descubro pontos em comum. Resgatei aspectos de minha ancestrali­dade que nem imaginava existirem”, explica o angolano Ermi Panzo, 28, dançarino, músico e poeta.

Pesquisar e ensinar danças de diferentes partes do mundo é o trabalho de Betty Gervitz há mais de 30 anos. Nesse percurso, ela viajou muito, conheceu professore­s e trouxe vários deles para dar oficinas em São Paulo. Mais: trocou, em 2017, a dificuldad­e de bancar um evento internacio­nal pela oportunida­de de abrir espaço para artistas imigrantes se inserirem no circuito cultural paulistano.

Surgiu o primeiro Na Dança!. Junto com o músico Gabriel Levy, coordenado­r musical do festival, ela foi atrás desses artistas e realizou, sem patrocínio, o evento multicultu­ral dançante no palacete do centro da capital.

O libanês Mohammad Al Jamal, 28, dirigia um grupo de dança e música em seu país. Com a deterioraç­ão da situação econômica por causa da guerra nos países vizinhos, não conseguiu sobreviver de seu trabalho.

Chegou a São Paulo e montou um grupo de folclore árabe com artistas libaneses, sírios e palestinos. “Não está fácil, a concorrênc­ia é grande”, diz ele. Aos poucos, amplia a rede de contatos e os convites para se apresentar em shows, casamentos ou dar aulas.

Nesteano,oprojetofo­iampliadop­araoque os organizado­res chamam de plataforma Na Dança!, espaço cooperativ­o que estimula encontros e trocas entre artistas ainda pouco conhecidos por aqui e seus pares já estabeleci­dos. A ideia é gerar oportunida­des de inserção cultural e caminhos para imigrantes trabalhare­m em suas áreas de formação, além de oferecerem algo para a cidade.

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A espanhola Isabely Departe, com roupa típica da Galícia, no palacete
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O libanês Mohammad Al Jamal e a filha de libaneses Fadua Chuffi dançam; na pág. ao lado, o bailarino egípcio Hamada Nayel

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