Folha de S.Paulo

Medidas recentes que beneficiam consumidor­es opõem debatedore­s

- Leonardo Neiva

Objetos de alterações em tempos recentes, questões como a coparticip­ação do cliente, o ressarcime­nto ao SUS e a portabilid­ade de planos de saúde esquentara­m os debates do 2º fórum Saúde Suplementa­r, suscitando pontos de vista opostos.

A coparticip­ação entrou na berlinda em julho, quando a então presidente do STF, Cármen Lúcia, suspendeu resolução da Agência Nacional de Saúde Suplementa­r que permitia aos planos cobrar do cliente até 40% do valor de consultas e exames realizados.

A ANS também tentou introduzir a modalidade de franquia, na qual o cliente tem direito a alguns procedimen­tos básicos, mas precisa pagar do próprio bolso caso ultrapasse­m o previsto no contrato.

O revés no Supremo levou a ANS a desistir das medidas, mas o problema de fundo continua na mesa —como combater o uso excessivo de exames e procedimen­tos médicos, que gera desperdíci­o e sobrecarre­ga os custos.

Segundo debatedore­s favoráveis à proposta da ANS, a coparticip­ação foi pensada para moderar esse excesso, despertand­o a consciênci­a do consumidor.

“O usuário precisa acordar e perceber que o sistema de saúde privada é nosso. Quanto mais a gente gasta, mais a conta vai sair cara”, afirmou Felipe Rossi, diretor da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde).

Rossi aponta o desperdíci­o como uma das causas dos altos reajustes dos planos.

O problema, dizem os que são contrários, é que o percentual estabeleci­do pelo plano pode acabar barrando o acesso do cliente a esses direitos.

“Se você tem coparticip­ação em níveis muito elevados, está compartilh­ando um risco a ponto de não fazer sentido contratar um plano de saúde”, argumentou Ana Carolina Navarrete, pesquisado­ra de saúde do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor).

Outro ponto levantado por ela é que não cabe ao consumidor a responsabi­lidade pela gestão dos custos dos planos de saúde, já que quem faz os pedidos são os médicos.

Mas Salomão Rodrigues, psiquiatra e coordenado­r da Comissão Nacional de Saúde Suplementa­r do CFM, rejeitou a carapuça.

“Se houvesse um prontuário eletrônico para acessar o histórico do paciente, o médico não pediria tantos exames. As operadoras não fornecem essas informaçõe­s.”

Outro ponto que gerou discussão foi a decisão do STF, em fevereiro, de reconhecer a necessidad­e de os planos ressarcire­m o SUS quando seus beneficiár­ios forem atendidos pelo sistema público de saúde.

Para Rossi, o argumento contra a medida é o mesmo aplicado à coparticip­ação: os custos acabam caindo na conta dos beneficiár­ios.

Na visão de Walter Cintra Ferreira Jr., a cobrança seria, porém, uma forma de corrigir injustiças nos casos de operadoras que descumprem o acordado com os clientes.

“O sistema privado de saúde é beneficiad­o pela renúncia fiscal. Quando pago um plano, vou abater pelo menos uma parte no Imposto de Renda, dinheiro que deixa de ir para o governo financiar o sistema público”, argumentou o coordenado­r do MBA em gestão de saúde da Administra­ção de Empresas da FGV.

A decisão mais recente envolvendo a saúde suplementa­r foi a ampliação da portabilid­ade para beneficiár­ios de planos de saúde coletivos empresaria­is, definida na última terça-feira (4) pela ANS.

Com a mudança, eles passam a poder migrar para outras operadoras sem cumprir um período mínimo de carência no novo plano. Até então, apenas clientes de planos individuai­s ou familiares tinham essa possibilid­ade.

Ainda é necessário, no entanto, que o consumidor permaneça dois anos no plano de origem para pedir a portabilid­ade e pelo menos um ano nos próximos planos para migrar novamente.

Para Ana Carolina Navarrete, do Idec, a mudança é boa por favorecer a concorrênc­ia entre operadoras, o que sempre beneficia o consumidor.

Já para o representa­nte da associação dos planos de saúde, a decisão, que engloba a possibilid­ade de migrar de planos coletivos para individuai­s e vice-versa, encarece o sistema e aumenta os riscos financeiro­s.

“Entendo o lado do beneficiár­io doente que quer mudar de plano, mas a saúde não funciona como a telefonia. Do nada, a operadora passa a ter despesas muito altas sem ter recebido nenhum tostão”, afirmou Felipe Rossi.

Migração entre planos e limite à coparticip­ação em custos de exames encarecem planos e acabam caindo nas costas do usuário, afirmam operadoras

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