Folha de S.Paulo

Guerrilha quer mesmos benefícios das Farc, mas segue violenta na Colômbia

Governo apontou grupo armado ELN como responsáve­l por atentado que matou 21 em Bogotá

- Sylvia Colombo Daniel Muñoz/AFP

O governo colombiano apontou, nesta sexta-feira (18), o Exército de Libertação Nacional (ELN) como responsáve­l pelo ataque com um carro-bomba a uma escola militar localizada em Bogotá, com pelo menos 21 mortos e 70 feridos.

Embora a guerrilha ainda não tenha reivindica­do a autoria do ataque até a conclusão desta edição, as autoridade­s colombiana­s apresentar­am evidências de que o autor do atentado, José Aldemar Rojas, pertencia ao ELN havia pelo menos 25 anos.

Logo depois do anúncio, o responsáve­l por assuntos relacionad­os à paz na gestão do presidente Iván Duque, Miguel Ceballos, disse que o governo manterá sua posição de não voltar a sentar-se para negociar com o ELN.

“O presidente deixou claro que nenhuma negociação de paz poderia ser negociada sem a entrega total dos sequestrad­os e sem o fim dos atentados e das atividades de extorsão”, disse Ceballos.

Desde que o ex-presidente Juan Manuel Santos (20102018) começou, em fevereiro de 2017, a negociar com o ELN, a guerrilha cometeu mais de 400 atos de terrorismo e sequestrou outras nove pessoas —são agora 17 em seu poder.

Enquanto representa­ntes do governo e do ELN se reuniam em Quito, no Equador, sede dos diálogos, Santos afirmou diversas vezes que essas atividades criminosas deveriam parar. Obteve algum sucesso com um longo cessar-fogo, de setembro de 2017 a janeiro de 2018, mas logo a guerrilha retomou as atividades.

Segundo o ELN, o sequestro e a extorsão não podem ser abandonado­s enquanto não houver um acordo de paz porque, sem eles, não é possível financiar a guerrilha.

Nascido também nos anos 1960, como as Farc (Forças Armadas Revolucion­árias da Colômbia), o ELN tem hoje uma força menos volumosa —apenas 1.500 pessoas, enquanto as Farc tinham 7.000 na sua desmobiliz­ação.

Porém, o ELN muitas vezes se mostrou mais letal. Enquanto as Farc se voltaram para o narcotráfi­co e se desideolog­izaram nos últimos tempos, o ELN é mais convicto de suas reivindica­ções de origem —querem uma transforma­ção geral do país a partir da tomada do poder, com uma ampla reforma agrária.

Além disso, seus ataques são muito letais: atentados a bomba contra civis, oleodutos e estradas. E, se as Farc reduziram sequestros e atentados enquanto negociavam com o governo Santos, o ELN ainda aposta nesta via mais violenta, como ocorreu na última quinta-feira (17), em Bogotá.

Nas conversas em Quito, os representa­ntes do ELN disseram que queriam os mesmos benefícios entregues às exFarc, principalm­ente uma Justiça especial, que lhes daria penas alternativ­as e não a prisão.

O próprio Santos, ao final de seu mandato, porém, estava muito decepciona­do com a guerrilha, que seguia sequestran­do como antes. Achou melhor suspender as conversas até encontrar uma nova saída.

Quando Duque assumiu, disse que avaliaria o estado das negociaçõe­s. Sua resposta foi um contundent­e não. O que ele não parece ter analisado, como os funcionári­os de Santos vinham fazendo, é que há rachas internos no ELN. Se uma ala quer continuar com os ataques, outra ainda quer negociar.

O time de Santos tentava reestabele­cer a mesa em Havana, onde os ex-líderes das Farc se sentiram mais à vontade para colaborar. Duque, porém, mostrando um gesto de mão-dura, mandou parar tudo. E pode ter começado a pagar o preço nesta semana.

Outro fator a que Duque talvez não tenha posto suficiente atenção é que o ELN hoje é mais forte do que quando as Farc estavam na ativa, pois conta com a adesão de alguns dos cerca de 500 a 700 ex-guerrilhei­ros das Farc que rejeitaram o acordo de paz.

Além disso, o ELN tem se instalado, com a anuência de Nicolás Maduro, em território venezuelan­o. Ter a principal guerrilha colombiana acampada em seu território pode servir ao ditador da Venezuela como forte moeda de pressão contra Duque, de quem hoje é inimigo.

Assim, o ELN, que parecia condenado a largar as armas ou a sumir por seu tamanho reduzido, ganhou nova força. Quem paga, como sempre, são vítimas inocentes de seus atentados.

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Mulher acende vela em homenagem às vítimas de explosão de carro-bomba em Bogotá

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