Patinho FEIO
TÃO RARO quanto controvertido, o Tarpan nasceu com a ingrata missão de suceder o belo Bianco. MAS ACABOU MARCADO por suas LINHAS DESPROPORCIONAIS e pela vida curta no mercado
O Tarpan não é meu. Não tenho nada a ver com ele”, faz questão de afirmar
Toni Bianco sempre que perguntado sobre o assunto. Artista autodidata, o imigrante italiano já desfrutava de um renomado currículo como designer e construtor de carros de corrida quando decidiu criar sua própria marca de esportivos de rua.
Batizado como Bianco S, o modelo foi uma das principais atrações do Salão do Automóvel de São Paulo de 1976, sobretudo por suas linhas equilibradas e ousadas, derivadas do vitorioso protótipo Fúria de competição, que Toni havia criado alguns anos antes. Ainda hoje considerado um dos mais belos ensaios de design sobre rodas, o esportivo manteve a proeminente trajetória nos meses seguintes, com uma produção média de 25 unidades/mês. Mas nem mesmo a perspectiva de um horizonte bem sucedido segurou Toni Bianco na empreitada. Apenas um ano após o exitoso lançamento, desentendimentos com os sócios investidores fizeram o designer abandonar o projeto e a marca que levava seu nome.
E foi sem a presença do consagrado “carrozziere” que os novos controladores da Bianco Indústria e Comércio de Veículos Ltda – instalada num galpão na cidade de Diadema (Grande São Paulo) – aproveitaram o Salão do Automóvel de São Paulo de 1978 para apresentar não apenas o Bianco SII, com pequenas alterações visuais, mas também aquele que a marca definia como seu sucessor natural: o Tarpan (nome de uma raça de cavalo proveniente da Ásia ocidental).
DESIGN INFELIZ
Disponível nas versões cupê e conversível, o novo modelo causou burburinho semelhante ao de seu antecessor, porém por motivos opostos. Isso porque, embora seja até “fotogênico” em determinados ângulos, o Tarpan ainda hoje causa estranheza em quem o vê, sobretudo pelo design desengonçado, com linhas totalmente sem uniformidade. “Se o olharmos por partes, o carro é lindo. O problema é o conjunto da obra”, afirma o colecionador paulista Eduardo Lauand, 52 anos, proprietário do raro conversível 1981 abordado nesta reportagem. “Parece que a frente não conversa com a traseira, que não conversa com as laterais e por aí vai”, emenda.
Um dos problemas técnicos/estéticos do Tarpan está justamente nas avantajadas dimensões da carroceria, 55 centímetros mais comprida que a do antecessor Bianco S, num total de 4,35 metros. Como o projeto preservou a distância entre eixos original do chassi Volkswagen, de 2,40 metros, o resultado é uma completa falta de balanço na distribuição de peso, afetando diretamente a dirigibilidade. “O carro sofre com sérios problemas estruturais. Além disso, a adoção de pneus com tala de sete polegadas na
A carroceria é marcada pelas amplas tomadas de ar nas laterais e pelo uso de maçanetas de Fiat 147
Os atuais bancos Recaro e os instrumentos Cronomac não correspondem aos originais
dianteira e oito polegadas, na traseira, deixa o volante extremamente pesado. Tanto que já quebrei duas caixas de direção enquanto manobrava”, relata o proprietário, lembrando que o modelo foi lançado na época com pneus 205/70R13. Fã declarado de “carros esquisitos”, Eduardo localizou e comprou o inusitado exemplar há cerca de seis anos. “Depois disso levei outros quatro anos para concluir a restauração”, declara, sobre a dificuldade em encontrar peças e, principalmente, informações para o serviço.
Assim como o antecessor Bianco, o Tarpan também se destacava pelo refinado acabamento interno e externo, quesito no qual se sobressaía frente à concorrência. A começar pelos vidros e pelas lanternas fabricados com exclusividade com o nome da marca. Ou ainda o requintado interior da cabine, com desta
que para os revestimentos em couro e um completo arsenal de instrumentos disponibilizado no painel. “Vale destacar que os atuais instrumentos, da marca Cronomac, assim como os bancos Recaro, não correspondem aos originais de época”, aponta o proprietário, deixando claro que precisou “improvisar” em alguns detalhes da restauração.
É curioso também notar que os idealizadores do Tarpan, na tentativa de elaborar um projeto que diferenciasse o modelo do antecessor Bianco, tiveram clara inspiração nos esportivos da concorrente Puma. Fato que fica nítido não só em detalhes como o desenho do conjunto óptico dianteiro ou das lanternas repetidoras presentes nas laterais, mas também em pormenores como o nicho para acomodar fitas cassetes no console à frente da alavanca de câmbio.
POTÊNCIA LIMITADA
Do antigo Bianco, o Tarpan herdou o amplo para-brisa e o desenho dos para-lamas dianteiros, além das já citadas lanternas circulares na traseira e das maçanetas de Fiat 147 nas portas. Ao contrário de seu antecessor, entretanto, o novo esportivo exibe para-choques separados da carroceria, marcada por avantajadas tomadas de ar nas laterais. Outro dado curioso é a posição do tanque de combustível, instalado à frente do motor
(talvez numa tentativa de melhorar a distribuição de peso). Com isso, o estepe – que no Bianco ficava acomodado no compartimento traseiro, junto à mecânica – foi transferido para a dianteira. Embora tenha sido apresentado no salão com a mecânica 1,6-litro de arrefecimento a líquido e 80 cv original do VW Passat TS, o Tarpan chegou ao mercado em janeiro de 1979 com a mesma mecânica a ar de meros 54 cv proveniente do VW Brasilia, que já equipava o Bianco. Somente dois anos mais tarde a marca disponibilizou a versão mais “nervosa”, batizada de Tarpan TS. Mas isso foi pouco antes de a fábrica encerrar definitivamente suas atividades, o que coloca em dúvida até mesmo se alguma unidade com motor de Passat chegou a ser comercializada. Desconhecidos também são os números de produção do Tarpan, já que o fabricante (assim como outras marcas de veículos especiais) não era filiado à Anfavea. Mas estima-se que o total não tenha passado de algumas dezenas, sendo que a versão conversível chegou no máximo a 12 unidades.