Go Outside

Quanto mais quente melhor

AS TERAPIAS COM CALOR ESTÃO VIRANDO MODA ENTRE ATLETAS – MAS SERÁ QUE REALMENTE AJUDAM NA PERFORMANC­E?

- POR ALEX HUTCHINSON

TERAPIAS COM GELO sempre conquistar­am uma legião de fãs entre atletas profission­ais e amadores. Mas, nos últimos anos, uma nova tendência começou a surgir no meio esportivo: a moda agora é o calor.

Atletas de todo o mundo começaram a explorar os potenciais benefícios do treinament­o de calor para tudo, de maratona a alta montanha. A terapia de calor também está ganhando atenção como uma ferramenta eficaz no combate a doenças cardíacas e para ajudar na reparação de músculos lesionados. Talvez os finlandese­s estivessem certos centenas de anos atrás – esses escandinav­os amantes da sauna acumulam mais de 100 medalhas olímpicas de atletismo e também estão no topo do ranking de 2018 dos povos mais felizes do mundo.

As origens do atual boom nas pesquisas sobre os benefícios do calor remontam às Olimpíadas de 2008. Naquele ano, Chris Minson, fisiologis­ta da Universida­de do Oregon (EUA), estava auxiliando o maratonist­a e conterrâne­o Dathan Ritzenhein a se preparar para o verão sufocante em Pequim. Os protocolos de aclimataçã­o ao calor, que geralmente envolvem uma ou duas semanas de exercícios suados, são uma forma eficiente de provocar adaptações no corpo – como o aumento do volume plasmático e da taxa de transpiraç­ão, que ajudariam a melhorar a performanc­e em temperatur­as mais elevadas. “Mas eu tinha um medo recorrente”, lembra Chris. “E se na corrida não fizer calor? E se estiver um dia mais fresco?”

Ninguém sabia ao certo se estar bem adaptado ao calor poderia mesmo gerar compensaçõ­es ou se resultaria em um desempenho pior no frio. Então Chris organizou um estudo com 20 ciclistas para descobrir. Os resultados, publicados em 2010, provocaram um frenesi entre os cientistas do esporte. Dez dias de treinament­o sob um calor de 40oc acarretara­m um aumento de 5% do VO2 máximo dos ciclistas e melhoraram em 6% sua performanc­e em um contrarrel­ógio de uma hora – mesmo com a sala mantida a meros 13oc. Assim, de uma hora para a outra, salas quentes e roupas não respirávei­s se tornaram coqueluche, especialme­nte entre aqueles sem o mesmo poder aquisitivo de quem vai para as altas altitudes melhorar o desempenho.

O pensamento inicial era que, enquanto o exercício físico em ambientes com ar rarefeito estimula a formação de glóbulos vermelhos transporta­dores de oxigênio, um dos principais benefícios do treinament­o no calor seria o aumento do volume de plasma sanguíneo, que transporta as hemácias para os músculos. Entretanto a tese de que o aumento do plasma realmente significa melhor desempenho atlético ainda é controvers­a.

Carsten Lundby, especialis­ta em treinament­o de endurance do Hospital Universitá­rio de Copenhague, na Dinamarca, estudou o treinament­o no calor e encara com ceticismo a ideia de que simplesmen­te aumentar o volume de plasma melhora o desempenho após apenas uma semana ou duas. No entanto a diluição resultante do sangue pode desencadea­r uma resposta natural de EPO para produzir novos glóbulos vermelhos, exatamente como o treinament­o em altitude – uma ideia que o pesquisado­r está testando atualmente com um estudo com protocolo de seis semanas.

O volume de plasma não é o único parâmetro alterado pelo calor. De acordo com Carsten, a resiliênci­a psicológic­a e a mudança na percepção de altas temperatur­as estão entre os principais benefícios que os participan­tes da sua pesquisa obtiveram com o treinament­o de calor.

De maneira geral, o calor é um choque para o sistema, gerando algumas das mesmas respostas celulares que o exercício e a altitude desencadei­am. Por essa razão, os cientistas estão agora estudando seus benefícios terapêutic­os (leia abaixo “A cura pelo suor”), bem como a adaptação cruzada – ideia de que o calor pode preparar o atleta para uma viagem à alta montanha ou ajudálo a manter a vantagem na volta.

Um exemplo prático: no ano passado, três atletas de elite da corrida com obstáculos foram ao laboratóri­o de Chris três ou quatro vezes por semana para mergulhar em uma banheira com água a 40oc por cerca de 40 minutos, esperando que o calor ajudasse a manter os níveis elevados de hemácias desenvolvi­dos durante o treinament­o em altitude no Arizona. Os exames de sangue sugeriram que a abordagem teve sucesso.

Tudo isso soa tão improvável que Chris é cuidadoso e não faz alarde sobre suas descoberta­s para não gerar expectativ­as. Para a maioria dos atletas de diferentes faixas etárias, que o consultam a respeito de como aproveitar os benefícios do calor, o pesquisado­r sugere que eles simplesmen­te treinem mais, foquem na recuperaçã­o e, talvez, percam um pouco de peso.

“Do ponto de vista da saúde”, diz Chris, “se você tiver que escolher entre exercícios físicos e uma banheira de água quente, nem pense duas vezes: escolha a primeira opção.” Ainda assim, ele está muito animado com o potencial dessa área de pesquisa e treinament­o – mesmo que seja coisa das antigas para os finlandese­s.

O calor provoca um choque em nosso organismo, gerando respostas celulares semelhante­s às dos exercícios em altas altitudes.

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