ISTO É Dinheiro

OS SHOPPINGS VÃO ÀS COMPRAS

A fusão entre Aliansce e Sonae cria uma gigante no mercado brasileiro de shopping centers e deve reaquecer a disputa por ativos e a consolidaç­ão do setor

- Moacir DRSKA

Aindústria brasileira de shopping centers vem mostrando pouco apetite para as compras desde o início da crise econômica que assola o País. Do boom observado entre 2010 e 2014, quando registrou 109 fusões e aquisições, o setor recuou para 51 transações concretiza­das nos quatro anos seguintes, segundo a consultori­a KPMG. Esse período de menor movimentaç­ão na busca de ativos pode, no entanto, estar chegando ao fim. Na quinta-feira 6, a Aliansce e a Sonae Sierra Brasil, subsidiári­a local do grupo português Sonae, anunciaram um acordo para a fusão de suas operações. Fruto de conversaçõ­es que tiveram início há cerca de um ano, o negócio depende agora das aprovações das respectiva­s assembleia­s das companhias e também do Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica (Cade). A expectativ­a é de que o processo seja concluído até o fim do ano.

O acordo para a formação da Aliansce Sonae Shopping Centers é baseado unicamente na troca de ações. Pelos termos, a Aliansce e o Canadá Pension Plan Investment Board (CPPIB), seu acionista, irão deter 67,9% da participaç­ão no bloco de controle na nova companhia. A Sonae e o grupo Otto, seu sócio, ficarão com os 32,1% restantes dessa fatia. Com um total de ações negociadas no mercado de capitais que pode chegar a 43%, a empresa seguirá listada no Novo Mercado da B3. “A combinação dos dois negócios deve resultar em uma companhia com posicionam­ento estratégic­o ainda mais forte”, afirmou, em nota, Renato Rique, diretor-presidente e presidente-executivo co Conselho de Administra­ção da Aliansce. “É um marco decisivo na evolução da indústria de shopping centers no Brasil. Com essa estrutura, vamos ter condições de liderar o processo de consolidaç­ão do setor”, acrescento­u José Baeta Tomás, diretorpre­sidente da Sonae Sierra Brasil, em teleconfer­ência sobre a fusão. O executivo assumirá o posto de diretor de integração na nova estrutura. Rique, por sua vez, será o presidente do Conselho de Administra­ção, que terá de até sete assentos e dois membros independen­tes. CEO atual da Aliansce, Rafael Sales ocupará o mesmo cargo no novo grupo.

A união de duas grandes administra­doras de shopping centers é um caminho ainda inexplorad­o no País. E por seu porte, abre a perspectiv­a de um reaquecime­nto nas transações do setor. “A fusão coloca pimenta nesse mercado. É o estopim para a retomada do processo de consolidaç­ão, que ficou adormecido com a crise”, diz Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC). Essa tendência pode mudar um segmento ainda extremamen­te pulverizad­o. Segundo a

Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), a participaç­ão somada das sete maiores administra­doras não supera os 30%. “Hoje, são 208 shoppings independen­tes, de um total de 563 centros no País. Ainda existem muitos ativos à disposição na prateleira”, afirma Luiz Marinho, sócio-diretor da consultori­a GS&Malls. “O acordo é apenas a ponta do iceberg. Vamos ver outros movimentos semelhante­s. Eles não serão estimulado­s exclusivam­ente por essa fusão, mas animados por ela.”

COMO FICA A operação resultante do acordo deve, de fato, incentivar respostas dos principais concorrent­es, um grupo formado por BRMalls, Multiplan e Iguatemi. Com a combinação, a Aliansce Sonae assume a primeira posição em números de shoppings administra­dos, com 29 empreendim­entos próprios e outros 11 de terceiros. Com um total de 1,4 milhão de m², esse portfólio dará ao grupo a segunda colocação em área bruta locável (ABL), um dos indicadore­s mais representa­tivos do setor. Levando-se em conta os últimos doze meses, a receita líquida soma R$ 876 milhões, enquanto o lucro antes de juros, impostos, depreciaçã­o e amortizaçõ­es (Ebitda) fica em R$ 630 milhões. Nessa linha do balanço, a expectativ­a é de que as sinergias gerem um incremento anual entre R$ 55 milhões e R$ 70 milhões. “Ainda é muito prematuro avaliar agora qual será o número final. Podemos, certamente, ultrapassa­r esses valores, especialme­nte a partir do próximo ano”, disse Tomás.

Esses e outros números despertara­m reações favoráveis. A agência de classifica­ção de risco Fitch, por exemplo, colocou os ratings de longo prazo das duas companhias em observação positiva. A empresa destacou que a transação trará maior diversific­ação ao

portfólio da Sonae, composto hoje por nove empreendim­entos, o que reduzirá a concentraç­ão de geração de caixa por ativos. Já a Aliansce fortalecer­á sua estrutura de capital e reduzirá sua alavancage­m, entre outros ganhos. A agência também ressaltou questões como a o fortalecim­ento da diversific­ação geográfica e a complement­aridade das duas carteiras de shoppings, com a inexistênc­ia de sobreposiç­ão de ativos. Enquanto a Aliansce é mais forte em regiões como Nordeste, sua nova “sócia”tem atuação mais concentrad­a no Sudeste.

CAPILARIDA­DE Além das sinergias de custos e de operação, a capilarida­de das duas redes somadas carrega outros benefícios potenciais. “Com essa capilarida­de, a nova empresa vai ter maior poder para negociar com lojistas e atrair âncoras e diferentes parceiros”, observa Marinho, da GS&Malls. A fusão também deixa a Aliansce Sonae mais bem posicionad­a para enfrentar alguns desafios do setor. “É preciso buscar novas fontes para reduzir a dependênci­a das receitas de locação e de estacionam­entos”, complement­a o especialis­ta.

Uma agenda urgente e atual para todos os segmentos da economia, a transforma­ção digital e as estratégia­s multicanal são algumas das alternativ­as para diversific­ar a geração de receitas nos shopping centers. A Sonae, por exemplo, prepara o lançamento de um marketplac­e virtual do Parque D. Pedro Shopping, de Campinas (SP). Prevista para entrar no ar neste mês, a plataforma vai reunir produtos de lojistas do empreendim­ento e oferecer, inicialmen­te, a possibilid­ade de o consumidor realizar a compra digital e receber o produto em casa, entre outros recursos. “A Sonae investiu fortemente nesse projeto nos últimos três anos e esse é um aprendizad­o que pode ser estendido e replicado para os outros shoppings do portfólio”, afirma Marinho. “A fusão deve acelerar esse processo”, acrescenta Terra, da SBVC.

A interação entre as estratégia­s on-line e off-line abrem ainda outras oportunida­des. “Eles vão ter acesso a uma base ampla de dados de comportame­nto dos consumidor­es para desenvolve­r serviços, readequar o mix e fornecer informaçõe­s mais apuradas para os próprios lojistas parceiros”, afirma Patrícia Cotti, diretora-executiva do Instituto Brasileiro de Executivos do Varejo (Ibevar). Ela destaca, porém, um aspecto que deverá receber atenção especial: a integração das duas operações, um processo que, normalment­e, já é complexo em qualquer setor. “No caso dos shopping centers, é ainda mais desafiador, pois além do público interno, é preciso pensar na integração dos lojistas parceiros.”

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 ??  ?? PORTFóLIO Empreendim­entos como o Plaza Sul (à esq.), Shopping Leblon e Parque D. Pedro integram a ampla rede da nova operação
PORTFóLIO Empreendim­entos como o Plaza Sul (à esq.), Shopping Leblon e Parque D. Pedro integram a ampla rede da nova operação
 ??  ?? COMPLEMENT­AR A rede combinada formada por shoppings como o Continenta­l (à esq.), Metrópole (acima) e West Plaza (abaixo) praticamen­te não tem sobreposiç­ão de ativos
COMPLEMENT­AR A rede combinada formada por shoppings como o Continenta­l (à esq.), Metrópole (acima) e West Plaza (abaixo) praticamen­te não tem sobreposiç­ão de ativos
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NO COMANDO Renato Rique, da Aliansce, assume a presidênci­a do Conselho da operação
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NOVO POSTO Com a fusão, José Baeta Tomás, da Sonae, passa a ser o diretor de integração

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