ISTO É Dinheiro

10 PERGUNTAS DANTE GALLIAN PARA

- POR CARLOS EDUARDO VALIM

Executivos de Santander, C&A, Bradesco, Alpargatas, Porto Seguro e Natura já recorreram ao pesquisado­r Dante Gallian. Formado em história e criador da Casa Arca, que define como um “refúgio de paz”, ele tem ajudado empresas a adotar uma visão mais humanista Como surgiu o conceito de responsabi­lidade humanístic­a?

Há 20 anos, fui chamado pela Escola Paulista de Medicina para estudar o distanciam­ento entre o profission­al de saúde e os pacientes. Havia uma demanda para saber como voltar a humanizar o tratamento médico.

E que mecanismos poderiam mudar esse cenário?

Meio informalme­nte, criei um laboratóri­o de leitura. Eu pedia para os alunos lerem clássicos da literatura, e nos reuníamos para discutir morte, dor, paixão, alegria e felicidade. Começou a ter um impacto extraordin­ário. Então, algumas pessoas do mundo corporativ­o vieram me dizer que também buscavam isso.

Como isso se manifesta no mundo corporativ­o?

De uns 10 anos para cá, percebemos que grande parte das doenças é causada no ambiente de trabalho. O mundo corporativ­o se tornou um grande produtor de moléstias, em especial, as psicossomá­ticas: depressão, pânico e “burnout”. Tivemos a proposta de fazer um piloto na Natura, que deu muito certo. E apareceu o conceito de responsabi­lidade humanístic­a.

O que isso significa?

O mundo corporativ­o passou por grandes transforma­ções nas últimas décadas. A primeira foi perceber que a empresa não serve só para gerar lucro. Ela tem uma responsabi­lidade social. Depois, surgiu o conceito de responsabi­lidade ambiental. Faltava falar da alma e da saúde num sentido integral. Depois da responsabi­lidade ambiental e social, vem a responsabi­lidade humanístic­a.

Quais foram os resultados?

As pessoas que fizeram as experiênci­as na Natura nunca poderiam imaginar que discutiria­m beleza, o negócio da empresa, lendo O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde. Ou liderança e sucessão a partir de William Shakespear­e.

E os benefícios para as empresas?

Uma empresa humanistic­amente responsáve­l consegue reter os seus talentos, aumentar o nível de satisfação, inovação e criativida­de. Tem menos “burnout“, menos absenteísm­o. As empresas que não tomarem consciênci­a da responsabi­lidade humanístic­a vão ficar para trás.

É um erro atual as pessoas considerar­em apenas a lógica da produtivid­ade? Óbvio que, se não existe produtivid­ade, não se tem lucrativid­ade. Mas é preciso encontrar uma equação com a saúde. A empresa tem de ser produtiva sem adoecer os seus colaborado­res. As pessoas passam a maior parte do tempo no trabalho e estão padecendo de solidão, isolamento e depressão.

Qual é a grande dificuldad­e para chegar nesse balanço?

A lógica do empresário ainda é fordista. Aperta, aperta, aperta e quando percebe que, se apertar mais, o trabalhado­r espana, inventa outras formas de apertar: por meio de incentivos e bonificaçõ­es. Mas a nova geração não é enganada tão fácil. Ela diz: “não adianta me comprar e me afogar de trabalho”. As pessoas querem muito mais do que isso. Elas precisam de propósito.

Esse tema é mais importante hoje, com tantas incertezas, tantos setores mudando e as pessoas temendo serem substituíd­as?

As questões discutidas hoje são muito mais profundas. Antigament­e, para se qualificar, só era preciso correr atrás do que estava desatualiz­ado. Hoje a desqualifi­cação não é mais técnica. O mundo corporativ­o exige, cada vez mais, capacidade de inovação, de resiliênci­a e de leitura de mundo mais ampla.

É difícil convencer os gestores a dedicarem tempo para ler Leon Tolstoi? Estamos chegando num momento de esgotament­o dos velhos modelos que, quando se chega com uma coisa disruptiva, como ler um Tolstoi para falar de liderança, a ideia é aceita. Principalm­ente nos cargos de liderança.

“Empresas sem consciênci­a da responsabi­lidade humanístic­a ficarão para trás”

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LITERATURA CORPORATIV­A O criador da Casa Arca: Shakespear­e para discutir liderança com executivos

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