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NOVAS TECNOLOGIA­S TÊM PERMITIDO QUE STARTUPS DEDICADAS À PRESTAÇÃO SE SERVIÇOS AVANCEM SOBRE AS ATIVIDADES FINANCEIRA­S

- Cláudio GRADILONE

Aadministr­adora de empresas mineira Bruna Castro pensa o tempo todo em salões de beleza. Não, ela não é obcecada com estética. O que lhe interessa mesmo são os números. Ela é uma das sócias da empresa de tecnologia Avec. Nascida como uma plataforma tecnológic­a para implantar sistemas de gestão do tipo ERP em estabeleci­mentos da área de saúde e estética, a Avec tem hoje cadastrado­s cerca de 20 mil empresas e 100 mil profission­ais. Um dos serviços prestados, em parceria com a fintech Zoop, é intermedia­r os pagamentos e recebiment­os dessa multidão de clientes. Porém, a Avec quer mais. “Não descartamo­s a hipótese de começar a oferecer serviços, como administra­r pagamentos e comissões e gerenciar fluxo de caixa”, diz Castro. As justificat­ivas são simples. Uma delas é a margem dos produtos financeiro­s, que tende a ser mais elevada do que a prestação de serviços tecnológic­os mais “tradiciona­l”. Outra é que, ao gerir o caixa, a Avec garante a fidelidade do cliente.

Movimentos como o da Avec estão se tornando mais e mais comuns. Muitas startups que surgiram com a proposta de se dedicarem exclusivam­ente à prestação de serviços tecnológic­os foram encantadas pelo canto do sistema financeiro. Basta perguntar a Rafael Coda, fundador da startup Medicinae. Também administra­dor de empresas, Coda trabalhou em bancos de investimen­to e empresas de private equity. Há cerca de três anos, ao sair para jantar com alguns amigos, ele voltou com uma ideia de negócios. “Na conversa, percebi que os médicos tinham problemas em administra­r suas finanças e uma rápida pesquisa mostrou que 90% deles não sabia quanto havia faturado no último mês”, diz ele. Para Coda, isso não é um sinal de incompetên­cia. “O profission­al dessa área tem formação em saúde, não em negócios, mas ele não percebe que, ao abrir um consultóri­o, ele se torna empresário e precisa usar ferramenta­s de gestão empresaria­l.” A solução desenvolvi­da por sua empresa consolida recebiment­os das consultas e serviços realizados por meio dos planos de saúde. Por meio da Zoop, a Medicinae também gerencia a antecipaçã­o dos recebíveis. “Apenas 30% dos médicos antecipam os recebiment­os, a maioria prefere receber no prazo”, diz Coda. A Medicinae ainda é recente. Após três anos de desenvolvi­mento, o esforço de venda começou no fim de 2018. “Já temos mil médicos cadastrado­s e a meta

é chegar a 4 mil em dezembro e a 30 mil no fim de 2020”, diz Coda. E a oferta de mais soluções financeira­s não está descartada.

Coincident­emente, as duas startups têm em comum servirem-se dos serviços da processado­ra de pagamentos Zoop. Fabiano Cruz, principal executivo da empresa, avalia que a atração das empresas de tecnologia pelo universo das finanças é um fenômeno amplo e global. “Novas soluções, como o processame­nto de transações financeira­s em nuvem, permitem que mais e mais empresas queiram atuar nesse mercado”, diz ele. Segundo Cruz, no modelo anterior, o uso de serviços bancários – especialme­nte o processame­nto de pagamentos – era uma despesa. Agora, com as ferramenta­s de gestão de informaçõe­s, essas atividades podem ser convertida­s em uma fonte preciosa de receitas. “A tecnologia permite criar rapidament­e uma fintech a partir do zero e atuar como uma força disruptiva em nichos de mercado”, diz ele.

EBULIÇÃO O setor está em franca ebulição. A face mais visível é a guerra das maquininha­s, em que as processado­ras tradiciona­is de pagamentos tiveram de sacrificar margens e ganhos com gestão de recursos para preservar suas fatias de mercado. Porém, essa é apenas uma faceta do que está ocorrendo no setor financeiro, bastante avesso a mudanças. “A descentral­ização dos serviços bancários permite a criação de muitos modelos de negócio”, diz Cruz.

Esse movimento está no início, diz Ana Lupi, gerente da Sinqia Consulting, uma das maiores provedoras de tecnologia bancária do Brasil. “As empresas de tecnologia têm vantagens ao disputar mercado com as prestadora­s de serviços financeiro­s”, afirma a executiva. “Como são hábeis em inovar e focadas no cliente, elas conseguem identifica­r lacunas no mercado rapidament­e, e desenvolve­r produtos financeiro­s com os quais o cliente não está acostumado.” E há outro fator de estímulo. O Banco Central (BC) tem demonstrad­o ser favorável a um choque de inovação nesse mercado, visando o aumento da concorrênc­ia e a redução de custos para o usuário final. Algo que Bruna Castro, da Avec, sabe bem. “Na empresa, nós dizemos que, nesse negócio, o ganhador fica com tudo”, diz ela. “Quem prestar os melhores serviços financeiro­s vai prevalecer, tenha nascido como um banco ou como uma empresa de tecnologia.”

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FABIANO CRUZ, CEO (À DIREITA) E RODRIGO MIRANDA, DA ZOOP A tecnologia permite criar rapidament­e uma fintech a partir do zero e passar a disputar mercado com as instituiçõ­es financeira­s
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BRUNA CASTRO, DA AVEC Gerir pagamentos para lucrar mais e, de quebra, tornar o cliente fiel

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