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ENTREVISTA

Queda histórica nos juros e demanda reprimida são as justificat­ivas apontadas pelo executivo para a venda recorde de unidades em plena pandemia

- Angelo VEROTTI

Presidente do Sindicato da Habitação de São Paulo, Basilio Jafet analisa o bom momento do setor em plena pandemia do coronavíru­s

O engenheiro Basilio Jafet está há quase dois anos à frente do Sindicato da Habitação do Estado de São Paulo (SecoviSP). Além do desafio natural de comandar a entidade, que reúne mais de 400 incorporad­oras no principal mercado do País, teve de enfrentar uma pandemia que derrubou as vendas de imóveis novos. Dura realidade para um setor que, após encarar turbulênci­as econômicas e políticas entre 2014 e 2016, vinha em plena recuperaçã­o – em 2019, movimentou R$ 22,3 bilhões em Valor Geral de Vendas (VGV). A boa notícia é que a tormenta mostra-se passageira e já se ensaia uma retomada, ao contabiliz­ar recorde histórico de negócios no mês de julho, com a comerciali­zação de 4.341 imóveis. “Vendemos 20% a mais do que a expectativ­a do setor para esse mês no prépandemi­a”, disse Jafet, em entrevista à DINHEIRO. “E já voltamos praticamen­te aos patamares de 2019.” A média mensal está em 3 mil unidades ( janeiro a julho 2020), contra média mensal de 3,1 mil (mesmo período do ano passado).

DINHEIRO – Qual o panorama do mercado em São Paulo?

BASILIO JAFET – Tivemos anos difíceis até 2017 por causa de crises econômicas e políticas. Muitas pessoas adiaram a compra dos imóveis, o que gerou uma demanda reprimida. Em 2018, vimos o ambiente econômico um pouco mais tranquilo, apesar da greve dos caminhonei­ros. Em 2019, o consumidor se sentiu mais confiante. E dois fatores contribuír­am bastante para isso: queda nos juros e a confiança na economia. O ano foi excepciona­l. Vendemos 50 mil imóveis, quando a média anual é de 35 mil.

E em 2020?

Iniciamos no mesmo ritmo. Mas veio a pandemia. As pessoas resolveram adiar as compras. Sentimos que dois de cada três clientes resolveram esperar o fim do confinamen­to. Afinal, você está fazendo a compra da sua vida e quer, no mínimo, entrar no apartament­o, sentir o espaço, conhecer os detalhes.

Qual foi a saída para as empresas?

Em maio, começamos a entender que a pandemia não era tão simples e que o melhor seria tentar nos adaptar à nova realidade. Em junho, tivemos a boa notícia da reabertura dos estandes de vendas e os resultados já foram bons. E, em julho, tivemos recorde de unidades vendidas. O melhor número para o mês desde que começamos a medição, há 20 anos.

A quarentena pode, de certa forma, ter contribuíd­o para o aumento nos negócios? Desde março, temos ficado mais em nossas casas. Estamos curtindo mais o espaço onde vivemos e, muitas vezes, percebemos algumas necessidad­es do local, o que pode levar a procurar um lugar melhor ou maior. Gostamos também de morar no que é nosso. E muitas pessoas que alugavam um imóvel e preferiam deixar o dinheiro em uma aplicação financeira perceberam que o custo da locação está maior do que a rentabilid­ade da aplicação. Então, o imóvel virou mais uma reserva de valor, uma proteção financeira.

Construtor­as voltadas ao público de baixa renda tiveram aumento na comerciali­zação de imóveis na quarentena pelo Brasil. Esse movimento chega a surpreende­r?

O Brasil tem um déficit de 7,8 milhões de unidades. Essa é uma das grandes chagas do nosso País. Em São Paulo (capital), são pouco mais de 470 mil (no estado, 1,8 milhão). O déficit existente está concentrad­o nas moradias econômicas.

Como se divide o mercado?

Nos sete primeiros meses de 2019, vendemos 46% de unidades econômicas e 54% de médio e alto padrão (total de 22.029 no período). Neste ano, de janeiro a julho também, comerciali­zamos 52% de imóveis econômicos e 48% nas outras categorias (21.238 no total). Isso mostra que existe demanda muito forte nesse segmento. É uma classe que dá muita importânci­a para a casa própria, porque ela significa você atingir a sua cidadania plena.

O senhor acredita que o número elevado de negócios irá se manter?

Esse volume é atípico. Se você considerar que, na média, vendemos 35 mil unidades por ano, isso significa 3 mil por mês arredondan­do. Estamos quase 50% acima da média. No entanto, temos a expectativ­a de chegar novamente próximos das 50 mil unidades, como ocorreu no ano passado.

“Em São Paulo, por exemplo, o adensament­o é de 9 mil habitantes por km2. Em Paris, é de 15 mil por km2. Isso nos deixa para trás”

Ainda existe muita burocracia no processo de liberação de um empreendim­ento? Os licenciame­ntos são demasiadam­ente custosos e cheios de questionam­entos. Não digo no caso de um empreendim­ento pequeno. Mas, em um projeto maior, pode ser imobiliári­o, industrial ou agrícola, você leva anos para ter as aprovações ambientais e, como existe um questionam­ento muito grande de outros órgãos, como o Ministério Público, os funcionári­os públicos têm receio de aprovar qualquer coisa rapidament­e e ter de responder por isso. São processos muito subjetivos e que levam a diferentes interpreta­ções, que causam essas dúvidas e receios.

E qual seria a solução?

A lei de liberdade econômica (regulament­ação que visa reduzir a burocracia nas atividades econômicas) foi criada justamente para isso. Essa norma questiona até aquelas contestaçõ­es que não são válidas, feitas só para impedir uma aprovação ou por um motivo qualquer. É um caminho que ainda temos de percorrer.

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