Alicerce d0 futuro
OS FUNDOS IMOBILIáRIOS ATRAíRAM UM NúMERO RECORDE DE INVESTIDORES EM 2020. O RETORNO, PORéM, FOI NEGATIVO. ENQUANTO GALPõES SEGUEM EM ALTA, OS SHOPPING CENTERS E AS LAJES CORPORATIVAS AINDA EXIGEM CAUTELA
oano de 2020 será lembrado por vários motivos como um divisor de águas no segmento dos fundos de investimento imobiliário. Pelo lado positivo está sua popularização. Segundo dados da B3, o total de investidores pessoa física era de 1,13 milhão em novembro, crescimento de 75% em relação aos 644 mil investidores registrados no encerramento de 2019. O volume total de negócios com essas cotas no pregão da B3 também disparou. Avançou 51,2%, crescendo de R$ 32,2 bilhões de reais em 2019 para R$ 48,7 bilhões até novembro. No entanto, no lado negativo, o ano testou os limites da tolerância dos investidores e estressou ao máximo os modelos de cálculo de risco para os gestores dessas carteiras. Até 21 de dezembro, o índice Ifix, que mede o comportamento dessas carteiras na bolsa, recuou 12,6%, perdendo das demais aplicações de renda fixa e até mesmo do Ibovespa (quadro ao lado).
A turbulência decorreu dos impactos da pandemia. Formados por ativos imobiliários como lajes corporativas, shopping centers, galpões logísticos ou redes de agências bancárias, os fundos são grandes locadores. A maior parte da renda de seus cotistas vem dos aluguéis pagos pelos locatários. A pandemia sacudiu esse mercado. Esvaziou os shoppings e mandou muitos funcionários de escritório para casa, ao passo que congestionou galpões que funcionam como depósitos ou centros de distribuição, devido ao crescimento das entregas. Tudo isso em um cenário de juros historicamente baixos, em que a rentabilidade desses fundos, que é isenta de imposto de renda, torna-se muito mais competitiva.
“O cenário para os fundos imobiliários mudou radicalmente em 2020”, afirmou o executivo responsável por investimentos da empresa de gestão de recursos do Bradesco, Marcelo Nantes de Souza. “A pandemia provocou um grande rearranjo nessas classes de ativos.” Segundo ele, o segmento mais beneficiado foi o dos galpões logísticos, cuja demanda aumentou devido às medidas de isolamento social, e isso deve permanecer mesmo após o levantamento as restrições. Os segmentos de lajes corporativas e de shopping centers têm de ser vistos com mais reservas, pois sua rentabilidade depende da ocupação, que ainda não é plena. Souza não recomenda os fundos imobiliários focados em alugar agências bancárias. O crescimento da digitalização do setor deverá reduzir bastante a abrangência das redes físicas, aumentando a vacância e baixando os aluguéis.
Segundo o gestor de fundos imobiliários da Rio Bravo, Giuliano Bandoni, vai demorar para os fundos dedicasdos a shopping centers recuperarem o brilho. Antes da pandemia eles eram os preferidos dos investidores. A expectativa era de que o crescimento da renda elevaria a frequência aos centros de compras e os aluguéis cobrados dos lojistas. No entanto, as medidas restritivas impostas pela pandemia abateram essa tese. As cotas desses fundos chegaram a recuar 40% no pior momento da crise, e ainda não retornaram aos níveis anteriores à pademia.
Um dos frutos positivos da turbulência foi a resistência mostrada por alguns dos fundos. A maior parte das carteiras tem contratos de aluguel atípicos, muito diferentes do padrão habitual. São acordos de longo prazo, travados e que cobram muitas multas em caso de descumprimento, o que garante a rentabilidade. Outra perspectiva é a diversificação dos produtos, em linha com o que ocorreu no mercado americano. Por lá, os fundos começaram como por aqui, dedicando-se a teses mais óbvias como centros de compras ou lajes corporativas. Mais tarde, com a popularização e a maturação do mercado, esses produtos se diversificaram e passaram a investir diretamente em imóveis para o varejo, em imóveis residenciais, condomínios industriais e até cemitérios. Bandoni vê um desenvolvimento semelhante. “Estão começando a surgir fundos dedicados a imóveis de varejo de altíssimo padrão, como lojas na Avenida Paulista, por exemplo”, afirmou. “Ativos como esses oferecem uma renda praticamente líquida e certa, pois sua vacância é altamente improvável.”
Esse mercado deve continuar em expansão durante algum tempo, apesar de não se esperar uma suspensão imediata das medidas de isolamento social. A taxa de juros deverá permanecer entre 2% e 4% ao ano pelo menos ao longo dos próximos três anos, o que garantirá uma rentabilidade diferenciada para os fundos imobiliários. “No entanto, mesmo com os juros referenciais voltando ao patamar de 6% ao ano, faz sentido para o investidor manter uma parcela de seu patrimônio alocado em fundos imobiliários”, afirmou Bandoni.