José Ricardo dos Santos Luz Júnior
de discussão com o país, que é o vice-presidente Hamilton Mourão. Ele está pronto para essa movimentação política, até diante do desgaste do ministro das Relações Exteriores, que chegou a usar a expressão “comunavírus”.
Onde o Brasil pode avançar em termos de exportação para a China?
A China é a maior parceira comercial do Brasil desde 2009. A diferença na balança comercial da China para o segundo lugar, os Estados Unidos, é da ordem de US$ 40 bilhões. A pauta Brasil-EUA gira em torno de US$ 60 bilhões e a Brasil-China, foi de US$ 101,7 bilhões em 2020, sendo o primeiro país da América Latina a atingir essa cifra. O Brasil exportou US$ 67,7 bilhões e importou
US$ 34 bilhões da China.
Apesar do volume ser expressivo, a pauta de exportações do Brasil é restrita. Isso pode mudar? É certo que temos de melhorar nossa pauta de exportação para a China. Exportamos quatro pilares, que são minério de ferro, soja, petróleo e celulose. E importamos produtos com maior valor agregado, como maquinário. A Cosban discute projetos de interesse para os dois países, como a Ferrovia Bioceânica, entre Brasil e Peru, para desembocar no Oceano Pacífico, reduzindo pelo menos dez dias na logística e aumentando nossa competitividade com o minério de ferro australiano. Mas o custo desse projeto é de US$ 10 bilhões e quem tem capacidade de financiamento e know-how de infraestrutura é a China. Isso sem falar no grande mercado consumidor chinês, que o Brasil pode aproveitar muito mais. O produto brasileiro é muito bem aceito pelo chinês, por causa da qualidade.
O Lide China é uma plataforma que, além de consultorias e eventos, também faz missões. As duas últimas missões à China foram em outubro de 2019, quando levamos autoridades do governo de São Paulo e empresários, e a outra em novembro de 2019, com uma delegação de executivos e grandes clientes do Banco do Brasil. Ambas tiveram como objetivo mostrar a China do futuro, das inovações e soluções tecnológicas. Nossa principal função é unir o empresariado brasileiro e chinês para fazer negócios, com respaldo dos dois governos. O Lide China foi criado em 2013 e estou à frente do grupo desde 2017. Desde então, foram cinco missões realizadas.
O governador João Doria, fundador do Lide, poderia contribuir na interlocução com o governo chinês, por meio do escritório da InvestSP na China?
Tudo é uma questão de articulação política. Houve um desgaste grande no Brasil em relação à política pública de saúde e talvez pudéssemos ter avançado infinitamente mais se houvesse um diálogo harmônico entre as esferas federal e estadual. O governo brasileiro poderia ter investido mais no Instituto Butantan, e poderíamos estar fornecendo vacinas para a América Latina. Mas, diante do desgaste, acho difícil isso acontecer. Doria mostrou planejamento. O governo federal, não. O escritório da InvestSP pode contribuir, já que foi estabelecida uma relação de confiança entre o Butantan e a Sinovac. Mas isso depende do interesse da União.
O que muda na relação Brasil e China com a posse de Joe Biden nos Estados Unidos?
O presidente Joe Biden é um excelente negociador e já demonstrou que vai resgatar diversas relações e acordos internacionais. A relação entre os dois países não vai ser fácil, mas vai melhorar. O resgate do multilateralismo é bom para todos os países, mas especificamente o agronegócio brasileiro pode ser atingido, principalmente a soja, e perder participação em relação a produtos americanos. De toda forma, o Brasil tem boas relações comerciais com a China e não pode olhar para o competidor. Por isso precisamos planejar melhor e nutrir a relação com a comunidade chinesa.
“Biden é um excelente negociador e a reaproximação dos EUA com a China pode atingir o agronegócio brasileiro, especialmente a soja”
Biden trouxe em seu discurso de posse o resgate da democracia e esse é um tema muito sensível na China, pelo regime autoritário e perseguição a quem discorda do governo. Como lidar com isso?
A relação entre Brasil e China sempre foi baseada na não intervenção de assuntos domésticos. Em todos os acordos comerciais entre os dois, há essas referências. Independentemente da ideologia, o Brasil tem de lidar com a China e tem de lidar com os Estados Unidos.